Lesado do BES confessa: “Se não fosse as economias da mulher andava à esmola”

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José Ramos garante que nãos e cala sem reaver o seu dinheiro. Fotos Luís Rocha e Rosário M.

 

* Com Luís Rocha

José Ramos trabalhou 33 anos na África do Sul e transferiu as suas poupanças para o sempre fiel Banco Espírito Santo (BES). Encarregado de construção civil, poupou uma vida inteira e a África do Sul recompensou-lhe o esforço, levando-o a amealhar milhares e milhares de euros. O colapso do BES deixou este emigrante na ruína.”Se não fosse as economias da minha mulher, hoje andava a pedir esmola para comer”, confessou ao Funchal Notícias.

 

wpid-fotografia-3.jpg.jpegJosé Ramos é apenas um dos muitos  lesados dos BES que se manifestaram esta manhã junto ao antigo Banco Espírito Santo, na Rua José António de Almeida, hoje com a designação de Novo Banco. Palavras de ordem “Queremos o nosso Dinheiro” e “já não podemos ter calma!” não passavam despercebidas junto do público que por ali circulava.

 

bes3Não é a primeira vez que estes emigrantes e madeirenses se manifestam. Dizem-se fartos dos “apelos à calma” por parte dos gestores do Novo Banco. “Não é com pedidos de calma que pagamos as contas da água, luz e supermercado”, salienta José Ramos. Na verdade, têm sido informados pelo Novo Banco que “a situação se via resolver dentro de pouco tempo porque o Estado está a trabalhar na situação dos depositantes que perderam as suas poupanças, mas passam-se dias e nada”.

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Trocámos impressões com vários dos manifestantes e apurámos que existe, de facto, um grande descontentamento e um número significativo de emigrantes madeirenses afectados pelo escândalo do BES. Esta manifestação, que fez grande alarido à porta do Novo Banco, no centro da cidade, promete ser a primeira de muitas. Concretizou-se porque um grupo de lesados se decidiu juntar para se fazer ouvir, como nos disse uma mulher que não quis identificar-se.

“No continente ainda não se falou da situação dos emigrantes madeirenses, que são bastantes, lesados por esta situação. Na Venezuela e África do Sul, sobretudo, há muitas pessoas afectadas, mas também em outros países, como a França. Na Venezuela, são mais ou menos 500 as famílias lesadas, e na África do Sul umas 800. É muito, e há muito dinheiro envolvido, as poupanças de uma vida inteira”, explicou-nos.

Foto Rui Marote
Foto Rui Marote

Segundo a nossa interlocutora, na Venezuela, com uma situação social e económica instável, foram muitos os emigrantes madeirenses que decidiram tirar o dinheiro daquele país e trazê-lo para a sua terra, “E acabaram por ser traídos no seu próprio país”, lamentou.

Os contactos estabelecidos com o banco não têm sido minimamente satisfatórios.

“Não dizem absolutamente nada. Só dizem que temos de esperar e esperar, e já estamos há um ano nesta espera”, queixaram-se os manifestantes. “Trata-se de dinheiro aplicado em obrigações e papel comercial, através da banca madeirense, em produtos de que não se ouve falar no continente, são específicos aqui da Madeira, para emigrantes. A mim, asseguraram-me que era 100 por cento garantido, que estava a fazer um bom investimento, que o Banco Espírito Santo era o banco mais estável do país, e que podíamos confiar neles”, contam-nos.

Foi, segundo uma das pessoas com quem o Funchal Notícias falou, o que fizeram pessoas já na casa dos 70 anos.

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Foto Rui Marote

“O dinheiro que o meu marido ganhou ficou lá todo. E agora não vejo maneira de recuperar as economias de 55 anos de trabalho do meu marido”.

Outra das manifestantes afiançou-nos que estas manifestações são para continuar: “Pretendemos prosseguir, e cada vez vão aparecer mais pessoas. Não somos ainda suficientes, mas há muita gente que vai vir à Madeira agora no Verão, e a nossa intenção é continuarmos a manifestar-nos, para que sejamos ouvidos, para que nos devolvam as nossas poupanças. É o que nós queremos. Sei que daqui a 15 dias vem um grupo da Venezuela que vai a Lisboa manifestar-se, e que depois virá cá… Vamos tentar estar aqui e fazer um grupo para o mesmo fim, para que nos oiçam e se faça justiça. Tudo o que queremos é justiça, que devolvam o dinheiro às pessoas que foram completamente enganadas”.

Outra mulher presente na manifestação corrobora a afirmação: “O dinheiro do meu marido não veio da África do Sul para cá por meio de aldrabices. Foi legal. Mas agora fiquei sem nada, e como vou viver? Não tenho outros rendimentos. Agora dizem-nos que como as coisas não correram bem, estamos a reclamar. Mas isto não é justo. Afiançaram-nos que era seguro. E enquanto não adquiriram o cliente, não o deixavam em paz. Estavam sempre a telefonar para o meu marido, que estava doente e mais fragilizado, e não soube dizer que não”.

A nossa interlocutora original retoma o fio da conversa para confirmar que de três em três meses, um gestor do BES deslocava-se à Venezuela, para cativar clientes, e “fazer mil aldrabices”.

Outra voz indignada faz-se ouvir: “Diziam que tinha garantias, que tinha garantias… Afinal não tinha garantia nenhuma”.