O barco não anda…

 

Muitas intervenções, na área do Património Cultural, levam anos para serem realizadas. Por inércia ou falta de verbas, determinados projectos são protelados ou nunca se concretizam. Mas pior é quando nem chegam a existir projectos, e tudo se resume a ideias vagas e inconsistentes.

Tratando-se de património arquitectónico, aguarda-se, tantas vezes, pela degradação quase total, para se dar início ao restauro. Daí se dizer que a diferença entre a ruína de um imóvel classificado e a de um não classificado, é somente a classificação. Um cai com título, o outro sem tal distinção. Mas ambos desaparecem.

Contrariamente ao disposto e recomendado quanto à protecção e valorização do património cultural, a classificação de um edifício, na prática, não constitui, infelizmente, garantia da sua preservação.

Mesmo que a imprensa aborde, com frequência, casos vergonhosos do nosso Património Cultural, as respostas necessárias tardam ou nunca chegam. Quando demora, o restauro fica comprometido e mais caro. Se nunca se efectiva, perde-se, irremediavelmente, um bem da nossa herança cultural.

Às denúncias da imprensa, seguem-se hábeis notícias sobre restauros previstos e milhões disponíveis. Todavia, na prática, pouco acontece.

A Comissão dos 600 Anos do Descobrimento do Porto Santo e da Madeira, mesmo cumprimentando com chapéu alheio, ainda não apresentou nada no domínio da reabilitação do património arquitectónico da Região Autónoma da Madeira.

No Jardim do Mar, o solar de Nossa Senhora da Piedade, classificado desde 1977 e expropriado pelo Governo Regional da Madeira em 2008, para a criação de um Centro de Dia, está abandonado e cada vez mais arruinado. Desde 2009, o processo de expropriação encontra-se em Tribunal, devido à interposição de um recurso por parte dos antigos proprietários.

Relativamente ao destino deste imóvel, a Vice-Presidência do Governo Regional, no ano passado, informou o Diário de Notícias que «nada obsta a que o mesmo seja rentabilizado, atendendo a que a propriedade é da Região.» Acrescentou que, «cautelarmente, o entendimento, até ao momento, foi o de se aguardar pela conclusão do processo judicial.» (20-03-2018). Contudo, enquanto nada se resolve, acentua-se o estado de degradação deste edifício classificado.

A Capela de São Paulo, no Funchal, classificada desde 1940, como imóvel de interesse público do património cultural, está cada vez mais arruinada. Foi encerrada ao culto em Junho de 2014. Fala-se do seu restauro, bem como do edifício, que lhe está adossado do lado nascente, desde 1996. Mas até hoje, nada foi feito.

Para a reabilitação do Convento de Santa Clara, diferentes concursos têm sido noticiados pelos media, com pompa e circunstância, mas ainda não se deu início a qualquer obra. Anunciado foi também o restauro dos tectos da Sé do Funchal. A intervenção nestes monumentos nacionais tem já financiamento assegurado.

Os processos relativos ao Núcleo Histórico de Santo Amaro (Torre do Capitão, Capela de Santo Amaro e Casa dos Romeiros) e ao Museu de Arqueologia da Madeira (recuperação e readaptação do Forte de São Tiago para Laboratório e Museu de Arqueologia da Madeira e construção de galeria de visita às ruínas do Forte de São Filipe) não andam.

O projecto Capelas ao luar, para além das visitas guiadas e dos espectáculos musicais, contemplava a salvaguarda do Património. Iniciou-se na Capela da Nazaré, em Abril de 2016. No entanto, contrariamente ao prometido, até hoje nada foi feito para a conservação e restauro deste templo, nomeadamente dos azulejos historiados azuis e brancos do século XVIII, que cobrem totalmente as paredes do seu interior. O mesmo se pode dizer da Capela de São Roque, em Machico.

O monumento ao Infante D. Henrique ainda não mereceu os cuidados necessários, persistindo a numeração a azul nos blocos de cantaria, feita há cerca de cinco anos, aquando das obras de desvio do curso da Ribeira de São João, bem como o inestético e obsoleto sistema de iluminação.

A Diocese comunicou a intenção de reabilitar o Recolhimento do Bom Jesus da Ribeira (JM, 1-04-2019), depois de fechado e a arruinar-se há vários anos. Contudo, desconhece-se qual o destino do Seminário da Encarnação, também ao abandono e bastante degradado.

A Câmara do Funchal já anunciou, por diversas vezes, o restauro da antiga Estação do Comboio, no Monte, para criar um espaço de evocação de memória histórica da freguesia. Em Janeiro de 2017, o presidente afirmou que o município pretendia «avançar com o projeto o mais rápido possível». Sabe-se ter sido adquirido o edifício, mas nada mais de concreto veio a lume.

Quanto a outro importante investimento cultural para o Funchal – o edifício do antigo Matadouro Municipal –, foi anunciado, em Março de 2018, que o projecto de arquitectura para revitalização deste imóvel bem como o respectivo caderno de encargos estavam concluídos, devendo ser lançado o concurso em breve (Diário de Notícias, Funchal, 24-03-2018).

Igualmente, tarda a requalificação do Museu de História Natural do Funchal, apregoada por vários Executivos Camarários, há vários anos.

Mas, afinal, o que andou, ultimamente, depois de tantos anos nas páginas da imprensa? – A recuperação das capelas laterais da Matriz de Machico e o Cais do Carvão. A reabilitação da Quinta Magnólia estará concluída este Verão, segundo informações vindas a público. Para breve, está também a conclusão da obra de recuperação da Photographia-Museu Vicentes.