A Fortaleza de São Tiago precisa de obras e de ordem

Quem visita a Fortaleza de São Tiago, conclui que este imóvel classificado do Património da Região Autónoma da Madeira precisa urgentemente de obras de restauro, tal a degradação das muralhas e paredes, em parte devido à maresia. Mas também sai dali com uma dúvida incómoda: onde termina a área da restauração e qual é verdadeiramente a zona visitável da Fortaleza?

FOTOS: RUI MAROTE, 27 JUNHO 2022.

Doada à Região em 1992, aqui funcionou o Museu de Arte Contemporânea do Funchal até 2015 e também um núcleo museológico do Museu Militar da Madeira, com exposições temporárias. Então, o Forte apresentava-se bem cuidado, com a alvenaria sempre caiada. Sem as necessárias e regulares obras de conservação veio, entretanto, a degradar-se.

Desde há seis anos, está prevista a sua recuperação e adaptação para instalação do Museu de Arqueologia da Madeira. Pode ler-se no PIDDAR – Programa de Investimento e Despesas de Desenvolvimento da RAM, de 2021, que este projecto, da responsabilidade da Direcção Regional da Cultura, teve início em 2016 e deveria ficar concluído em 2021, beneficiando de financiamento comunitário. No PIDDAR do ano em curso, já está inscrito como sendo de 2016-2024. Provavelmente, a pandemia da doença COVID-19 foi responsável pelo atraso.

No entanto, é por de mais notório o estado de degradação desta Fortaleza, mandada construir no início do século XVII, pelo governador D. Manuel Pereira, com projecto atribuído ao Mestre Jerónimo Jorge. Um edifício com mais de quatrocentos anos e localizado junto do mar requer frequentes obras de manutenção. Quando estava nas mãos do Exército, havia sempre soldados habilidosos na pintura ou na arte de pedreiro, chamados para esse trabalho. Agora, sendo Património da Região, as intervenções, que o Forte carece, submetem-se às regras da contratação pública. Mas, apesar da burocracia, não devem ser por mais tempo descuradas.

No Forte, funciona um restaurante desde 2001. É um lugar aprazível, onde, com alguma frequência, se realizam diversos eventos. Nessas ocasiões, o restaurante invade a Fortaleza e monta estruturas de abrigo e de iluminação (algumas vezes, do género das “cortinas” dos bazares chineses), que em nada dignificam a imagem do monumento histórico. É verdade que as da bateria média são desmontadas, mas, nesse vaivém, ficam registos fotográficos, indignação pela concessão (gratuita?) de um espaço nobre, marcas e até limites de circulação para o visitante. Por outro lado, há uma tenda na parte traseira do piso térreo, que foi provisória, mas já parece definitiva.

FOTOS: NELSON VERÍSSIMO, 4 JULHO 2022

Na página oficial do Restaurante do Forte, na secção “Conheça os nossos espaços” são apresentados os seguintes: Tenda, Pátio do rés-do-chão, Pátio de entrada, Pátio do meio, Pátio meio lateral, Pátio superior, Sala Militar, Sala dos Poetas e Túnel. Enfim, muito pouco resta da Fortaleza!

A entrada está ocupada por mesas do restaurante e o portão, que permite o acesso à bateria baixa, acha-se ladeado por um par de veleiros, que se enquadram bem no género das demais decorações.

Nada impede a existência de um restaurante num monumento. Pode até trazer vantagens. Contribuir para a sua divulgação, salvaguarda e segurança. Mas há que delimitar espaços e estabelecer regras de coabitação. A Região não deveria abdicar deste princípio, tão-pouco dele se esquecer, porque se trata de Património público e visitável. Ao Forte o que é do Forte e ao Restaurante o que é do Restaurante.