
Fotos: Rui Marote
Os militares da Madeira que, conforme o FN referiu na reportagem de ontem, na sua grande maioria, constituem a VIII Força Nacional Destacada que partirá no princípio de Novembro para o campo Besmayah, a 50 quilómetros de Bagdad, no Iraque, estão a passar por uma fase de aprontamento não só físico e técnico, mas também psicológico para a missão. Compete aos soldados e aos seus familiares prepararem-se adequadamente para enfrentar um período de seis meses de afastamento, o que pode parecer natural dada a profissão que estes homens (e uma mulher) escolheram, mas que não é tão fácil como isso.
O moral é elevado e a perspectiva dos militares de participarem num teatro de operações internacional, onde o risco não deixa de estar presente, é grandemente motivadora.
O capitão de Infantaria Francisco Fernandes é natural de Câmara de Lobos e, nesta fase preparatória em que as tropas portuguesas se preparam no RG3, no Funchal, para actuarem como instrutores do Exército e das forças de segurança iraquianas, desempenha as funções de oficial de informações e operações, e coordenador de tiro. “No teatro de operações, vou manter essas funções e auxiliar na instrução das restantes equipas de manobra, quando for necessário”, diz-nos.
Militar desde 2003, admite que, indubitavelmente, as operações como esta, no estrangeiro, “são mais cativantes, mais aliciantes”. “Neste caso, é a minha primeira missão fora do território nacional, e estou um tanto ou quanto ansioso, na perspectiva de que vá tudo correr bem”, confessa.
Entretanto tem-se andado a documentar sobre o país para onde vai. “Já percebo bem mais do Iraque agora do que há seis meses atrás, é óbvio. Como é natural, nós, que vamos para lá, temos o cuidado de perceber o contexto social e cultural, o enquadramento do conflito, também para entender o que se nos vai apresentar”, refere.
Mas, mais do que as dificuldades inerentes à realização da própria missão, salienta o papel inestimável da família neste processo.
“Eles situam-se na rectaguarda, como grande apoio psicológico”, refere. E o estado de espírito dos familiares tanto pode ter efeito positivo como negativo nos militares destacados, acrescenta. “Este afastamento exige preparação, não só para nós, mas também para eles. A maioria das vezes é mais difícil para eles do que para nós. Temos de preparar a nossa família, que é para nós um pilar de sustentação. Eles têm que estar bem, para nós podermos estar bem, e nós também, para lhes transmitirmos tranquilidade a eles”, realça. “A missão só vai correr bem lá, se a “missão” aqui também correr bem”, explica.

O capitão Vítor Fernandes, também natural de Câmara de Lobos (do Estreito, mais precisamente), concorda. É o segundo comandante da força e coordenador de instrução. Mas está bastante motivado, ou não fosse ele todo obviamente um operacional, como o dão a entender as insígnias do curso de comandos e de páraquedistas no uniforme. Uma formação que, reconhece, auxilia obviamente “não só do ponto de vista técnico, mas também psicológico”.
“Sinto que vai ser um trabalho difícil, mas acima de tudo desafiante. Toda a complexidade do teatro de operações, a nível das características do meio ambiente operacional, e da própria força que vamos encontrar e na qual temos de nos integrar, com a condicionante da maneira como vamos ter de passar a mensagem, que é através de um intérprete (do inglês para o árabe)… Todos esses factores são condicionantes. Mas estamos preparados e treinados para ultrapassar os desafios”. Um dos quais, reconhece, a privação do ambiente familiar a que estão habituados.
“Somos 30 elementos, todos voluntários, todos motivados… Sentimos uma grande coesão e um grande espírito de cumprir a missão, dentro do grupo”, garante. “Procuramos não só trabalhar a parte operacional e formação propriamente dita, mas também a moral e o bem-estar da força, que é muito importante. Na parte psicológica, é muito importante os militares estarem consciencializados da necessidade de ser um grupo coeso, unido, para que todas as dificuldades possam ser ultrapassadas”.

A tarefa de ensinar os iraquianos, admite, “acaba por ser complexa porque, para além de termos de estar preparados para a protecção da força, com os devidos procedimentos tácticos”, temos de ter cuidado em dar a formação como deve ser numa língua estrangeira. Temos de estar obrigatoriamente à-vontade na língua inglesa. Existe também um grande factor que também sai um pouco do normal: o efectivo que vamos ter, um efectivo grande. Por norma, cada equipa de formação é constituída por 4 elementos, um oficial, dois sargentos e uma praça. Irá ter em média cerca de 170 militares iraquianos, onde haverá apenas um intérprete para passar a mensagem. Por vezes, para ministrar determinadas instruções ao nível técnico e prático, tornar-se-á um pouco difícil”, antecipa.
Mas, acrescenta, tendo em conta todas as informações e o histórico do que tem acontecido – este é já o o VIII Contingente – e o feedback que tem tido dos outros contingentes, “nós próprios já estamos aqui a criar métodos para procurar ultrapassar essas dificuldades e atingir os nossos propósitos de passar a informação e instrução”.
Esta não é a sua primeira missão no estrangeiro: já esteve no Afeganistão em 2011 com as tropas comando. “Claro que este know-how é sempre uma mais valia que acabo por ter uma visão do teatro de operações, mesmo sem ainda lá não ter estado. Estou num bom enquadramento psicológico para encarar um potencial risco”, assegura.
A parte psicológica reconhece, é de ter em conta, “pelo facto de estarmos confinados durante seis meses a uma área restrita, não podermos tirar férias, e estarmos sempre com os mesmos elementos. Acaba por haver uma rotina, algum desgaste”. Mas os contactos, via telefone e Internet com a família, estão assegurados.
Outro desafio será também a meteorologia, diferente do clima da Madeira: “Vamos apanhar uma amplitude térmica bastante engraçada. Às 7 da manhã vamos ter por vezes 2 graus centígrados, e ao meio-dia, 40. São ainda temperaturas extremas, do final do Verão, mas já não é o pico do calor. Mas estamos efectivamente preparados nesse sentido”, diz Vítor Fernandes.