Carlos Martins, da Ordem dos Médicos: secretário da Saúde Pedro Ramos tem condições para continuar no cargo

Fotos: Rui Marote

O otorrinolaringologista Carlos Martins é o recém-empossado presidente da Ordem dos Médicos na Madeira. Em entrevista ao FN, fala do coronavírus, das reivindicações dos médicos, em matéria de carreiras e na tão mediatizada contestação à nomeação de Mário Pereira para director clínico do SESARAM. Aborda ainda a estratégia governamental para a saúde e lamenta a fala de entendimento entre médicos da medicina geral e familiar e os colegas da medicina hospitalar. Comenta ainda a influência que o novo hospital terá na melhoria dos serviços de saúde e problemas como as listas de espera para cirurgias e consultas e a falta de medicamentos no hospital Dr. Nélio Mendonça. Elogia o secretário regional da Saúde, Pedro Ramos, e acredita que tem condições para continuar como governante com a tutela da Saúde.

Funchal Notícias – O Dr. Mário Pereira renunciou ao cargo de director clínico, pondo fim a uma polémica que envolveu a sua nomeação para o cargo e a grande contestação por parte dos médicos do SESARAM. Parece que vai ser encontrada uma solução alternativa, que não se sabe ainda exactamente qual é. Teoricamente há de passar por um consenso entre os médicos e o Governo. Qual é a sua opinião sobre a melhor forma de resolver este imbróglio?

Dr. Carlos Martins – O Dr. Mário Pereira foi imposto num suposto acordo partidário entre o PSD e o CDS, acordo esse que eu não conheço, nem tenho de conhecer. A nomeação do director clínico segue trâmites legais. A presidente do Conselho de Administração propõe ao secretário regional da Saúde, Pedro Ramos, duas a três pessoas, e ele vai aceitar, ou não. É assim que se deve proceder. Se alguém diz: “Agora quem manda aqui sou eu!”, e quem vai ser [director clínico] é o Dr. Mário… Acho incorrecto.

Funchal Notícias – Um dos argumentos invocados na discussão, contra esta nomeação, é que de facto esta seria uma nomeação política. Mas não é verdade que anteriormente as nomeações, inclusive dos chefes de serviço, não seguiam algum critério político? Parece haver uma certa ingenuidade neste argumento, quando se diz que nunca foi nomeado ninguém que estivesse de bem com o poder… Também não é bem verdade, não é?

CM – Não é bem verdade… Eu posso dar o meu exemplo. Fui director clínico entre Dezembro de 2014 e Maio de 2015. Fui convidado pelo então secretário Dr. Francisco Ramos. Pedi-lhe um dia para pensar, e aceitei. Eu neste momento estou em dedicação exclusiva, só trabalho no Hospital. É uma coisa que se poderia ter em conta. Uma pessoa que se dedica ao serviço público. O Dr. Francisco Ramos não me perguntou se eu era do PSD, do CDS, do Partido Comunista. Nunca me perguntou isso. Eu acho que nomeação política, tudo bem. Agora, nomeação político-partidária, é que eu já não estou de acordo.

FN – O que mais incomodou os médicos terá sido a figura do Dr. Mário Pereira, ou as afirmações do presidente do Governo Regional, de que “quem quiser que se demita”?

CM – Isto não tem nada a ver com a pessoa. Têm de haver regras nestas coisas. As pessoas têm de ser ouvidas, e depois dar a sua opinião. Esta é a minha maneira de ver as coisas. Se é imposto, “é assim e é assim”… Devia haver um diálogo. Sabemos que os nossos governantes foram eleitos pelo povo. Ninguém está a pôr em questão o Dr. Mário Pereira, como ortopedista. Agora, o que ele disse durante dez anos [na actividade partidária e parlamentar] é que nos marca um pouco.

FN – Ele apontou insuficiências no Serviço Regional de Saúde. Os médicos levam pessoalmente algumas das críticas que ele fez?

CM – Sim, posso falar por mim. Eu estou no serviço público e sinto-me incomodado por quem diz mal do SESARAM. Sou médico, mas há também os enfermeiros, os assistentes operacionais, os administrativos… Todas as pessoas que trabalham no serviço público trabalham com amor à camisola. Acho que isso é que deve prevalecer. Se alguém diz mal do SESARAM, eu sinto-me mal, sinto que me estão também a criticar.

FN – Por onde acha que passa a solução para esta situação? O bastonário da Ordem dos Médicos, recentemente de visita à Madeira, sugeriu uma consulta pública aos médicos para a escolha de um novo director clínico.

