É “absolutamente mentira” que CDS seja financiado por AFA ou Grupo Sousa


cds 020Funchal Notícias – José Manuel Rodrigues, gostava de perguntar, antes de mais, o que é um bom resultado para o CDS nestas próximas eleições legislativas regionais?

José Manuel Rodrigues – Ter um bom resultado é chegar ao próximo Governo Regional da Madeira. Claro que seria um excelente resultado se o CDS fosse o primeiro partido, e até sob esse ponto de vista, pudesse influenciar quase a cem por cento as novas políticas públicas que a Madeira precisa. Mas temos a consciência da realidade e da força de cada partido. Temos, porém, também a consciência de que o CDS, em 2011, tornou-se o principal partido da Oposição, mereceu a confiança dos madeirenses e porto-santenses, e temos também a consciência do trabalho realizado nestes últimos anos, sobretudo pelo nosso grupo parlamentar, mas também pelos nossos autarcas, pelos nossos dirigentes. E temos finalmente a consciência de com que a forma como estamos a governar a Câmara Municipal de Santana, existe já uma marca CDS nas autarquias locais, porque foi possível reduzir a dívida da Câmara para metade, foi possível devolver grande parte do IRS, que era receita da Câmara, aos munícipes de Santana, e foi possível ter políticas de proximidade e de apoio, quer à natalidade, quer às famílias, quer aos jovens estudantes, quer aos idosos. Portanto, face a este conjunto de circunstâncias, o CDS, também porque tem uma equipa, e um bom programa, está em condições de influenciar, estando presente, o próximo Governo Regional da Madeira. Essa fasquia não a vou estabelecer em termos de percentagens. Estabeleço, sim, entre ficar na Oposição ou ser Governo. Ter um bom resultado é integrar o próximo Governo Regional da Madeira.

FN – Paulo Portas virá à Madeira fazer campanha?

JMR – A campanha será feita sobretudo pelos dirigentes regionais, pelos actuais deputados, pelos candidatos. Estas são eleições legislativas nacionais. É possível que venha uma vez à Madeira, mas nós não necessitamos de reforços nacionais, até porque, como se sabe, existe um ambiente de alguma crispação entre o CDS/Madeira e o CDS nacional, derivado, precisamente, da defesa que fizemos dos interesses da Região, em dois momentos, na Assembleia da República: quando votámos contra os orçamentos de Estado, quer para 2013, quer para 2014.

FN – Relativamente a essa situação, há quem pense que de algum modo sacrificou Rui Barreto ao odioso de ter que assumir a situação contrária e acabar por ficar mal visto pelas cúpulas do partido a nível nacional. O que responde a estas críticas?

JMR – Bom, eu próprio saí de deputado da Assembleia da República, onde penso que estava a fazer um razoável trabalho. Saí de vice-presidente do CDS nacional, saí de vice-líder do Grupo Parlamentar na Assembleia da República, para reassumir o meu lugar de deputado, apenas de deputado regional, devido, precisamente, à TSU dos pensionistas, que o PSD queria impor no Governo da República, no Orçamento para 2013. E portanto bati com a porta, numa atitude de protesto com o partido a nível nacional e com o Governo da República. Naturalmente que alguém me teria de ir substituir e foi o deputado Rui Barreto, que teve de votar contra o Orçamento para 2013, e contra o Orçamento para 2014. Mas teve sempre o apoio do CDS/Madeira. Mais, eu propus que em vez do deputado Rui Barreto ter um processo disciplinar, fosse o presidente do CDS/Madeira. Eu próprio teria esse processo disciplinar. E portanto, desse ponto de vista, não faz sentido nenhum essa crítica, até porque eu penso que a coragem do deputado Rui Barreto, alimentada também pela coragem do CDS/Madeira, deram projecção, claramente, ao deputado, e também às posições de defesa da Madeira e dos madeirenses do CDS/Madeira. É por isso que nós dizemos que temos autoridade e legitimidade para nos afirmarmos como alternativa ao PSD/Madeira nas próximas eleições. Também por isso.

cds 038

FN – Apesar disso há críticas de outros partidos da Oposição, ao CDS, no sentido de dizer que o CDS até certo ponto, quando começou a ser divergente, colaborou na instauração das medidas de austeridade que hoje afligem os portugueses em geral e os madeirenses em particular.

