A Câmara Municipal de Câmara de Lobos no âmbito da discussão pública do plano Mais Habitação, apresentado pelo Governo Central, submeteu o seu contributo para a discussão pública do programa, discussão essa que termina hoje 24 de Março.
“António Costa apresentou ao país, no último dia 17 de Fevereiro, um pacote de medidas no âmbito da habitação, tendo sido aberta a discussão pública sobre o intitulado programa Mais Habitação, que decorreu até ao dia de hoje, 24 de Março, depois do prazo ter sido estendido, por solicitação da Associação Nacional de Municípios, de maneira a que os municípios pudessem analisar de forma mais profunda as propostas de lei que balizam as referidas medidas”, recorda o município camaralobense.
Enquanto parte interessada, com projectos a decorrer no âmbito da sua Estratégia Local de Habitação, a Câmara M Municipal não podia deixar de apresentar os seus contributos para esta discussão. Os mesmos foram submetidos na plataforma nacional de consulta pública (ConsultaLex), nos seguintes termos:
“No âmbito da consulta pública ao programa Mais Habitação, a autarquia de Câmara de Lobos, vem por este meio apresentar o seu contributo para a discussão pública.
Primeiro há que lamentar que as medidas apresentadas, de forma incipiente, tenham surgido sem terem sido ouvidos os autarcas, conhecedores da realidade dos seus territórios, tendo sido remetidos, como recurso, para discussão pública, eventuais contributos.
Em boa hora a ANMP solicitou a prorrogação do prazo de participação, que era demasiado curto para que as autarquias analisassem de forma mais exaustiva a proposta de lei que sustentará as medidas apresentadas publicamente.
A autarquia de Câmara de Lobos entende que não é proibindo, impondo e restringindo que resolve um problema grave, em Portugal, que é o acesso a habitação a preços acessíveis.
Muitos municípios do país, elaboraram, à semelhança de Câmara de Lobos a sua Estratégia Local de Habitação. Documento onde foram plasmadas as reais necessidades dos concelhos, informadas pelo conhecimento da realidade social e económica dos respetivos territórios.
Ainda antes desta consulta pública, o Estado, na elaboração das propostas de lei que balizarão o programa Mais Habitação, deveria ter utilizado este recurso, a que o próprio Ministério da Habitação tem acesso, para propor medidas que se adequassem a totalidade do território, tendo em conta as especificidades do país real, que se estende muito além das áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto.
O Governo Central não pode fazer tábua rasa desse conhecimento, imputando de forma vertical medidas que se sobrepõem às competências municipais legalmente previstas.
Por exemplo, impondo a simplificação dos processos de licenciamento municipal, sem ter em conta os potenciais resultados negativos a nível de ordenamento urbanístico que dai podem decorrer.
Não obstante, concordamos que se simplifiquem e flexibilizem os critérios de construção, mas entendemos, que é igualmente importante que se flexibilizem os valores máximos por metro quadrado, adstritos a programas, como o 1. ° Direito, cujos concursos de concessão/construção a promover pelos municípios, correm o risco de ficar vazios pela falta de rentabilidade mínima para os promotores.
Promotores que se candidatem a construir habitação no Município de Câmara de Lobos a custos controlados, receberão, de acordo com os critérios estabelecidos, o máximo de ao de 1.555 euros, ao metro quadrado, por área bruta privativa. Valores manifestamente insuficientes para atrair investidores e que põe em grande risco a execução do PRR por todo o país.
A oferta de habitação a custos acessíveis deve ser promovida não só pelo Estado, mas também pelos privados, através da criação de incentivos, de índole fiscal, por exemplo em sede de IRC, que descriminem, de forma positiva, as empresas que dediquem parte da sua atividade a este sector.
Tal, seria uma forma a incentivar a que não se crie oferta apenas para segmentos opostos do mercado: pelo lado do estado, habitação social para famílias com baixos rendimentos e por parte dos privados habitação direcionada para pessoas com elevado poder de compra.
É preciso criar oferta para as famílias de classe média, arredadas do mercado imobiliário de aquisição e de arrendamento. Famílias que são duplamente prejudicadas, apesar de serem responsáveis coletivamente por “parte de leão” dos impostos arrecadados pelo Estado. Agregados com rendimentos demasiado parcos para aceder ao mercado tradicional, mas com rendimentos considerados altos, por critérios burocráticos, para serem considerados para habitação a custos controlados.
Há que resolver os problemas habitacionais das classes sociais mais baixas, mas a Recuperação e Resiliência, princípios fundamentais do plano Europeu, passa também, de forma obrigatória, pelo reforço e manutenção de uma classe média robusta.