CM – É isso que eu defendo.

FN- Acredita que o Governo Regional vai optar por uma solução dessas? Ou vai avançar com uma outra sugestão para o cargo de director clínico, que já saiba antecipadamente que pode ser aceite pelos médicos?

CM – O futuro eu não prevejo, mas acho que devia ser seguida a opinião do nosso bastonário. Mas eles é que governam. Tem de ser uma pessoa consensual. Se não for…

FN – Mas o Governo também pode não aceitar essa consulta pública aos médicos, sugerindo simplesmente um nome que saiba já antecipadamente que não criará tanta celeuma, que seja mais susceptível de ser aceite.

CM – Sim, é evidente. Nós pomos uma sugestão. Se os governantes não aceitam, pronto. O que é que podemos fazer? Espero que cheguemos a um acordo. Eu fui a pessoa que entregou uma carta a pedir uma audiência ao sr. presidente [do Governo Regional]. Esperemos que nos receba dentro do mais curto espaço de tempo possível, dentro das possibilidades da sua agenda.

FN – Com esta renúncia do Dr. Mário Pereira, sente que a classe médica está mais apaziguada, ou está expectante relativamente ao que vai acontecer?

CM – Estamos expectantes. Não vamos dar nenhum passo em frente. Vamos aguardar a resposta dos governantes.

FN – Muitas críticas têm sido dirigidas ao Serviço Regional de Saúde. Pelo Dr. Mário Pereira ao longo dos anos, mas não só. O SRS tem sido alvo de críticas de todo o género e de todo o espectro político, e entre as mesmas têm estado as demoras nas listas de espera para consultas e cirurgias, embora o discurso do secretário regional Pedro Ramos seja o de que a saúde na Madeira está muito melhor do que no continente, que se tem investido muito nos cuidados de saúde primários, e que está a trabalhar insistentemente para melhorar. O bastonário, há dias, aqui na Ordem dos Médicos da Madeira, traçou um quadro negro do Serviço Nacional de Saúde e basicamente disse que o Serviço Regional de Saúde, apesar das insuficiências existentes, ainda está muito melhor. Qual é a sua opinião, enquanto presidente da Ordem dos Médicos na Madeira, sobre os problemas do SRS e sobre as prioridades do que é preciso fazer e melhorar?

CM – Acho que o Dr. Pedro Ramos tem feito um bom trabalho no Serviço Regional de Saúde. Tem feito muita coisa. Neste momento estamos com um programa de abatimento de listas de espera cirúrgicas, que estão a diminuir. Mas eu penso que o problema das listas de espera cirúrgicas nunca há de ter solução. Porque se entram dez [para operar] e só saem cinco… Nós podemos começar a operar às 8 da manhã e acabar às 8 da noite. Mas é uma coisa impossível. Se entram muito mais pessoas, e saem menos…

FN – Mas o problema é que também saem muitos médicos para o privado, e entram poucos para o público, não é?

CM – Não, não… Penso que não… Aqui na Madeira há alguns que têm saído do serviço público, mas penso que a maior parte vai-se aguentando no serviço público.

FN – Mas não têm entrado muitos médicos novos.

CM – Todos os anos nós temos 40 médicos a fazer aqui o internato geral, após o final de curso. Ao fim de um ano concorrem para o internato de especialidade, e fazem a especialidade… Há uns que ficam, outros que vão embora… Mas isso é assim, é normal…

FN – Mas não é o suficiente para dar vazão a tantas necessidades.

CM – Posso falar do meu serviço [Otorrinolaringologia]: neste momento temos seis pessoas efectivas. E temos três internos. E quando for embora, estou descansado de que vamos ter um serviço muito bom. Este pessoal novo…

FN – Falou no bom trabalho que o secretário regional da Saúde, Pedro Ramos, em seu entender, está a fazer. Mas este governo tem mostrado instabilidade no sector da Saúde, uma vez que já houve vários secretários desta tutela que passaram pelo GR e saíram. E agora o que se diz é que é muito provável que tendo caído Mário Pereira, caia também Pedro Ramos do cargo de governante. É o que se antecipa, e terá mesmo sido uma imposição de Mário Pereira…

CM – Eu não tenho nada a ver com isso. Isso são coisas, lá… Jogos de poder…

FN – Mas a eventual mudança de um secretário da Saúde trará aos médicos a necessidade de lidar, outra vez, com uma outra liderança.