JMR – Austeridade é uma consequência e não uma causa. A causa é o endividamento do país, o endividamento da Região. Endividamento do país devido à loucura da dívida do engenheiro José Sócrates e dos governos do PS, e a loucura da dívida da Madeira, do endividamento excessivo dos governos do PSD do dr. Alberto João Jardim. Essas é que são as causas da situação difícil que o País e a Região estão a atravessar. Portanto, a austeridade é uma consequência. Agora, o que se pode é saber se a austeridade foi bem derramada, foi equitativa, foi justa para todos os cidadãos. E desse ponto de vista, o CDS/Madeira entende que não, que nalguns casos devíamos ter ido mais longe na taxação da banca, na renegociação das parcerias público-privadas, no emagrecimento das despesas do Estado, nos desperdícios e nas questões supérfluas e, também na Região Autónoma da Madeira, em vez de ter aumentado a carga fiscal, provocando esta asfixia das empresas e das famílias. Portanto, esses partidos da Oposição que nos criticam – e se é o Partido Socialista, não tem qualquer legitimidade. Não só porque é co-autor da dívida excessiva que se criou no país, como no passado, os deputados do Partido Socialista nunca discordaram do PS a nível nacional na Assembleia da República. Eu recordo que mesmo em 2007, quando se tratou da Lei de Finanças das Regiões Autónomas, ela era contrária aos interesses dos madeirenses, menos dinheiro da República para a Região, e na altura, os deputados do Partido Socialista votaram contra a sua própria terra.

FN – Falando do Partido Socialista, já agora, como vês a anunciada coligação do PS com um partido como o PTP, que alguns dizem ser uma coligação contra-natura?

JMR – Vejo mal, acho que o Partido Socialista é um partido responsável, é um partido do chamado “arco da governabilidade”, não é um partido de simples protesto… É um partido que é Governo nos Açores, que já foi várias vezes governo no continente, e na Madeira tem algumas câmaras municipais. E a verdade é que eu, em Outubro do ano passado, desafiei o líder do Partido Socialista para um entendimento entre o CDS e o PS para uma coligação pré-eleitoral, aberta a outras forças políticas, em que se criasse um movimento que unisse os partidos mas fosse para além deles, e conseguisse penetrar no eleitorado abstencionista, no eleitorado do PSD, tendo, naturalmente, um candidato que não fosse nem o líder do CDS, nem o líder do PS. Podia deixar de ser independente, mas tinha de ser uma pessoa com prestígio, uma pessoa que não estivesse na política activa e dura diariamente como nós estamos, capaz de encabeçar essa candidatura a presidente do Governo. Infelizmente esta ideia esbarrou na intransigência do líder do PS-Madeira, Vítor Freitas, em ser o candidato a presidente do Governo. É legítimo, o CDS obviamente aceita a decisão do Partido Socialista, mas não deixa de criticá-la. O PS procurou criar à esquerda uma grande coligação. Não conseguiu. Antes pelo contrário, a coligação que vai concorrer às eleições regionais é mais fraca do que aquela que ganhou a Câmara Municipal do Funchal. Tem menos dois partidos, o Bloco de Esquerda e o Partido da Nova Democracia. E depois também, temos que dizer que as autarquias que estão a ser geridas pelo PS, aponto o exemplo da CMF, pela crise que houve na coligação, mas também aponto o exemplo da Câmara Municipal do Porto Santo… Não são grandes exemplos a serem seguidos numa futura governação regional. Enquanto que o CDS pode dizer que quer replicar para a Região a governação da Câmara Municipal de Santana, uma governação de rigor, com incentivos aos sectores produtivos, e com defesa dos apoios sociais, e podemos replicar isto no plano regional, o PS não pode dizer que vai replicar no plano regional a gestão da Câmara Municipal do Porto Santo na governação da Região Autónoma da Madeira.

cds 043

FN – Porque é que a coligação com o PS não vingou, ao fim e ao cabo?

