Ainda não se sabe como o Governo Regional assinalará o 6.º centenário do descobrimento da Madeira, nem em que data(s).
Sobre esta matéria já dei publicamente a minha opinião em 2015, com base nas fontes históricas disponíveis e na historiografia. Defendi, então, face ao facto de o arquipélago madeirense ser já conhecido e representado cartograficamente, antes da viagem de Zarco e Tristão, e atendendo à impossibilidade de, com exactidão, enunciar o ano da chegada dos portugueses a estas ilhas, que mais correcto se me afigurava comemorar o início do povoamento, ocorrido em 1420, segundo o cronista Gomes Eanes de Zurara.
Apesar de se tratar de uma celebração histórica, a verdade é que os políticos regionais, nas suas decisões e comissões, parecem valorizar pouco o papel e o trabalho dos historiadores. Contentam-se com a leitura, quiçá em diagonal, do Elucidário Madeirense, escrito para celebrar o 5.º centenário do descobrimento do nosso arquipélago, como se, desde então, e já lá vão quase 100 anos, mais nada se tivesse escrito sobre o assunto.
Já ouvi falar que pretendiam comemorar o descobrimento do Porto Santo em 1418 e o da Madeira no ano seguinte, seguindo a lição de Álvaro Rodrigues de Azevedo, de 1873. A ser verdade, não é somente ridículo, mas triste pela ignorância que encerra.
Independentemente de datas, por agora sempre simbólicas no caso em apreço, espero, todavia, que o programa, a ser delineado, não fique pelo efémero. Que sirva de exemplo a comemoração do 5.º centenário da criação da cidade do Funchal, onde, para além dos espectáculos e festejos, sem dúvida importantes em termos de promoção e adesão da comunidade, houve um ambicioso programa editorial, que perpetuou a efeméride.
Assim, dei-me a pensar que, no âmbito do 6.º centenário da Madeira, seria pertinente incluir a recuperação de imóveis do património cultural que remontam aos primeiros tempos do povoamento do arquipélago e que, vergonhosamente, se encontram degradados ou arruinados. Restaurava-se o património arquitectónico, criava-se emprego e possibilitava-se a sua fruição aos interessados, madeirenses ou forasteiros. Reabilitava-se a memória de alguns lugares históricos, apesar das transformações ao longo do tempo.
Neste âmbito, ressalta a necessidade de recuperar a capela de São Paulo e o imóvel adossado do lado nascente, ali quase no final da Rua da Carreira.
Esta capela teria sido mandada erguer por João Gonçalves Zarco, o primeiro capitão do donatário do arquipélago da Madeira, na capitania do Funchal. De início, o seu orago era São Pedro.
Junto à capela, foi instituído um hospital, o primeiro do Funchal, edificado em terreno doado por Zarco no ano de 1454. Funcionou durante quinze anos.
A freguesia de São Pedro, instituída em 1566, extinta em 1579 e restabelecida em 1587, teve a sua primeira sede na capela com a mesma invocação, e aí se manteve até à edificação da nova igreja, concluída pelos finais do século XVI.
Nos nossos dias, a Capela de São Paulo está encerrada ao culto, devido ao seu estado de degradação. Deixou de celebrar-se missa neste templo, em Junho de 2014. O edifício, que lhe está adossado do lado nascente, também se encontra em ruína, em parte devido às obras de construção da circular à cota 40. Já em 1996 se falava da necessidade de recuperar estes imóveis, tendo sido projectada a respectiva intervenção. Mas, apesar de classificada, desde 1940, como imóvel de interesse público do património cultural da Região Autónoma da Madeira, a capela vai progressivamente arruinando-se, bem como a memória do primeiro hospital do Funchal.
* O autor escreve de acordo com a ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.