CM – Mas não se vai alterar o que está a ser feito, na Saúde, de um dia para o outro. Tudo o que está para trás, vai-se esquecer? Isso também não é assim. Haverá uma continuidade.

FN – Acredita que o Dr. Pedro Ramos poderá manter-se no cargo?

CM – Na minha opinião pessoal, acho que sim.

FN – Enquanto representante legítimo da classe médica na Madeira, quais são as suas prioridades?

CM – A principal é defender as carreiras médicas. Defender a relação médico-doente, que é a questão principal na Saúde, a empatia entre médicos e doentes, e aumentar a literacia da população [em termos de Saúde]. O principal é defender as carreiras médicas. Começamos da base e vamos progredindo, através de exames, e passamos de uma categoria para outra até atingir o máximo da carreira.

FN – É uma motivação essencial para os médicos trabalharem no sector público.

CM – Exactamente. É imprescindível. Tecnicamente é assim que se evolui.

FN – Sente que os médicos que trabalham no sector público hoje em dia estão desmotivados por causa das carreiras?

CM – Não estão desmotivados… Continuam a haver carreiras médicas…

FN – Sim, mas as reivindicações dos médicos não têm sido todas satisfeitas.

CM – Pois, mas penso que nunca ninguém pôs em questão as carreiras médicas. Neste momento, o que acontece é certas direcções de serviços não serem… Se não houver director, que tem de ter a categoria de assistente graduado sénior, eventualmente há casos em que o lugar pode ser ocupado por um médico da categoria inferior, que é graduado. Mas quando é só graduado, desde que não haja contestação, desde que os médicos aceitem, acho que deve ser essa pessoa.

FN – Não há também demasiadas chefias no SESARAM? O público espantou-se um bocado com a quantidade de chefes de serviço e departamento que contestaram Mário Pereira como director clínico. Não é um caso de haver “muitos chefes e poucos índios”?

CM – Não, não…

FN – Não há chefias em excesso?

CM – Não… Aqui na Madeira temos uma coisa muito boa. Temos as especialidades quase todas. Só há uma ou duas especialidades que não temos. Até cirurgia cardíaca temos aqui na Madeira, que é uma coisa de alto nível técnico.

FN – A medicina nuclear também é uma coisa de alto nível técnico, mas tem havido muitas críticas a esse sector… As declarações polémicas do Dr. Rafael Macedo impactaram bastante a classe médica e a opinião pública…

CM – É evidente… As declarações que ele fez incendiaram… E as pessoas sentiram-se atingidas. A dizer que colegas estavam a fazer coisas quase a matar os doentes… Isso é gravíssimo. É a pior coisa que pode acontecer aos médicos. Dizer que eu estou a fazer as coisas mal e que estou a matar pessoas… Que eu saiba, um médico é para dar saúde às pessoas…

FN – Mas ele apontou que a medicina nuclear estava subaproveitada, que a gestão hospitalar estava a enviar muitas competências da medicina nuclear para o sector privado e que não estava a aproveitar integralmente as capacidades do serviço.

CM – Eu não me meto nessas coisas. Ele que demonstre que isso é tudo verdade.

FN – Falemos do novo hospital. Tem sido uma grande aposta, da qual muito se tem falado. Acha que de facto o novo hospital da Madeira contribuirá decisivamente para melhorar a qualidade dos serviços de saúde prestados na Madeira?

CM – Penso que sim. Sem qualquer dúvida. A estrutura é importante, embora o mais importante sejam as pessoas que estão lá dentro… Mas esta malta nova é que vai engrandecer a nossa classe.

FN – Mas a malta nova não está muito satisfeita com aquilo que ganha no sector público.

CM – Pois. Eu abordei no meu discurso de tomada de posse, o pensar em voltar à exclusividade…

FN – O novo hospital é importante, mas também seria importante melhorar os serviços existentes no Hospital Dr. Nélio Mendonça e no Hospital dos Marmeleiros…

CM – Sim, sim… O Hospital dos Marmeleiros, penso que…

FN – Hoje em dia há muito quem olhe para os Marmeleiros como uma estrutura hospitalar um bocado terceiro-mundista.

CM – É… pode-se dar aqueles retoques todos que estão a dar, mas pronto…

FN – Seria preciso dar uma grande volta àquilo para de facto adaptá-lo ao séc. XXI.

CM – É verdade, sem dúvida. Mas estão a pensar em mudar um serviço lá da medicina para cá para baixo… não sei… são coisas que eu também não estou dentro…

FN – E o Hospital Dr. Nélio Mendonça? O que acha que seria necessário para o melhorar mais?