JMR – A questão foi, esbarrou na intransigência do líder do PS em ser candidato a presidente do Governo. Eu próprio lancei para a mesa (não vou dizer quais, porque a questão está ultrapassada) alguns nomes, quer da área do CDS, mas mais da área do PS, como sendo pessoas que podiam encabeçar essa coligação pré-eleitoral, como candidato a presidente do Governo. Repare, nós não deixaríamos de ser líderes partidários…

FN – Não quer avançar alguns desses nomes, mesmo?

JMR – Eu vou indicar dois nomes possíveis, do Partido Socialista, que acho que dariam bons candidatos, para não focar nomes do CDS: o dr. Luís Amado, com uma grande experiência governativa, quer como deputado na Assembleia Legislativa Regional, quer como governante a nível nacional e ministro dos Negócios Estrangeiros, e o dr. António Trindade, também com algum passado político, como vereador na Câmara Municipal do Funchal, com um grande presente como empresário… Acho que são duas pessoas de grande credibilidade, que poderiam encabeçar um projecto desta natureza.

FN –Porque é que insiste em ser, de certa forma, uma muleta do Miguel Albuquerque num eventual governo de maioria PSD? Não acha que será de certa forma o prolongamento, e não a renovação, que estará presente, algo que já se pode ver, de certa forma, nos potenciais candidatos apresentados e na práxis levada a cabo até agora, que inclui a apresentação de nomes que nem sequer foram levados à Comissão Política?

JMR – Eu acho que este PSD do dr. Miguel Albuquerque, não é muito diferente do PSD do dr. Alberto João Jardim. Aquele PSD que aplaudia ontem Alberto João Jardim, é o PSD que hoje aplaude Miguel Albuquerque. Obviamente que a cara mudou, mas o corpo, a estrutura orgânica, continua a ser a mesma, cheia de vícios, cheia de lobbys, de clientelas, de compadrios, que foram sendo criados ao longo deste 40 anos. Reconheço que há um discurso do dr. Miguel Albuquerque, algum discurso, que era da própria Oposição. Estou a falar em termos de propostas, o ‘jackpot’ parlamentar, que o CDS, desde 2007, tenta baixar.. Foi para a frente, uma proposta do CDS aprovada há pouco tempo no Parlamento regional, porque o dr. Miguel Albuquerque decidiu que assim seria. Os deputados do PSD, que três semanas antes, na discussão do Orçamento Regional para 2015 tinham votado contra a descida do ‘jackpot’, acabaram, depois do congresso do PSD, por aprovar a proposta do CDS de redução do ‘jackpot’. Desse ponto de vista, é positivo. Vem dizer que, no Dia da Região, falarão todos os partidos no Parlamento regional. Mas eu recordo que [Miguel Albuquerque], quando estava como presidente da Câmara Municipal do Funchal, nunca anuiu a que os partidos da Oposição falassem no Dia da Cidade. E, em 18 anos de gestão na CMF, aprovou menos de meia dúzia, cinco propostas, dos partidos da oposição nas vereações camarárias. Isto para lhe dizer que o PSD mantém, digamos, grande parte daquilo que nós consideramos negativo, do absolutismo do jardinismo, nos últimos 40 anos. Mas também temos a consciência da realidade política, e de que ele veio dar um novo fôlego ao PSD, fazendo crer às pessoas, mesmo que isso não seja verdade, que há alguma renovação no PSD. Há alguns nomes, obviamente, que nunca se iriam candidatar pelo PSD que agora aparecem, até personalidades independentes… Acho que confundiu nas suas listas o Funchal com a Madeira… Quando vemos que o primeiro lugar fora do Funchal é o vigésimo lugar, nós temos muitas dúvidas se a lista do PSD é representativa de toda a Região Autónoma da Madeira, e também da ilha do Porto Santo. Mas obviamente, o que o CDS diz é que quem quer governar sozinho não quer governar para todos. Isto é, nós defendemos que não deve haver nenhuma maioria absoluta, de nenhum partido, nas próximas eleições. E como disse na primeira resposta à primeira questão, eu gostaria que o CDS ganhasse as eleições. Isso está nas mãos dos eleitores. E o que eu escrevi na minha moção, que foi aprovada no congresso de Dezembro, há dois meses, foi esta frase que definirá a estratégia do CDS: O CDS fará no dia seguinte às eleições aquilo que o povo decidir no dia das eleições. Portanto, eu não pretendo ser muleta de ninguém, nem bengala de outro qualquer partido…

