O olhar do jornalista sobre o debate do Orçamento da Região para 2018

Depois de acompanhar, a espaços, o debate sobre o Orçamento e Plano da Madeira para 2018, que ocorreu ao longo desta semana na “casa da democracia”, deixo aqui as minhas notas. Uma visão que não é maniqueísta, que é despida de conotações partidárias e que não olha a vida política apenas a duas cores, preto e branco.

1) O Príncipe do Parlamento: O que houve de verdadeiramente novo no debate parlamentar? Sem dúvida a presença nova, constante, firme e abalizada do vice-presidente do Governo Regional, Pedro Calado, que, ainda assim, não se livrou do estigma curricular ligado aos grandes grupos empresariais. O elogio é merecido, porque Pedro Calado é um “dois em um”. Não só domina as matérias -como o dominavam os anteriores titulares da pasta das Finanças, Ventura Garcês ou Rui Gonçalves- como trouxe para o debate um discurso mais arejado, menos denso, mais “político”, se assim o quisermos qualificar. Além disso, ladeou cada um dos seus pares em todas as discussões sectoriais, da Saúde, Educação, Inclusão Social, Turismo, Agricultura, Ambiente e Recursos, fazendo jus à função de coordenador político do renovado Governo de Miguel Albuquerque. Ao ponto de ofuscar o próprio, dando azo a que, face ao protagonismo demonstrado esta semana na Assembleia Legislativa, a publicação nacional “I” o tenha colocado como sucessor de Miguel Albuquerque.

2) A Oposição: Seria um erro colocá-la toda no mesmo saco, como um erro confundir a árvore com a floresta. Comecemos pelos mais pequenos: Gostei da nova postura do PTP ou, se quisermos, da nova atitude da deputada Raquel Coelho. As rábulas de José Manuel Coelho foram chão que deu uvas e o PTP tem uma nova protagonista, com um novo registo que pode capitalizar em 2019, se continuar a ser esse o seu caminho. Além disso, no debate, aqui e ali, colocou o dedo nalgumas feridas.

Gil Canha também esteve bem, na oposição cerrada ao poder, embora sem nenhum rasgo fora daquilo que, quer os seus pares, quer a população da Madeira já conhecem da sua intervenção pública. Faltou-lhe também estudar os números e fundamentar as intervenções.

O PCP de Ricardo Lume e Sílvia Vasconcelos fez o típico trabalho de casa e levou a debate as matérias que lhe são mais “queridas”, mormente na defesa dos mais carenciados e dos trabalhadores. Cada um é como cada qual mas, aqui e ali, tivemos saudades do traquejo político-discursivo de outros tempos protagonizados por Edgar Silva e Leonel Nunes.

O Bloco de Esquerda também fez o trabalho de casa, mas não galvanizou. A dupla Roberto Almada/Rodrigo Trancoso trouxe à liça argumentos recorrentes -crítica extensível a outras bancadas da oposição- talvez denotando o clima que se vive internamente, pois em Março será eleita uma nova coordenação regional.

O JPP também fez o trabalho de casa, aflorou questões pertinentes, mas pode ainda ir mais longe, já que, tendo mais elementos na bancada, podia dividir as ‘pastas’ e ser m ais incisivo.

O CDS teve um protagonista, Rui Barreto. É certo que outros parlamentares como Isabel Torres, Mário Pereira ou José Manuel Rodrigues contribuíram para o debate fundamentado mas Rui Barreto chegou-se à frente. Quem é o líder do CDS? Lopes da Fonseca. Não o foi no debate. O PS tem um líder que estudou o Orçamento e o PIDDAR como ninguém. Carlos Pereira fez o trabalho de casa mas, nestas coisas da política, não basta ser tecnicamente bom, é preciso parecer e mostrar brios como político tribuno. Suspendeu as funções na Assembleia da República para este e outros debates no parlamento regional. A luta não está fácil, até porque tem eleições internas em janeiro para a liderança regional do partido.

3) A maioria PSD: Não foi preciso a bancada parlamentar do PSD correr muito para ganhar a maratona. Com um vice-presidente do Governo Regional que falou pelos 24 deputados ‘laranja’, a maioria destes limitou-se a assistir e a aplaudir. Nem foi preciso Jaime Filipe Ramos se esforçar tanto como em debates anteriores. Outros fizeram intervenções do género “ainda bem que me faz essa pergunta!”. Regressos à bancada laranja? Sérgio Marques passou despercebido, Rubina Leal idem. Eduardo Jesus não resistiu e trocou ‘mimos’ com Carlos Pereira sobre a pasta que tutelou.

Críticas: Noutros tempos, até o discurso contra Lisboa tinha outro nível. Era uma questão de Madeira/República. Agora perde-se no arremesso contra a “geringonça”. Fraco! Por outro lado, a maioria continua a ser cega às propostas da oposição. Não é crível que, das 265 propostas de alteração ao orçamento (apenas 44 submetidas a votação), nenhuma delas seja positiva/sustentável. Assim não!

4) O fantasma: Na ópera, que não a bufa, havia uma assombração, um fantasma. Ao longo desta semana vimos uma assombração chamada “jardinismo”. Não é fácil deixar para traz 37 anos de governação mas, por favor, já é tempo de afastar fantasmas. A população madeirense já sabe tudo sobre isso, sobre a dívida oculta, o betão e o alcatrão. Adiante!

5) As claques: Como no futebol, cada governante tem as suas claques. São os ouvidores do reino. Adjuntos, assessores, diretores regionais, presidentes de empresas tuteladas. Poderão ter um papel preponderante no “trabalho de casa” mas, ao longo de uma semana, limitam-se a fazer número no parlamento. São o conforto do chefe que está a intervir. A avaliar pelas vezes que estão ao telemóvel, presume-se que estão a dar dicas de última hora. Nem que seja pela sua presença lembra ao chefe -mas também à oposição- que a área corporizada por aquele rosto está em debate. Para o bem e para o mal!