Deus é uma mulher lésbica. Era o que se lia no cartaz colorido, brandido qual arma, na 3.ª marcha do orgulho LGBTI+ da Madeira, no passado fim de semana.
Que despautério, que imoralidade, que falta de respeito. Que grande ofensa.
Resta saber ofensa a quem.
E já agora, porquê? Por Deus ser lésbica? Ou por ser mulher?
Gosto de pensar que Deus – a existir – não tem sexo, género, ou orientação sexual. É pleno, é Amor, é a génese e a síntese de tudo o que é Bom. E que tem, necessariamente, um apurado e refinado sentido de humor.
Não consigo conceber que este Deus, tal como o imagino, se sinta ofendido com esta frase. Ou ofendida.
Como não se deve ter sentido ofendido quando, no cinema, foi retratado pelo Morgan Freeman ou pela Alanis Morisette.
E quem, além de Deus, se pode pode sentir ofendido?
Brilhante o Padre Jose Luís Rodrigues, que numa iluminada reflexão sobre este tema, diz que “Deus dá para tudo (…), tudo é possível (…) desde que não faça mal a ninguém. Não importa para nada que Deus seja heterossexual, homossexual e mulher lésbica. É importante que seja sempre uma entidade que abarca toda a realidade humana.”
Também me quer parecer que o Papa Francisco acharia graça a esta frase. Quase que o vejo a esboçar um sorriso franco.
Sei que, apesar de dez anos de escola católica, alguns tantos de catequese, do batismo, da primeira comunhão, do crisma e do casamento, não me senti minimamente beliscada com esta frase.
Mas isto sou eu. E o Padre José Luís Rodrigues. E provavelmente o Papa.
Mas respeito quem o sente de forma diferente. E quem assim o diz. Quem ache que isto é uma estupidez, uma imbecilidade. Porque as sensibilidades são diferentes e as aceções de Deus também. Respeito mesmo.
Até porque, convenhamos, esta frase é uma provocação. E é exatamente esse o seu intuito, provocar, gerar reação, desafiar.
O que não respeito, o que condeno, e que vou sempre condenar sem qualquer pejo, é o que isto tem dado azo.
É ver os tais guardiães da moral e bons costumes – os meus preferidos, já se viu – de dedo em riste, a descarregar a sua indignação nos seus teclados. Mas não se limitam a isso.
Porque se assim fosse, seria a liberdade de expressão no seu melhor. A liberdade de expressão não funciona só para quando, o que é expresso, é exatamente aquilo em que acreditamos.
Mas não. Nalguns casos, depois vem tudo o resto.
E ler coisas como as que tenho lido. Que me ferem os olhos. Que me envergonham como ser humano.
Têm todo o direito de não gostar. Quem sou eu para dizer o contrário? Mas desejar a morte, apelidar de nojentos, de paneleiros e daí sempre em crescendo de violência, ódio destilado e sustentado em preconceitos que imaginava ultrapassados?
Isto sim, que despautério, que imoralidade, que falta de respeito. Que grande ofensa.
Escrever isto, pensar isto.
Perdoa-lhes, Deus – o meu Deus – porque não sabem o que fazem.