FN – Mas coligarem-se com o PSD será ‘realpolitik’…

JMR – Eu acho que vão ser necessários compromissos, entendimentos, acordos, consensos, entre as diversas forças políticas, e os parceiros sociais, no sentido de criar um compromisso em nome da Madeira, para a defesa dos nossos interesses, quer junto do Estado, quer junto da União Europeia. É por isso que eu acho mal que o dr. Miguel Albuquerque, a primeira coisa que fez no congresso do PSD foi ter pedido a maioria absoluta. Primeiro, acho que devia ter pedido desculpa a governação do seu partido, durante pelo menos a última década. E depois, pedir a maioria absoluta nestas circunstâncias, acho um erro político. Mas fica com ele. Espero que os madeirenses tenham aprendido que dar maioria absoluta a um só partido é ter um governo de metade da Madeira a governar contra a outra metade. É preciso um governo mais abrangente, que governe para todos.

FN – Falemos da saúde. Ela é, de algum modo, para o CDS, uma bandeira, nesta campanha?

JMR – Eu acho que é uma bandeira há muitos anos, em particular nos últimos quatro, porque, nós depois de termos um Serviço Regional de Saúde, que até foi uma referência nacional e até no plano europeu, hoje temos um Serviço Regional de Saúde em completa degradação, com saída dos melhores médicos, dos melhores enfermeiros, com desmotivação completa daqueles que ficam a trabalhar no SESARAM. E portanto, desse ponto de vista, é quase reconstruir o Serviço Regional de Saúde que tivemos no passado, se bem que com menores custos. Nós temos a consciência que o Serviço Regional de Saúde atingiu níveis de despesa incomportáveis para o orçamento regional. Mas temos também a certeza que este deve ser um assunto prioritário em qualquer orçamento. É por isso que o CDS-PP tem vindo a defender que apesar da regionalização da saúde ter sido feita na década de 80, o Estado deve garantir algum apoio à Madeira e aos Açores, no custeio desta despesa grande que é a Saúde nas Regiões Autónomas, assim como no sector da Saúde. Porque eu acho que o direito universal à Saúde e o direito universal à Educação devem ser assegurados pelas Regiões Autónomas, mas sobretudo pelo Estado português. É isto que diz a Constituição, quando diz que é uma tarefa fundamental do Estado, estes dois direitos dos cidadãos.

cds 040

FN – Falava há pouco na Câmara Municipal do Funchal. Gostava de lhe perguntar porque não deixa cair a CMF, uma vez que, com Artur Andrade (CDU) é o vereador que faz a diferença?

JMR – As câmaras não caem porque as decisões da maioria relativa não passam. Não há, sequer, na lei, a chamada moção de censura na Assembleia Municipal que fizesse cair o executivo camarário. Isto é, verdadeiramente, só por condições políticas muito adversas, isto é, se todas as oposições, neste caso o CDS, o PSD e o vereador da CDU se unissem constantemente contra as decisões da câmara, é que o presidente, e os restantes vereadores, poderiam demitir-se e provocar eleições antecipadas. Isso não tem acontecido. O presidente da CMF tem procurado, com algumas limitações, e sabendo que tem maioria relativa, falar com o CDS, sobre alguns documentos importantes para a cidade do Funchal. Estou a lembrar-me, designadamente, do orçamento e do plano de investimentos. E o CDS tem assegurado, quer por via da abstenção, quer por via do voto favorável, a governabilidade da Câmara Municipal do Funchal. Não estamos, obviamente, satisfeitos com a gestão da coligação Mudança. Mas já foi possível, através de negociações em que o CDS esteve presente, devolver por exemplo 1 por cento do IRS pago pelos munícipes do Funchal, aos contribuintes. Foi possível baixar o preço dos parcómetros, quer no centro, quer na periferia do Funchal, foi possível isentar de IMI imóveis que venham a ser qualificados nas zonas históricas, foi possível também uma redução de IMI para imóveis que venham a ter eficiência energética alta, para além de um outro conjunto de propostas do CDS que foram aprovadas, como por exemplo melhorias nos bairros sociais da câmara, e a retirada, durante o ano 2015 e 2016, do amianto dos bairros sociais camarários. É uma vergonha o ponto a que chegaram alguns bairros sociais da câmara. Há condições sub-humanas nalgumas casas. Há casas que foram construídas para serem provisórias há 40 anos, e estão permanentes. E portanto é necessário um grande esforço na CMF, de investimento nos bairros sociais. Por exemplo, a Câmara Municipal do Funchal tem agora um programa de apoio a pequenas reparações até 5 mil euros, de proprietários de casas e de apartamentos. Acho bem. Eu perguntei ao senhor presidente da Câmara, que não me soube responder, se a câmara vai apoiar proprietários na recuperação das suas casas. Tudo correcto, mas então os inquilinos da câmara, são tratados abaixo de cão, vivem em casas ainda com amianto e a chover dentro? Não, vamos também apostar nessa área. E portanto, desse ponto de vista, acho que tem que ser uma prioridade, e ficou indiciado no orçamento para 2015, mas precisa, claramente, de mais verbas nos próximos anos.

