Crónica Urbana: com lista ou sem lista, vamos mas é enterrar os mortos e cuidar dos vivos…

foto RTP

Rui Marote

Acabar com a ansiedade e o stress deste povo torna-se impossível.
Através da “caixinha mágica”, a tragédia entra nas nossas casas diariamente, baralhando as pessoas. O aproveitamento que tem sido feito da tragédia de Pedrogrão Grande, com acusações da direita e da esquerda, de que uns escondem o numero de mortos, e outros invocam o segredo de justiça para não divulgar os que perderam a vida na tragédia, tem sido demais. Outros jogaram a” batata quente” para o Ministério Público, que entretanto situou em  64 a lista, embora haja quem diga que são setenta. Parece uma “lista de Schindler” ao contrário, que em vez de sobreviventes, só quer é colocar mais pessoas no estado de falecido.

O número é irrelevante. Morrerem 64 ou 100… Um só já é terrível, como alguém citou. Todos os dias os jornais vão publicitando a lista dos mortos com fotografias ou sem elas. Há quem comece a ler os jornais diários pela secção dos mortos, e casos em que estas secções batem recordes das mais lidas. Nisso os portugueses (e os madeirenses) são mórbidos. Recordo que quando o DN-Madeira chamou a peso de ouro uma empresa de “especialistas em comunicação” para restruturar o matutino, anos atrás, a secção dos mortos apareceu com outro visual, com a cruz mais pequena e outro tipo de letra. Ora, as pessoas revoltaram-se e os “cangalheiros” não gostaram, ameaçando não publicitar os mortos. Em menos de 24 horas houve uma cambalhota e o visual voltou ao habitual… Tal é a morbidez de quem gosta todos os dias de ver quem morre e, as famílias que adoram publicitar a morte dos seus familiares, que um desses “especialistas” em imprensa, de nacionalidade brasileira, até comentou que nunca tinha visto numa terra tanto “orgulho de morrer”.

Porém qual o interesse de esconder ou adiar a identidade ou números dos mortos? Recordamos que na tragédia de 20 de Fevereiro na Madeira, o número de 47 mortos, 4 desaparecidos, 600 desalojados e 250 feridos nunca foi totalmente esclarecido, desconfiando sempre alguns destas estatísticas. Em Pedrogrão Grande, está em curso a edificação de um memorial às vitimas dos fogos que querem também saber o numero exacto de mortos para que o que conste na lápide esteja correto. Na Madeira, houve uma iniciativa similar que esteve em marcha para ser colocada na Praça do Povo, onde antes esteve depositado o entulho que as ribeiras trouxeram. Mas caiu no esquecimento.

Em todo o caso, concentremo-nos em enterrar os mortos e cuidar dos vivos…