Pe. José Luís Rodrigues: “Não se mata em nome de nada nem em nome de ninguém”

carreiros monteO padre José Luís Rodrigues já reagiu no seu ‘Banquete da Palavra’ ao homicídio ocorrido ontem na freguesia do Monte.

Porque relevante, com a devia vénia, o Funchal Notícias replica a posição do sacerdote:

“1. E pronto. Já está. 2017, já está manchado entre nós com sangue, com um homicídio bárbaro infligido a um homem da freguesia do Monte. Não somos terra de jihadistas terroristas, mas também não somos um lugar de brandos costumes como tantas vezes nos fazem crer, somos igualmente uma terra onde esporadicamente há terrorismo, violência fatal que põe em causa a integridade do outro.

  1. Não será muito difícil de imaginar neste momento o que sente a família que perde um membro da sua casa desta forma. Como deve ser difícil receber a notícia: «mataram agora mesmo, o vosso pai, o teu marido, o teu filho…». Imaginamos o vazio e a dor que tomam conta logo dessa casa e desses corações destas vítimas inocentes, porque aquele que se esperava que chegasse neste dia como chegava todos os dias não chega mais, porque alguém o colocou na morgue.
  2. Não se mata em nome de nada nem em nome de ninguém. É isto que penso, é isto que procuro viver e ensinar. Nada deste mundo e do outro vale mais do que uma vida humana. Por isso, não se resolvem os problemas a tiro ou com outros instrumentos que se sabe à partida que vão tirar a vida a uma pessoa. Ninguém merece que assim seja. Nenhuma necessidade por mais urgente que seja merece que se viva com a violência na ponta dos dedos e com o coração carregado de ódio. Há meios próprios, mesmo que tantas vezes morosos e injustos, mas é nesses lugares que se deve procurar remediam as injustiças e o cumprimento da lei. Se assim não for, com tantos problemas que existem, mais de metade da população vai acabar sendo assassinada.
  3. O Papa Francisco na mensagem para este ano sobre a paz, dia 1 janeiro de 2017 escreveu logo no nº 1: «Sejam a caridade e a não-violência a guiar o modo como nos tratamos uns aos outros nas relações interpessoais, sociais e internacionais. Quando sabem resistir à tentação da vingança, as vítimas da violência podem ser os protagonistas mais credíveis de processos não-violentos de construção da paz. Desde o nível local e diário até ao nível da ordem mundial, possa a não-violência tornar-se o estilocaracterístico das nossas decisões, dos nossos relacionamentos, das nossasações, da política em todas as suas formas». A paz mundial, a paz entre os povos e nações, começa com as atitudes de não-violência quotidiana que cada um deve procurar viver. Mais uma vez reafirmo, nenhum problema merece ou terá valor acima de uma vida humana.
  4. A nossa terra precisa de um sério debate e de uma reflexão profunda sobre a não-violência, para que não tenhamos que conviver com estas notícias sobre barbaridades, mesmo que sejam de quando em vez. A falta de respeito pela vida do outro e a perda da dimensão transcendente da vida tem um preço, ele está aí diante dos nossos olhos, que se arregalam perplexos. Coisa que não basta, é preciso retomar a educação para a vida sem esquecer a sua dimensão espiritual, para que a materialidade deixe de ser um valor tão absoluto que conduza tanta gente a ser vítima da loucura da violência em nome de bens deste mundo.

Daqui envio as mais sentidas condolências à família do Monte enlutada por este acontecimento tão trágico da perda de um dos seus membros, quiçá muito importante para o seu sustento e sobrevivência. Porém, não deixo também de sentir tristeza, imaginando a inquietação, o medo e a consternação da família do homicida. Obviamente, que custa muito uma perda destas e todos nós sentimos as nossas mentes ensombradas nas últimas horas, mas tenhamos forças para continuar a vida solucionando as desavenças com compreensão, perdão e com justiça. Não desejávamos de forma nenhuma que o primeiro mês do ano fosse logo manchado com sangue na casa de ninguém”.