FN – Voltando ao Rui Barreto: vai continuar a apostar nele para as eleições legislativas nacionais do Verão?

JMR – Ele vai ser candidato a deputado. Agora, nas eleições regionais, tal como foi há três anos, e evidentemente, se vier a criar essas condições para ele ser candidato à Assembleia da República, naturalmente que será com gosto que o convidarei, porque acho que tem feito um excelente trabalho no Parlamento nacional, na defesa dos interesses da Madeira e do Porto Santo, mesmo indo contra as posições do partido nacional.

FN – Há quem acuse o CDS de ser ainda um partido de elites, um partido da ‘Madeira Velha’, que se renovou, digamos, através do acrescento da sigla PP “partido popular”. O que responde a isto?

JMR – Não é verdade. Quem frequenta as iniciativas do CDS, as sessões de esclarecimento, as nossas concelhias, quem olha para os nossos autarcas, quer na Câmara Municipal de Santana, quer na Assembleia Municipal de Santana, quer nas quatro Juntas de Freguesia que nós detemos – São Jorge, Santana, Fajã da Ovelha e Ponta do Pargo – quem olha para os nossos autarcas derramados pela Madeira e Porto Santo, para os nossos dirigentes, para a minha Comissão Política, quem olha para o nosso congresso, vê que essa acusação não é verdadeira. Aliás, nunca foi verdadeira. O CDS era conhecido, no plano nacional e no plano regional, no início da sua fundação, por ser um partido de quadros, isso é verdade. Depois, deixou de ser tanto um partido de quadros, até pelas circunstâncias políticas regionais, em que o PSD resolveu, qual abraço de urso, nos “retirar” esses quadros e essas sensibilidades que nós tínhamos. Acho que eu fiz um grande esforço nesse sentido, voltar a fazer do CDS aquilo que deve ser um partido: um misto de um partido de militantes, de quadros e de eleitores. Mas nós temos estudos sobre esta matéria que demonstram precisamente que é a classe média e as classes mais baixas que votam no CDS. Aliás, o partido tem algumas diferenças em relação ao partido nacional. Enquanto que a nível nacional devo reconhecer que, das reuniões partidárias, se nota, eu não diria elitismo, no sentido depreciativo do termo, mas se nota que há ali classes de menores rendimentos, classe média e classe de maiores recursos, no caso da Madeira, o que sobressai é sobretudo a classe média e as classes mais desfavorecidas.

FN – O que é ser hoje democrata-cristão na Madeira?

