Crónica Urbana: Todos lavam as mãos, como Pilatos

Rui Marote

Sempre foi assim e sempre continuará a ser. A culpa morre sempre solteira. A culpa é dos jornalistas que fazem perguntas chatas…!

Todos lavam as mãos como Pilatos. Uns repetem dezenas de vezes: “Não foi um plátano que caiu, mas sim um carvalho”, lendo um texto escrito. Como isso fosse relevante. De certeza que não foi alecrim que caiu, muito menos alegra-campo, que tirou a vida a treze pessoas e feriu mais de cinquenta.

Outros preferem elogiar “os serviços de Protecção Civil que, do modo como actuaram, foram de uma eficácia extrema”.
Lá diz o ditado: toca a enterrar os mortos e a cuidar dos vivos. Ponto final.

Somos convocados para conferências de imprensa, embora em algumas delas quem convoca não saiba o significado de conferência de imprensa. Isto apesar de todas as Secretarias Regionais terem os seus assessores de imprensa. Lá vão cometendo erros de palmatória, como chamar os jornalistas para registar o que Suas Excelências têm a dizer, sem suposto direito a perguntas, como na conferência da tarde de ontem organizada pelo Governo Regional na sede da Protecção Civil.

Conferência de imprensa é uma coisa, e comunicado de imprensa é outra. Numa conferência têm de estar sujeitos a perguntas e não anunciar que não há perguntas, convencidos de que os jornalistas se devem calar para não incomodar.

Um comunicado de imprensa é diferente: lê-se ou distribui-se a mensagem sem alegado direito a perguntas. Mesmo assim os jornalistas podem contestar.

Mas o que é certo é que dos dois lados da barricada, ou seja, Governo Regional e CMF, os intervenientes não estavam à vontade, mostrando-se sempre com ar carrancudo, como se os jornalistas fossem os culpados da tragédia.

Nos próximos dias vamos assistir a uma “batalha naval” deitando ao fundo submarinos  e corvetas e tentando salvar o porta-aviões.

Esperamos que a desgraça não seja arma de arremesso na campanha eleitoral. Estivemos em Março no Monte, aquando da queda de um ramo dum plátano, que felizmente não causou vítimas, e alertámos para o perigo de outros árvores. Mas as palavras da população, que denunciou, e de quem transmitiu a denúncia caíram em orelhas moucas. Uma ou duas semanas depois caiu um carvalho no Colégio do Monte, que danificou  um carro do chefe dos carreiros que estava estacionado. Para não falar de outro carvalho que caiu nas proximidades. Isto é queda de árvores a mais e a Câmara tem conhecimento destes problemas, mas que não deu a importância devida aos mesmos.

O edil funchalense reconheceu que os privados não tem meios para efectuar essa manutenção das árvores e alegou que o carvalho que caiu estava em terreno privado, leia-se da Igreja. Mas a quem poderia caber essa manutenção, então? Não à CMF, coordenada ou não com o Governo Regional?

A Igreja, por seu turno, sacode a água do capote por lhe quererem “doar” terrenos que não lhe pertencem. Estamos mesmo a ver hoje uma movimentação nos serviços cadastrais para querer saber efectivamente quem é o pai da criança. A prova do “crime” existe: resta apurar definitivamente se o marco geodésico que lá está comprova que o terreno não é filho de pai incógnito. E tudo indica que o pai é, afinal, conhecido.

Ficamos a aguardar pelos próximos capítulos. Já vi novelas semelhantes a estas no caso da ponte de Sete Rios, quando o Laboratório Nacional  de Engenharia Civil passou a pente fino a maioria das pontes em Portugal Continental. Agora é na Madeira. Far-se-á um levantamento de todas as árvores nas vias públicas?

Aquando dos incêndios, a Câmara do Funchal pediu apoio à edilidade de Lisboa para um levantamento dos prédios da zona histórica de São Pedro, averiguando as condições dos mesmos. Será que a edilidade funchalense vai voltar a pedir, desta feita, auxílio aos Serviços Florestais do Ministério da Agricultura ? Em todo o caso já recorreu ao Instituto Superior de Agronomia. Lá diz o ditado: casa roubada, trancas à porta.