Liga dos Combatentes confrontada com exigências de pagamento por utilização de espaços

oi002197.jpg
O paiol é hoje a sede da Liga, e um exemplo de recuperação de um imóvel.

*Com Rui Marote (fotos)

Valores de monta estão a ser cobrados à Liga dos Combatentes, na Madeira, pela ocupação do espaço do antigo paiol, no Funchal, onde antigamente se guardavam explosivos. O FN apurou que tal situação, que vem criar dificuldades à Liga, decorre do designado “princípio da onerosidade”, estabelecido na legislação nacional a partir da Portaria 278/2012, de 14 de Setembro, a qual vem defender “uma lógica de racionalidade e eficiência económico-financeira, designadamente no que se refere à ocupação do espaço pelos serviços e organismos públicos e demais entidades a operar na esfera do Estado”. Nesse sentido, impõe a cobrança de determinados valores por metro quadrado, que, no caso da sede da Liga na Madeira, resultariam em mais de mil euros mensais.

oi002186.jpg

O Núcleo do Funchal da Liga dos Combatentes, presidido por Bernardino Laureano, tenente-coronel, situa-se no Beco do Paiol, 32 A, na freguesia de São Pedro. Trata-se de um espaço no qual a Liga investiu muito para recuperar, e que hoje se apresenta num estado exemplar de recuperação, incluindo um café, uma sala de refeições utilizada para jantares comemorativos e espaços que expõem diversas memórias dos conflitos bélicos em que Portugal e outros países estiveram envolvidos, com destaque para a 1ª Guerra Mundial e a guerra colonial. O paiol, diz quem sabe, estava cheio de lixo quando a Liga deixou as suas antigas instalações na Rua do Seminário e passou para lá: com o apoio de entidades autárquicas e outras, dali saíram dezenas de camiões inteiramente carregados de refugo. O paiol encontrava-se então num estado de degradação, a contrastar com o aspecto que hoje aparenta.

oi002190.jpg

A Liga, no entanto, tem-se escusado a pagar os montantes exigidos pelo Estado, num contencioso que se arrasta há anos e que não tem sido resolvido pelas entidades competentes. O FN sabe que o general Joaquim Chito Rodrigues, que preside à Liga a nível nacional e que já efectuou, anos atrás, comissões de serviço na Madeira, tem-se esforçado por ultrapassar esta situação, que muito transtorno vem trazer à Liga, dado que se trata de uma instituição que sobrevive com as quotas dos sócios e com doações e que não se encontra, propriamente, a nadar em dinheiro. A Liga tem insistido em que deve ser excluída do pagamento obrigatório, porque se enquadra numa das situações de excepção previstas na lei. Nomeadamente diz a legislação que “excluem-se (…) os imóveis ou partes de imóveis ou os espaços afetos à prossecução das atividades operacionais das Forças Armadas e das forças de segurança, os estabelecimentos prisionais, os estabelecimentos de ensino, os estabelecimentos de saúde, os tribunais, os serviços de justiça, os imóveis classificados com afetação permanente ao serviço da Igreja nos termos da Concordata entre a Santa Sé e a República Portuguesa e os museus ou os imóveis diretamente afetos ou destinados à salvaguarda do património cultural”.

oi002187.jpg

A Liga dos Combatentes defende que é uma instituição destinada à salvaguarda do património. As muitas acções desenvolvidas em prol da memória do esforço dos combatentes portugueses nas guerras em que o país esteve envolvido falam por si. Sendo uma instituição de solidariedade social, a Liga realiza cerimónias alusivas a datas especiais, mantém relações protocolares com o Exército, tem dezenas de núcleos espalhados pelo país, geralmente alojados em espaços cedidos pelo Governo ou pelas autarquias, embora outros sejam de sua pertença, e os seus estatutos zelam pela preservação da memória histórica. Tem ainda realizado a trasladação de corpos de militares que foram enterrados em cemitérios em países africanos, durante a guerra nas ex-colónias, e noutros casos zelado pela manutenção de cemitérios de militares portugueses falecidos em conflitos no Ultramar.

oi002195.jpg

O Funchal Notícias sabe que, na mesma situação do paiol do Funchal, há outras instalações da Liga espalhadas pelo país, muitas delas albergando núcleos museológicos, que, na perspectiva da Liga, deveriam estar isentas de pagamento, mas que, na perspectiva do Estado, estão obrigadas a pagamento trimestral ao abrigo do princípio da onerosidade. Mas, caso tal efectivamente tivesse de acontecer, e dados os valores estabelecidos na legislação, que dão um mínimo de quatro euros por metro quadrado, seriam milhares e milhares de euros que deixariam os cofres da Liga – quase 800 mil euros. Esta situação já transitou do anterior governo, mas ainda não foi resolvida. A situação já terá sido exposta ao presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

oi002194.jpg

Dadas as atribuições da Liga, as acções humanitárias que desenvolve, a sua abertura ao comum dos cidadãos, mesmo que não militares – qualquer um pode tornar-se sócio – o programa de saúde que mantém para os seus membros, a recordação viva e importante que mantém do que sofreram os portugueses na guerra do Ultramar, os múltiplos programas que desenvolve, e as suas capacidades financeiras, não faz sentido exigir-se a esta instituição os supracitados pagamentos, quando outras estão isentas.

oi002193.jpg

A Liga, que celebra este ano 95 anos, gostaria de ver, isso, sim, muitos mais cidadãos envolverem-se com ela e tornarem-se sócios. Muitos militares madeirenses, ex-combatentes ou não, poderiam a ela pertencer e não pertencem. Ao tornarem-se sócios, estão a contribuir para uma série de acções solidárias e de interesse nacional.

oi002199.jpg

O FN solicitou vários dados ao tenente-coronel Laureano, sobre o actual número de sócios da Liga, a história da recuperação do paiol e outros aspectos, mas não recebemos resposta apesar dos muitos dias que esperámos. Contactado o general Joaquim Chito Rodrigues, este adoptou uma postura de crença na resolução breve da situação e na valorização do papel da Liga dos Combatentes, não desejando polemizar. Porém, sublinhou o papel de defesa patrimonial, cultural e histórico da Liga, e o seu desejo de granjear maior reconhecimento e interesse da população em geral.