JMR – Ser democrata-cristão na Madeira faz cada vez mais sentido. No fundo, o CDS, é criado tendo por base a doutrina social da Igreja e as democracias cristãs, sobretudo a italiana, mas também de inspiração francesa, que nos anos 50, 60 e 70 dominaram uma boa parte da Europa… Acho que este papa veio dar um novo alento a essa doutrina social da Igreja, falando tu cá, tu lá, de problemas que as pessoas sentem no dia-a-dia, a doutrina social da Igreja nunca foi tão actual, basta ler as encíclicas sociais e sobre a economia, mesmo as do papa Ratzinger para chegar a esta conclusão, até porque estamos num mundo onde dominam os mercados e os sistemas financeiros. E portanto, há que ter aqui contra-balanços na parte social e na parte da justiça social. E aqui na Madeira, se nós formos ver os números, eventualmente somos obviamente mais desenvolvidos e mais ricos do que éramos em 1974, quando se deu o 25 de Abril. As condições de vida das pessoas melhoraram. Mas o fosso entre os mais ricos e os mais pobres cavou-se sobretudo na última década na Madeira, depois de algum equilíbrio nas duas primeiras duas décadas da Autonomoia. Faz todo o sentido ser democrata-cristão, democrata porque é preciso melhor democracia na Região, esta coisa de separar madeirenses entre bons e maus tem que acabar, precisamos de um novo tempo, como dizia há pouco, de entendimentos e compromissos, e cristão no sentido mais social da palavra, muito atentos às desigualdades sociais que se têm vindo a acentuar na nossa Região e no nosso país, muitas delas derivadas da crise económica por que estamos a passar.

cds 018

FN – A atitude do papa Francisco em relação a determinados departamentos fundamentais da Igreja como o Banco do Vaticano ou a Congregação para a Doutrina da Fé tem sido realmente inovadora, admite-se. Além da intervenção social. Mas uma das principais críticas que se tem ouvido ao longo do tempo à Igreja madeirense tem sido a sua colagem ao poder instituído, no caso o PSD, no longo período de jardinismo. Qual é o peso desta Igreja madeirense no seio do CDS-PP/Madeira?

JMR – Eu não tenho a menor dúvida que a Igreja madeirense, isso é um facto histórico, através de D. Francisco Santana, o bispo que veio logo a seguir ao 25 de Abril para a Madeira, ajudou a implantar o PSD e o dr. Alberto João Jardim, enquanto líder do PSD e candidato a presidente do Governo. E porquê? Porque esse bispo tinha um entendimento de que à direita do Partido Socialista só devia haver um partido político, e de que o PSD, sendo mais forte que o CDS, devia absorver este último. Era um problema ideológico, para o senhor bispo da altura. E resolveu apoiar o PSD, e até, de alguma forma, hostilizar o CDS. O CDS teve enormes dificuldades para se implantar na Madeira. Eu recordo que a primeira sede do CDS abre só em 1976, pouco antes das primeiras eleições regionais. E mais, que os nossos primeiros comícios foram boicotados. Houve uma tentativa de comício em Câmara de Lobos, com o eng. Adelino Amaro da Costa, que acabou aos tiros e não se realizou. Também o primeiro comício que acabou por se realizar, foi na freguesia da Camacha, através do dr. Basílio Horta, hoje presidente da Câmara de Sintra, do Partido Socialista, como independente. E nós tivemos dificuldades em nos implantar na Madeira, quer pela perseguição que a esquerda nos moveu, sobretudo os partidos extremistas de esquerda, quer por alguma hostilização do PSD, e até de algumas pessoas da Igreja ao CDS. Se bem que o CDS também tivesse contado, desde o início da sua fundação na Madeira, com figuras ligadas à Igreja Católica. Mas claramente, o senhor bispo D. Francisco Santana entendia que tinha de privilegiar o PSD, e em particular o dr. Alberto João Jardim, e fê-lo director do Jornal da Madeira, que foi uma arma importante, na altura, para o dr. Alberto João Jardim se impor, quer como líder do PSD, quer como candidato a presidente do Governo, substituindo, em 1978, o eng. Ornelas Camacho. E essa ligação entre poder e Igreja vem até aos dias de hoje, e é até marcada por esta associação que existe na comunicação social do Jornal da Madeira. Eu disse há pouco que a Madeira precisava de um novo tempo. Esse tempo, eu acho que está a chegar. É evidente que há muita gente com outras mentalidades na Igreja Católica. A Igreja Católica também já não tem a influência que tinha junto das populações, mas há padres com novas mentalidades, com diversidade de pensamento, há pluralismo dentro da própria Igreja, temos que reconhecer que este novo bispo, D. António Carrilho, fez um esforço também nesse sentido, de distensão de algum mau ambiente que por vezes existia entre hierarquia, clero e também o povo, e portanto julgo que estão criadas as condições para haver uma cooperação em benefício da população entre quem é Governo  e quem está à frente da Igreja, mas sem haver qualquer tipo de promiscuidade, como aconteceu no passado.