CM – Neste momento… as instalações são as que existem… Agora em cima da Consulta Externa e Cirurgia de Ambulatório estão a fazer lá uns quartos… Fala-se que algumas camas da medicina irão para lá… Mas também não tenho conhecimento sobre o que estão a pensar montar, nisso…

FN – Mas basicamente o Hospital tem condições mínimas para funcionar?

CM – Sim…

FN – Mas poderia ter condições muito melhores, com um investimento relativamente razoável?

CM – Penso que não.

FN – Teria de ser um grande investimento? Uma grande ampliação?

CM – Sim, mas essa ampliação já é de outras calendas… Já foi esquecida essa ampliação…

FN – Um problema que tem sido abordado ciclicamente na imprensa é a falta de medicamentos no Hospital. Inclusive para doenças graves como cancro…

CM – Isso são coisas da gestão hospitalar.

FN – Mas que prejudicam a imagem do Serviço Regional de Saúde.

CM – É evidente. Penso que não há ninguém que pense que não queremos administrar remédios. Agora, se há dinheiro para pagar, se não há… Vai tudo bater ao mesmo.

FN – A falta de medicamentos é um problema que não é exclusivo da Madeira, acontece também a nível nacional, e frequentemente tem a ver com falhas dos fornecedores…

CM – Exacto. Mas penso que isso é uma coisa que está ultrapassada. Se não há [medicamentos] hoje, pode ser daqui a três dias…

FN – Mas pergunto-lhe: acha que o Governo Regional tem, de facto, uma gestão e uma visão integrada para a saúde na Madeira? Que já ouviram muitas pessoas, sem dúvida, até porque já passaram pelo Governo Regional três secretários da tutela. Mas acha que o GR tem de facto uma visão a longo prazo sobre o que a saúde na Madeira necessita?

CM – Acho que sim, eles têm uma perspectiva, e estão a aplicar o programa que apresentaram ao povo, e que foi votado. Se o povo votou neles… Agora eles têm direito a implementar a sua política de saúde.

FN – Diria que há uma área da medicina que necessite de ser mais desenvolvida na RAM?

CM – O maior problema, do meu ponto de vista, é a relação entre a medicina geral familiar e a medicina hospitalar.

FN – Em que sentido?

CM – Os médicos da medicina geral familiar dizem [aos colegas da medicina hospitalar] “vocês não recebem os doentes”… Há muitos mal-entendidos entre os colegas. Essa é uma coisa que eu vou tentar, nos meus três anos de mandato na Ordem, fazer. Juntar os médicos. Um diz uma coisa, outro diz outra… Temos de chegar a consensos. Não é dizer mal, que aquele está a dizer não sei quê que não é certo, que eu mando o doente e depois… Essa parte, a ligação entre as pessoas, é que tem de ser melhorada. Na minha campanha, reparei nisso. E incentivei: “Vocês, quando tiverem um problema, liguem para o colega, falem com o colega, e cheguem a um acordo”. Há um pouco de falta de diálogo.

FN – Uma coisa que tem sido também criticada é a falta de médicos de família. Acha que neste momento existe cobertura suficiente na Região?

CM – Já estamos com uma boa cobertura. A nível da região norte da Madeira, penso que já está tudo mais ou menos equilibrado. No sul faltam algumas coisas, mas penso que estamos no bom caminho.

FN – Notei no seu discurso de tomada de posse, e nesta conversa voltou a falar nisso, a abordagem à necessidade da humanização da relação médico-paciente. Parece-me uma coisa básica, essencial. Mas digamos que há colegas seus que têm uma visão estritamente científica das coisas e não cultivam muito essa relação.

CM – Mas isto é cada um… veja… não posso falar pelos outros.

FN – Claro, mas sente que é necessária uma mudança de atitude por parte dos médicos para conquistar a confiança da população?

CM – Isso é para fortalecer a relação. Os médicos são pessoas que se dão muito bem com os doentes, e a relação do médico com o doente é uma das coisas mais importante que existe na medicina. Temos de pegar nessa relação e não a largar nunca. Não se a pode perder, essa relação humanista. Não pode ser só científica. As pessoas a carregarem em botões e em computadores, e o doente está ali e nem sequer se olha para ele. Isso também… Esta coisa da informática é muito bonita, mas antigamente não havia informática e falávamos mais com as pessoas. Falo por mim. Acho que todos os médicos da Madeira são pessoas idóneas, que têm respeito pelos doentes. Isso é algo que nem se põe em questão.

