Debate do programa de governo: Coligação 1; Oposição – 0

O Parlamento regional retomou a sua função de “arena” por excelência do debate político com a discussão e aprovação do programa do novo Governo Regional saído das últimas eleições. Para muitos deputados, foi a estreia nas lides parlamentares e até para o já veterano José Manuel Rodrigues foi o batismo na chefia dos trabalhos.

Nestas coisas, como na escola, é necessário condescender com um certo estado de graça aos deputados e secretários regionais com o estatuto ainda de caloiros. Independentemente disto, é um facto que a discussão do programa de um governo diferente, com a marca de ser de coligação, perante uma oposição renovada, deveria ter merecido uma postura mais aguerrida e combativa. Faltou chama ao debate, nomeadamente da oposição. Ficou evidente que o trabalho de casa não foi bem feito e, por isso, urge limar muitas arestas em próximas sessões plenárias.

Esperava-se um combate mais incisivo do maior partido da oposição, que, por uma unha negra, não chegou ao poder. O que se viu? A leitura monocórdica de Paulo Cafôfo dos tópicos do programa eleitoral, como se ainda estivesse em fase de campanha, a indicar o que falta fazer e não a mostrar o como fazer. Mesmo com Miguel Iglésias a fazer de teleponto, foi notório que esta equipa marcou presença no debate parlamentar ainda com a ressaca da recente derrota eleitoral e a precisar de acertar melhor as agulhas. Houve, é certo, um momento de adrenalina quando a bancada socialista fez saltar para o debate a questão abrasiva do ferry, para saber se sim ou não houve rescisão do contrato por parte do operador marítimo, mas Albuquerque puxou do traquejo político e embrulhou logo os seus adversários, sem sequer precisar de entrar em detalhes sobre a real missiva que recebeu. Por que não houve réplica ao assunto? Cansaço, quando ainda se está a começar o ciclo parlamentar?

Onde ficaram as réplicas?

Outra nota a merecer reflexão por parte dos deputados da oposição é a de que, não basta querer ser deputado. É preciso saber estar no Parlamento e aguentar o balanço da argumentação parlamentar. Se questionam um titular do governo sobre um assunto obviamente pertinente, é preciso alimentar, com fundamento e acutilância, as inevitáveis réplicas e dar vivacidade e endurance ao debate. Mas as respostas às perguntas não encontravam quem voltasse à carga e quisesse saber mais, sinal de que se leu a cábula e não se aprofundou os temas inquiridos.

Os secretários Jorge Carvalho e Humberto Vasconcelos mostraram domínio das áreas que tutelam e argúcia política, apimentando, de vez em quando, o debate.  As caras novas do governo estão, como soi dizer-se, em estado de graça e pouco ou nada se pode dizer. Jaime Filipe Ramos ainda arremessou com um léxico de sabotagem e de infiltrados perante uma plateia ainda ensonada das férias. Ricardo Lume, mais solitário do que nunca na Assembleia, praticamente não se fez ouvir.

É certo que Lopes da Fonseca tentou dar música ao hemiciclo, aumentando ainda mais o sono dos deputados com a tirada de que é preciso dar tempo ao tempo, porque vêm aí ainda quatro anos de legislatura e não podemos querer provar de todo o doce logo no primeiro dia.

Como previsto, o governo viu o Parlamento dar-lhe a confiança para viabilizar o seu programa. No final do dia, até o próprio governo esperaria certamente que a oposição lhe dificultasse mais a vida, afinal já estavam rodados nas investidas mais cáusticas e documentadas de deputados que já passaram por este plenário.

Quem estava como peixe na água foi José Manuel Rodrigues. De sorriso sempre pronto, ironia e humor a cada instante, mesmo com as senhoritas da mesa, o novo presidente da Assembleia Legislativa mostrou que não foi por acaso que aquele lugar lhe pertencia.