Pois eu até compreendo…

Andam alguns madeirenses indignados com as comemorações oficiais do «Dia de Portugal» de 2019, em Portalegre e Cabo Verde. Consideram atitude de menosprezo para com a Região, porquanto, no seu entender, este é o ano do Sexto Centenário do Descobrimento da ilha e, por tal, deveriam acontecer na Madeira.

Tendo chegado a Belém esses clamores, apressou-se o Senhor Presidente da República a comunicar, no passado dia 7, que as cerimónias do «Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas» se realizarão em 2020 na Região Autónoma da Madeira. Justificou não ter sido no presente ano, pois decidira «manter a orientação, anterior ao seu mandato, de não realizar tais comemorações numa Região Autónoma em ano de eleições regionais.»

O anúncio prematuro e a justificação da Presidência da República calaram os ânimos mais exaltados. Mas antes desta notícia, já eu admitia compreender que, neste ano, o Senhor Presidente da República não escolhesse a Madeira para a celebração da Portugalidade, pelas opções e circunstâncias regionais.

No ano passado, convidaram o Senhor Presidente da República para participar nas comemorações do Sexto Centenário do Descobrimento do Porto Santo, em 1 de Novembro. O Presidente aceitou de boa fé, mas foi enganado quanto à cronologia, pois, como já demonstrei, a data não tem fundamento histórico nem estatuto de tradição. Ora, dando-se conta do logro, achavam que o Senhor Presidente da República estaria disponível para, no ano seguinte, celebrar, na mesma linha, a efeméride do descobrimento da Madeira?

A falsa efeméride festejada no Porto Santo foi um fracasso como comemoração de um acontecimento histórico, mas a cobertura dos media possibilitou inegável propaganda governamental. A perpetuar a despropositada celebração, deixaram uma réplica da estátua do «Senhor da Ilha», concebida, nos anos 30 do século passado, para exaltar o colonialismo, uma espécie de prenda artística aos porto-santenses, mas fora de moda, que não se usa mais, a lembrar velhos tempos, quando para lá se levava o que já não se utilizava na Madeira. Então crêem que o Senhor Presidente gostou desta comemoração infeliz e teria gosto em repeti-la no ano seguinte?

Neste ano, tudo está envolvido pela febre partidária. As comemorações dos 600 anos estiveram, desde o início, na mira eleitoral e não se têm desviado do alvo. Não fosse 2019 ano de importantes eleições e, provavelmente, os mentores da celebração teriam adoptado a perspectiva da historiografia actual e não a do século XIX, como fizeram, ao teimarem no pretenso descobrimento do Porto Santo em 1418 e o da Madeira no ano seguinte, tudo para que os 600 anos coincidissem com o XII Governo Regional. Julgam que seria correcto o Senhor Presidente da República apadrinhar festejos com marcas de uma força partidária nas vésperas de actos eleitorais?

Por tudo isto, compreendemos muito bem a posição do Senhor Presidente da República. Esta ajuizada decisão constitui oportunidade única para a Região, em 2020, celebrar, condignamente, os 600 anos do povoamento do arquipélago da Madeira (1420-2020).