FN – Qual a sua opinião sobre a actual capacidade de resposta do Serviço Regional de Saúde às doenças cancerosas? Acha que neste momento existe uma resposta bem montada?

CM – Temos uma resposta muito boa. Antigamente tínhamos poucos oncologistas. Lembro-me do Dr. Mário Passos, antigamente, quando cheguei à Madeira, era o único… Mas já nesse serviço fazíamos oncologia, no serviço do Dr. Alivar Cardoso… Operávamos aqui… Muitos diziam, em congressos, “na Madeira sabem lá operar cancro!” Achavam que lá eles é que sabiam. O Dr. Alivar foi uma pessoa muito importante, nisso. Tenho uma grande memória dele.

FN – Para os ilhéus, problemas como o cancro, que obrigam a deslocações ao continente, são mais problemáticas…

CM – Sim, antigamente tinham sempre de ir, mesmo… Não havia radioterapia… Agora há novas condições. As instalações de radioterapia em Santa Rita foram uma vitória importante. Antigamente as pessoas tinham sempre de ir para lá com a família, sujeitar-se àqueles tratamentos… Agora, com novos médicos… Nos últimos quatro anos devem ter estado uns quatro ou cinco colegas da oncologia… e melhorou bastante.

FN – Emergências resultantes de catástrofes naturais, como a aluvião do 20 de Fevereiro de 2010 ou incêndios… Estamos preparados para dar resposta, temos médicos, serviços, espaços suficientes?

CM – Penso que sim. O actual secretário da Saúde, Dr. Pedro Ramos, montou um sistema eficaz. Tem apostado muito nisso e muito bem, é reconhecido a nível nacional e internacional.

FN – Falemos agora do grande assunto do momento, o coronavírus, COVID-19. Parece haver uma espécie de psicose colectiva em torno do assunto. Não é para brincar, é evidente, mas, em seu entender, há excessos, relativamente ao muito que se tem falado, quer da parte dos media quer das entidades oficiais e de saúde?

CM – É preciso ver uma coisa, é que isto não é fácil, uma pandemia… Eu já tenho 63 anos e não me lembro de ter havido uma pandemia destas… Talvez a gripe A, há uns anos atrás…

FN – Bem, mas já houve ainda recentemente a gripe das aves, o vírus do Nilo Ocidental, a gripe suína, a doença das vacas loucas, o ébola…

CM – Olhe, quando eu estava na direcção clínica houve um suspeito do vírus ébola… E eu acho que mudei de cor várias vezes, quando me disseram que havia um suspeito de ébola no Serviço de Urgências. Mas felizmente não era nada. Acho, enfim, que estamos minimamente preparados.

FN – Mas não é verdade que a nível mundial morrem para aí 650 mil pessoas vítimas de gripe todos os anos?

CM – Sim, isso é verdade. Mas ninguém fala nisso.

FN – Enquanto que o coronavírus tem uma taxa de mortes de uns 2,5 por cento…

CM – Sim, é verdade. Há uma certa histeria.

FN- O que aconselharia à população, que anda tão preocupada?

CM – Aquelas coisas básicas. Lavar as mãos, são aquelas coisas. Quando se espirrar, não espirrar para a frente mas para o antebraço.

FN – Li um estudo no “New England Journal of Medicine” que comparava este vírus com o SARS e concluía que não era tão grave, mas que se espalhava mais depressa, e que podia colocar um sério problema a unidades hospitalares menos preparadas. Acha que o Hospital Dr. Nélio Mendonça está suficientemente preparado para fazer face a um alto número de infectados?

CM – O pior era o vírus MERS, do Médio Oriente, que tinha uma taxa de mortalidade de uns trinta por cento. Este [COVID-19] fala-se numa taxa de mortalidade de 2 a 4 por cento. Quanto ao Hospital, o Governo está a fazer tudo o que é possível para responder aos casos que aparecerem. Agora, se acontece, isso aí já não sei. Uma coisa é entrar um ou outro suspeito de coronavírus; outra é entrarem 50 indivíduos ao mesmo tempo. Aí, é melhor ficar em casa de quarentena…

FN – Mas as entidades regionais estão a acompanhar convenientemente a situação e a acautelar as precauções necessárias?

CM – Acho que sim.

FN – Só uma última pergunta: tem algum comentário a fazer à exigência feita pelo Dr. Mário Pereira, de ir integrar a comissão de acompanhamento do novo hospital da Madeira?

CM – Não tenho nenhum comentário a fazer.