FN – Vejo aqui, num folheto relativo às principais ideias do CDS-PP para a governação da Madeira, uma preocupação em baixar os preços dos transportes aéreos e marítimos de passageiros e mercadorias, e ter uma boa ligação marítima de passageiros com o continente e o Porto Santo. Mas consta que o partido é financiado pelo Grupo Sousa e também pelo Avelino Farinha e Agrela. Gostava que comentasse essas insinuações.

JMR – Isso é absolutamente mentira. Até por isto. Como sabe, o CDS passou de dois para nove deputados em 2011. E portanto, tínhamos um determinado financiamento, o tal do ‘jackpot’, passámos a ter um financiamento substancialmente maior, porque, como sabe, o financiamento é por deputado, per capita. Tínhamos dois deputados, recebíamos uma determinada verba, com nove passámos a receber uima verba muito maior. Foi aí que nós escrevemos uma carta ao senhor presidente da Assembleia, considerando já na altura que era escandaloso o ‘jackpot’ parlamentar, e a propor que o CDS abdicasse de 30 por cento da verba que recebia do Parlamento regional. E o senhor presidente da Assembleia respondeu-nos que, ou abdicaríamos da totalidade da verba que recebíamos, ou então, tínhamos de a receber também na totalidade. Obviamente que não podíamos abdicar da totalidade, porque temos funcionários para pagar, e despesas do grupo parlamentar. E então o que fizemos? Usámos coerentemente esses 30% que o PSD não quis baixar do ‘jackpot’ parlamentar, e que o presidente da Assembleia não quis descontar mensalmente ao CDS, para criar o projecto ‘CDS Solidário’, com quatro grandes vertentes: apoio alimentar, porque isto coincidiu com o auge da crise económica na Madeira e com carências muito grandes por parte das pessoas mais desfavorecidas, com vales-farmácia, muitas vezes dirigidos aos mais idosos, que as suas baixas pensões não davam para comprar os medicamentos, apoio a jovens estudantes, quer dos ciclos do secundário, quer do ensino superior, e também algum apoio a instituições de solidariedade social. E portanto, nós não precisávamos de financiamento de nenhum empresário para sobreviver, porque tínhamos dinheiro suficiente do Parlamento regional, para financiar, quer a actividade do Grupo Parlamentar, quer indirectamente a actividade do partido. E mais: se as pessoas constatarem as nossas posições, em termos do que pensamos sobre a gestão dos portos, que deve baixar, claramente, as suas taxas e os seus preços, quer as praticadas pelo grupo que detém o porto do Caniçal, quer as praticadas também pela APRAM. Porque há uma taxa, chamada de topo de carga, que já não existe no continente e continua a existir na Madeira, para as importações. Se souberem quais são as nossas propostas em termos de redução (subsidiada, claro) dos preços dos transportes marítimos entre o continente e a Madeira; também em termos de redução de preços para o Porto Santo, que os preços são exagerados, quer os marítimos, quer os aéreos, que são um absurdo; se souberem que estivemos na primeira linha da defesa da manutenção do ferry entre Portimão, Funchal e Canárias, as pessoas verão que não há qualquer tipo de ligação, do ponto de vista político ou financeiro, a esses dois grupos. Aliás, posso também dar alguns exemplos na Calheta, onde os nossos autarcas muitas vezes votaram contra projectos da empresa Avelino Farinha e Agrela. Agora, isso não impede que as pessoas se conheçam ou sejam amigas. Amigos, amigos, negócios à parte, diz o povo e bem.cds 045

FN – Uma das críticas que tem sido dirigida aos partidos é que têm silenciado, de algum modo, as possíveis soluções para o regresso da Naviera Armas, ou de uma companhia similar, para estabelecer uma linha marítima entre a Madeira e o continente. Agora mais recentemente, diz-se que os partidos que muito falaram nisso anteriormente, têm falado menos. Quais são as vossas propostas concretas?

