“O procedimento lançado com vista à adjudicação da concessão da exploração da Escola Profissional de Hotelaria e Turismo da Madeira (EPHTM) foi pontuado por irregularidades que implicaram a ilegalidade da adjudicação do contrato em referência e, por consequência, do correlativo título contratual”.
A conclusão é do Tribunal de Contas (TdC) vertida num Relatório de Auditoria de fiscalização concomitante ao contrato de concessão de exploração da (EPHTM), hoje divulgado.
O relatório contém a auditoria orientada sobre a formação e a execução material e financeira do contrato de concessão de exploração da EPHTM.
O contrato de concessão foi formalizado, a 1 de setembro de 2010, entre a Região Autónoma da Madeira (RAM), através das então designadas Secretarias Regionais do Plano e Finanças (SRPF) e da Educação e Cultura (SREC), e a sociedade “CELFF – Centro de Estudos, Línguas e Formação do Funchal, S.A.” (CELFF), pelo prazo de 15 anos, na sequência de um concurso limitado por prévia qualificação de âmbito comunitário.
Segundo o TdC “O Secretário Regional de Educação e Cultura praticou atos administrativos sobre matérias que se encontravam legalmente cometidas à RAM, a exercer pelo Conselho do Governo Regional (CGR), sem que lhe tivessem sido expressamente delegadas competências para tal”.
Além disso, diz o TdC “não foi nomeado júri para conduzir o procedimento pré-contratual pelo órgão competente para a decisão de contratar, em contradição com o ordenado pelo n.º 1 do art.º 67.º do Código dos Contratos Públicos (CCP)”.
Por outro lado, prossegue o TdC, “a entidade adjudicante não exigiu requisitos mínimos de capacidade financeira aos candidatos” tal como dita a lei.
Os requisitos mínimos de capacidade técnica fixados no programa do procedimento eram inadequados face à natureza das prestações objeto do contrato a celebrar, o que desrespeita o estatuído no CCP.
Os documentos solicitados pelo TdC para comprovação da capacidade técnica dos candidatos não se mostraram idóneos para esse efeito, ao arrepio do CCP.
Mais revela o TdC que “o modelo de avaliação das propostas foi incorretamente formulado, comportando escalas organizadas grosseiramente com intervalos desproporcionados que não permitia a diferenciação e a graduação devidas, o que afronta o regime do CCP.
Diz ainda o TdC que “a proposta do CELFF foi admitida indevidamente porquanto encerrava condições contrárias a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência relativamente ao modo de financiamento da concessionária, e o plano de formação profissional, a que correspondia um dos atributos, não satisfazia o que era pretendido pela entidade adjudicante nessa matéria”.
Acresce que o caderno de encargos não integrou o código de exploração com indicação dos direitos e das obrigações das partes relativas à exploração, contrariando o preceituado no CCP.
Por outro lado, o relatório preliminar da fase de qualificação, por não evidenciar a fundamentação subjacente à deliberação aí vertida, não se compagina com as normas do CCP e do Código do Procedimento Administrativo (CPA).
Mais revela o TdC que a execução material do contrato não foi devidamente acompanhada e controlada impedindo a avaliação da qualidade dos serviços prestados e, consequentemente, do grau de satisfação do interesse público subjacente à concessão.
O Tribunal diz que a cláusula 34.ª do contrato de concessão que impunha o pagamento ao concedente, a título de renda, de um montante anual de 200 mil euros, proposto pela concessionária, a pagar em prestações mensais no valor de 16.667,00€, só foi cumprida relativamente aos últimos quatro meses de 2010, correspondente a um total de 66.666,69€.
Por outro lado, a RAM não recorreu aos instrumentos contemplados no CCP e no contrato de concessão para acautelar o exato e pontual cumprimento do pagamento das rendas devidas, com exceção da execu-ção da garantia bancária no valor de 90.000,00€, o que conduziu à não arrecadação de receitas desde janeiro de 2011, acrescida dos juros legalmente aplicáveis, situação que nem o Acordo de pagamentos firmado com a concessionária a 10 de janeiro de 2014 foi capaz de pôr cobro.
A Região só veio a reclamar o valor em dívida através de pedido reconvencional, deduzido aquando da apresentação da contestação no processo judicial instaurado pelo CELFF contra a RAM no Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, a 9 de outubro de 2015, que visa a reposição do equilíbrio financeiro do contrato de concessão através da extinção da obrigação de pagamento da renda relativa aos quatro primeiros anos letivos de duração da concessão e da devolução pela RAM das quantias já pagas a título da renda da concessão.
A concessionária beneficiou de dinheiros públicos até ao final de 2015, na ordem dos 13.940 185,68€, por conta de transferências atribuídas pelo Fundo Social Europeu a fim de comparticipar dezoito projetos, valor que representa uma taxa de execução de 60,51% do total previsto para esse efeito, orçado em 23.038.982,74€.
Em 2014 o CGR autorizou o financiamento, pelo orçamento regional, de três projetos da autoria do CELFF com vista ao desenvolvimento e cooperação no âmbito da promoção e animação turísticas, no valor máximo de 70 mil euros.
Face a este rol de ilegalidades, o TdC recomenda:
1.À Secretaria Regional da Educação (SRE) que, sempre que optar pelo concurso limitado por prévia qualificação com vista a outorga de contratos de concessão de exploração de bens do domínio público, cumpra, de forma estrita, as normas do CCP que enformam e disciplinam este procedimento adjudicatório, com destaque para as que:
a)Aferem a competência do órgão competente para a decisão de contratar;
b)Regulam a nomeação do júri para conduzir o procedimento pré-contratual;
c)Impõem requisitos mínimos de capacidade financeira aos candidatos;
d)Pressupõem a adequação dos requisitos mínimos de capacidade técnica fixados à natureza das prestações objeto do contrato a celebrar e a solicitação de documentos idóneos para comprovação dessa mesma capacidade;
e)Condicionam a formulação do modelo de avaliação das propostas, quando opte pelo critério de adjudicação da proposteconomicamente mais vantajosa, que não comporte escalas organizadas grosseiramente com intervalos desproporcionados que impeçam a diferenciação e a graduação devidas;
f)Enunciam as causas de exclusão das propostas, com a subsequente rejeição das que encerrem condições contrárias a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência;
g)Ordenam a integração, no caderno de encargos, de um código de exploração com indicação dos direitos e das obrigações das partes relativas à exploração, e
h)Exigem a fundamentação do relatório preliminar da fase de qualificação.
O TdC recomenda ainda à Secretaria Regional da Economia, Turismo e Cultura (SRETC) que acompanhe e controle a execução material do contrato objeto da presente auditoria, de forma a avaliar a qualidade dos serviços prestados mediante o exercício pleno das competências de fiscalização que lhe estão legal e contra- tualmente conferidas, criando, por exemplo, a figura do “gestor” ou do “responsável” da concessão.
À Secretaria Regional das Finanças e da Administração Pública (SRF) recomenda-se, também no domínio do contrato de concessão em apreço, que:
a)Acompanhe o pagamento, pela concessionária, da renda mensalde 16.667,00€ a que se encontra compelida pela respetiva cláusula 34.ª, e que,
b)Em caso de incumprimento, recorra aos instrumentos consagrados no texto da lei e do contrato para acautelar o exato e pontual pagamento das mesmas rendas.