No que concerne à proposta de arrendamento forçado de habitações devolutas, dúvidas constitucionais à parte, a imposição, mais uma vez sem consulta, sobre os municípios da responsabilidade de executar coercivamente as obras necessárias, sendo ressarcido por conta das rendas devidas, apenas vem onerar as autarquias, que já verão os seus rendimentos reduzidos por via da isenção do IMT e IMI.
O IMI e o IMT são receitas próprias dos municípios essenciais para a promoção de políticas de habitação locais. Compete às Autarquias e não ao Estado determinar taxas máximas de IMI, bonificações, isenções, agravamentos e sobretaxas, bem como a aplicação dos rendimentos gerados.
A solução mais coerente seria pelo lado do aumento da carga fiscal a nível de IMI, determinada localmente pelos municípios, sobre os proprietários de prédios devolutos de forma a incentivar a sua recuperação e colocação no mercado.
O problema do mercado reside na escassez da oferta, penalizar por via fiscal os proprietários de prédios devolutos, com especial ênfase os grandes fundos imobiliários cujo o core business passa precisamente pelo estrangulamento do mercado para valorização dos seus ativos, será a via mais correta.
Os níveis de eficiência energética exigidos, também encarecem a construção, já agravada pelos custos da insularidade, do nosso território em particular. A uniformização destes critérios não têm em consideração a realidade climática e de produção energética na Região Autónoma da Madeira.
Com efeito, o Arquipélago da Madeira destaca-se pela produção de energia verde, sendo que em 2025 a Empresa de Eletricidade da Madeira prevê que 50% da produção energética Regional seja proveniente de energias renováveis, aumentando esse valor para 60% em 2030. Atualmente existem picos de produção em que a energia verde produzida representa 70% da fatura energética regional.
Face a esta realidade consideramos imperativa a adaptação dos critérios de eficiência energética à realidade Regional.
O Alojamento Local representa 40%, do alojamento do turismo nacional. Emprega muita gente, cria riqueza, sendo que 25 mil PME fazem desta atividade o seu negócio.
73% dos Al situam-se nos distritos de Lisboa, Porto e Faro. Os municípios, cuja oferta de AL´s não é significativa, não podem ser privados deste tipo de investimentos por força de uma visão centralista que não estudou o impacto que esta medida tem nas economias locais.
Câmara de Lobos apostou no turismo como vetor estratégico de desenvolvimento concelhio. Num território curto como a ilha da Madeira em que a proximidade geográfica do maior centro turístico da ilha, a cidade do Funchal, configurou-se durante muitas décadas como um entrave ao investimento turístico no nosso concelho, conseguimos contrariar esse fator. Atraímos o maior grupo hoteleiro português, para a construção de duas unidades hoteleiras na baixa da cidade. Este investimento funcionou como catalisador para que pequenos investidores apostassem na reconversão de algumas habitações em AL, complementando desta forma os seus rendimentos.
Quartar o AL em territórios em plena expansão turística, seja por via da limitação da emissão de licenças, seja por via de sobretaxas fiscais, é comprometer o crescimento turístico de muitas regiões periféricas aos grandes polos de atração, que mesmo com a limitação da emissão de novas licenças, continuarão a atrair, por via da oferta de alojamento já existente, a maioria dos visitantes.
O que faz sentido é anunciar a criação de incentivos para investidores, que promovem habitação, melhorar as normas do PRR e criar apoios para as pessoas que procuram a sua primeira habitação.
O que faz sentido é o e Estado recuperar os cerca de 723.000 imóveis devolutos que detém e disponibilizar os mesmos em regime de renda acessível podendo e devendo a gestão desse património, depois de devidamente recuperado, ser atribuída aos municípios, conhecedores de facto das carências habitacionais dos seus territórios. A máquina do Estado é demasiado distante das realidades locais e demasiado burocrática, para atuar como senhorio de milhares de portugueses. As autarquias, têm know-how consolidado nesta matéria.
O que faz sentido é o Estado voltar a apostar no sector cooperativo disponibilizando prédios do seu património aptos para construção e criando de forma paralela mecanismos de financiamento com condições que incentivem a construção nestes moldes.
O Município de Câmara de Lobos tem a seu dispor 47 milhões de euros no âmbito do 1º Direito. A execução plena deste valor, à semelhança de outros municípios que beneficiam e bem deste programa, apenas é possível por via da simplificação de processos técnicos e burocráticos que colidem com a realidade dos seus territórios. Não o fazer é por em causa a oportunidade que o PRR representa, não o fazer é prestar um mau serviço ao país e perpetuar o problema de habitação existente.”