Câmara de Lobos. Os homens chegam ao varadouro à hora da morrinha espreguiçada no calor da tarde. Vêm varar as horas mansas juntos dos barcos, seus companheiros, também eles à procura de um breve repouso em terra.
Tal como as embarcações têm o destino preso no apelo da maresia. Por entre o garrido dos xavelhas, ensaiam novas companhas e a tarde avança e recua no baloiçar das conversas e das memórias.
São velhos pescadores. Irmãos de mar, camaradas de noites salgadas. Trazem na face os sulcos das vagas e nas mãos a dureza de anos a fio na faina do peixe que se fazia pão. Juntam-se em bandos nos bancos e mesas públicos.
Os velhos lobos do mar apaziguam então o cansaço das ondas à roda das cartas. É o cassino disputado com garra, ruído, palavreado, gestos dramáticos, arroubos de uma virilidade endurecida de sal e sol.
A baía agita-se. Nas esplanadas, os turistas olham a cena como se de um espetáculo se tratasse. Sorriem no intervalo da poncha.
A velha tripulação não se incomoda nem se acanha. São atores de corpo inteiro. O mar deu-lhes um palco chamado perigo e no papel principal foram Coragem.