JMR – Tenhamos esta consciência: a linha que era efectuada pelo Armas, Canárias-Madeira-Portimão, era deficitária. A Naviera Armas perdeu muito dinheiro nesta linha. Apesar de tudo, estava em condições de continuar se o Governo Regional baixasse as taxas no porto do Funchal. Sendo a linha deficitária, ela é importante. É importante para a mobilidade dos residentes na Madeira, porque há gente que deve ter a opção de viajar de avião ou de barco; ela é importante do ponto de vista turístico, pois trazia nichos de mercado – estou a lembrar-me das autocaravanas – quer de Canárias, quer do Algarve, e era importante, sobretudo, em termos económicos: fazia chegar, semana a semana, produtos muito mais baratos à Madeira, que tem o custo de vida mais alto do país, designadamente produtos agrícolas. Assim como permitia que também a Madeira pudesse exportar alguns produtos para o sul do país. E portanto, desse ponto de vista, o que o CDS entende, é que há verbas da União Europeia, nos quadros comunitários de apoio – havia no anterior, há no próximo. Os Açores usaram, do anterior, 17 milhões de euros para subsidiar esta linha. Se nós considerarmos que na avaliação custo-benefício, e eu julgo que toda a gente conclui isso, é necessário uma ligação por ferry com o continente. E portanto, o que se deve fazer é abrir um concurso, onde se possam candidatar as empresas que têm ferrys, e que possam fazer esta operação, fazendo antes os estudos devidos, para que esta ligação possa ser subsidiada. Assim como eu acho que, face ao decréscimo de passageiros entre a Madeira e o Porto Santo, se calhar vamos no mesmo caminho de ter que subsidiar as viagens entre a Madeira e o Porto Santo, para tornar o destino mais barato, do ponto de vista dos transportes, aos madeirenses. Eu visitei há dias a ilha do Porto Santo, e parece realmente uma ilha fantasma, no mês de Janeiro, no mês de Fevereiro, e até Abril, com certeza. E portanto, se as viagens fossem mais baratas, quer as marítimas quer as aéreas, julgo que seria possível ter um turismo interno, mesmo de Inverno, que permitisse aumentar a economia do Porto Santo e criar emprego.

FN – Calheta e Santana são bastiões do CDS-PP/Madeira. As listas para as próximas eleições vão reflectir isso de algum modo, colocando candidatos dessas localidades em lugares elegíveis?

JMR – O CDS, em nove deputados da actual legislatura, tinha seis concelhos representados. E agora nas próximas listas, nos 20 primeiros lugares, teremos todos os onze concelhos da Madeira representados. Isto é, ao contrário de outros, que têm uma lista elitista, sulista, eu acrescentaria, liberal, o CDS terá uma lista realista, uma lista competente, e uma lista representativa de todos os concelhos da Madeira e do Porto Santo.

FN – Uma última pergunta: quais são, para si, as três prioridades actuais da Madeira?

JMR – A primeira decisão que eu tomaria como presidente do Governo era chamar todos os partidos à sede da presidência do Governo, e todo os sindicatos, ou associações sindicais e confederações patronais, para se chegar a um compromisso na defesa dos interesses da Madeira e do Porto Santo. E nessa base, há três prioridades: a primeira é, claramente, pôr em prática o plano estratégico do turismo para a Madeira. Porquê? Porque nós temos taxas de ocupação de 60 por cento, temos margem de progressão, e depois temos uma receita por quarto muito baixa, abaixo das ilhas Canárias, que são um destino de massas, quando a Madeira pode e deve ser um destino de excelência. Isto é, podemos ter mais turistas, e sobretudo mais receita turística. Isso é importante para o orçamento regional e importante para criar emprego, que acho que é outra grande prioridade. E depois o turismo permite também uma coisa: que é alavancar outros sectores económicos, porque mais turistas representam mais consumo de produtos regionais, agrícolas, agro-alimentares, pecuários, mais serviço para os taxistas, mais comércio, mais emprego. E por isso o turismo pode e deve ser a mola, a alavanca, da recuperação económica da Região Autónoma da Madeira, e criando emprego. A segunda grande prioridade, eu acho que é fazer realmente do Centro Internacional de Negócios um poderoso instrumento de captação de mais investimento estrangeiro, de mais empresas, e portanto, de mais receita fiscal, para poder fazer a consolidação orçamental sem prejudicar a terceira prioridade: que é o combate às desigualdades sociais e a melhoria do Serviço Regional de Saúde, com a construção, se bem que faseada, do novo hospital para a Madeira.