O “nó cego” dos franceses

FRANÇA
Os franceses deram um grande “nó” de protesto. Para dentro e para fora. Muitos, incluindo Portugal, devem “pôr as barbas de molho”. Ilustração José Alves

A França está a dar um “nó cego” na Europa. Para dentro e para fora, os franceses demonstraram que não estão aqui para “meias tintas” e se aquilo tiver o efeito contágio, estamos bem arranjados. Grandes, médios e pequenos países, vai tudo no mesmo saco e lá se vai o projeto europeu, se ninguém assumir que o futuro deve ser construído com estratégia e não com o protesto a pretexto do descontentamento. A democracia, sendo ainda assim o menos mau dos sistemas, permite que, democraticamente, possam emergir, pelo voto, tendências do passado (ou bem do presente), que porventura assumem dimensões impensáveis porque o voto é mesmo assim, a voz do povo mesmo quando o povo não pensa.

O ex.primeiro-ministro socialista francês, Manuel Valls, já veio dizer que vai concorrer, nas legislativas de junho, pelo movimento que elegeu Macron para Presidente da República. Diz mais: o PS está morto. E pronto, os partidos tradicionais começam a perder terreno, porque estão em alternância há tanto tempo que chegou a um ponto de não serem alternativa para o que quer que seja. A democracia, tal como está, a partidarização como é estabelecida, a clientela que alimenta e os “buracos” em que se mete sem dar esperança às novas gerações, acaba por pesar no momento do voto e na forma como os políticos sentem necessidade de se posicionar face ao eleitorado, cujo protesto, levado ao extremo, pode criar situações irreparáveis de fragilidade.

Essa queda dos partidos historicamente mais fortes, o surgimento de movimentos extremistas, que representam, na perspetiva da massa acéfala, a defesa da identidade nacional, com o nacionalismo a confundir-se nessa aparente defesa da Pátria, podem dar cabo dos países, por si só, mas também da Europa que um dia se afirmou como um projeto de união, mas que não tem feito outra coisa que não seja a fragmentação permanente, com o inevitável a acontecer, através da saída do Reino Unido e da forte votação do partido de Marine Le Pen em França, além da eleição de Macron enquanto homem fora dos grandes partidos, o que, sendo um factor positivo, não deixa de ser observado como um protesto face ao estabelecido, o tal estabelecido que vem perdendo força.

Quem pensa que este “nó cego” só acontece aos outros, anda bem enganado com o “elixir” do poder, que é inebriante e não deixa pensar. Juntando-se um poder que não pensa a um povo que pensa mal, então os riscos são grandes, para cada país enquanto factor de identidade nacional, mas também para a Europa enquanto projeto global, que já teve dias melhores e a tendência é para ficar pior se andarmos neste marasmo de protagonismos e neste patamar de superioridade de uns em relação aos outros.

Perante este desmoronar de esperanças, de políticas, de projetos, de pessoas e de gerações, é bom que Portugal vá dando corpo à expressão “pôr as barbas de molho”. É que, depois de dar o “nó cego”…