Programa de Recuperação de Cirurgias só resolverá 600 casos dos 17 mil em lista de espera

bloco 3O Governo Regional avançou na passada semana com medidas legais para diminuir as listas de espera para cirurgia no centro hospitalar do Funchal. Mas não convence médicos nem oposição. O dinheiro é pouco para os mais de 17 mil casos e a iniciativa passa ao lado de outros problemas, como a falta de anestesistas e atrasos nos exames de diagnóstico. O CDS-PP promete atacar a questão de forma dura, já esta segunda-feira, durante a discussão do Orçamento, no Parlamento, onde vai pedir reforço de verbas. Faria Nunes, o secretário regional da Saúde, está na linha de fogo. Não tem peso político dentro do Governo, responsabiliza Mário Pereira.

O recente diploma que estabelece o Programa de Recuperação de Cirurgias (PRC) na Região é claramente insuficiente. A medida, já regulamentada, não vai conseguir resolver a situação dos 17.300 doentes registados este ano em lista de espera. Esta é a convicção de alguns agentes e partidos da oposição.

Feitas as contas, os 1,4 milhões de euros previstos para operacionalizar a lista cirúrgica regional, darão apenas para cobrir pouco mais de 600 casos, isto se atendermos a um custo médio de 2.300 euros por intervenção. Um número residual que não permitirá sequer reverter a quebra de produtividade que as sete salas do bloco operatório têm vindo a registar nos últimos tempos e que, entre outras razões, estará na origem da escalada do número de doentes em lista de espera no serviço regional Saúde – em quatro anos passou de 11 mil para 17.300.

Seriam necessários, pelo menos, 7 milhões de euros para conseguir reduzir a extensa lista de cirurgias que aguardam vez. Um montante avançado inclusive por Manuel Brito, o titular da pasta que se demitiu após uns curtos três meses em funções.

Mas, o combate aos atrasos nas intervenções cirúrgicas enferma ainda de outros problemas para além da escassa dotação orçamental prevista. Há falta de anestesistas e as demoras nos exames complementares de diagnóstico não têm solução à vista. Situações que, a manterem-se, só por si comprometem qualquer progresso no âmbito das cirurgias programadas adicionais, nos regimes de internamento e ambulatório.

Neste momento, o SESARAM conta com 19 anestesistas afetos ao bloco operatório, isto num universo de cerca de 260 mil habitantes. Se atendermos a que o Centro Hospitalar do Porto tem 83 especialistas em anestesia para um total de 246 mil habitantes, é fácil perceber o quanto o rácio regional peca por defeito. Cobrirá, no fundo, apenas 23% das necessidades.

MÁRIO PEREIRA-CDS-FOTO

“Secretário não tem peso político”

Ora, são estas as grandes questões que o grupo parlamentar do CDS-PP designa de ‘Calcanhar de Aquiles’ do sistema regional de Saúde e quer ver esclarecidas pelos responsáveis governamentais, de maneira a que não se criem falsas expetativas junto da opinião pública e sobretudo dos doentes.

O primeiro embate tem já hora e local marcados. Começa esta segunda-feira a discussão da proposta de Orçamento e Plano da Região para o próximo ano. Mário Pereira, deputado centrista, garantiu ao FN uma “postura dura” da sua bancada à política do Executivo para o sector, tomando como caso concreto o Programa de Recuperação de Cirurgias. “É uma situação inadmissível. Estávamos à espera de uma mudança relativamente ao anterior Governo e administrações hospitalares e, afinal, assistimos a cortes e à manutenção da filosofia hospitalocêntrica do dr. Miguel Ferreira. Logo à partida, o atual secretário regional da Saúde é o principal derrotado”.

Durante os próximos dias, na Assembleia Legislativa Regional, o CDS-PP vai insistir no reforço das dotações orçamentais destinadas ao sector em geral e ao PRC em particular. Um papel negocial que, critica, caberia em primeira instância ao titular da pasta da Saúde junto da equipa governativa.

Mário Pereira fala em desilusão perante o desinvestimento e aponta o dedo ao atual secretário regional da Saúde. No entender do deputado e médico de profissão, João Faria Nunes é o principal derrotado em todo o processo, uma vez que não conseguiu reverter a filosofia hospitalocêntrica das anteriores administrações. “Não tem peso político dentro do Governo”, arrasa. “Perdemos uma grande oportunidade quando o dr. Brito deixou o cargo. Ele nunca admitiria estes cortes orçamentais na Saúde previstos para o próximo ano, em sede de Orçamento”.

hospital

A comprovar os seus argumentos, de que o atual elenco governativo persiste no paradigma de centralizar toda a máquina no serviço público, estará a opção de limitar as cirurgias adicionais ao bloco operatório do Hospital, apesar dos constrangimentos já conhecidos em matéria de capacidade de resposta.

Para já, nada de concreto em matéria de contratualizações com entidades privadas e sociais convencionadas, apesar de o Diploma que estabelece o Programa de Recuperação de Cirurgias na Região assim o prever. O próprio secretário regional da tutela garantiu recentemente essa solução sempre que o Hospital não consiga responder atempadamente às necessidades, à semelhança do acontece no Continente com o Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC).

Mas, o FN apurou que não haverá muita vontade das hierarquias na contratualização com clínicas privadas, embora  fosse uma forma de aliviar a pressão sobre o serviço público, garantindo respostas mais eficazes e rápidas aos doentes.

De acordo com a lei – a Região vai adotar a tabela de preços do SIGIC -, a entidade prestadora de serviços receberá uma parcela significativa do montante total pago para cada tipo de cirurgia adicional, preço esse que é definido atendendo à complexidade do procedimento. No caso de uma cirurgia que envolva prótese, a unidade de saúde receberá 60% do valor global, sendo o restante dividido de forma diferenciada pelos vários elementos que compõem a equipa de cirurgia. Se não houver indicação de prótese, a repartição será de 50/50. Em qualquer um dos casos, o Programa constitui uma opção de receita a não descurar. Os encargos associados ao PRC saem dos cofres do IA Saúde.

O novo modelo de combate às listas de espera entrou em funcionamento na passada semana e destina-se aos doentes inscritos para cirurgia no SESARAM. A lista será gerida de acordo com as seguintes prioridades: doença e problemas associados; patologia de base; gravidade e impacto na esperança de vida, na autonomia e qualidade de vida do doente; velocidade de progressão da doença e tempo de exposição à doença. A antiguidade na lista, desde que associada a uma das caraterísticas descritas, será também tida em conta.