Obras de “reabilitação” alteram fachada histórica do Museu Vicentes

As janelas do andar superior, por cima dos arcos, foram encerradas.

Rui Marote

O Museu Vicentes está a ser recuperado, após longos anos encerrado. As obras estão a avançar a ritmo acelerado. No entanto, a traça do prédio original e centenário, com fachada para a Rua da Carreira, está a ser alterado. Encerraram janelas no andar superior, como as fotos documentam. Onde está a Direcção Regional de Cultura? Não supervisiona a manutenção da fachada deste edifício, histórico pelas mais diversas razões? Além de ter albergado durante longos anos o rico espólio dos “Vicentes Photógrafos” foi um marco durante acontecimentos da antiga vida animada dos Carnavais de antigamente, quando a Rua da Carreira era um espaço central dos divertimentos. Muitos ovos e farinha foram arremessados destas janelas agora fechadas, nas históricas e loucas celebrações carnavalescas do passado. Mas parece que se encerram memórias como quem encerra… uma qualquer janela no tempo.

Veja aqui as imagens do antes e do depois…

Já agora, para os interessados, publicamos a “Carta de Veneza”:

Carta de Veneza – Carta Internacional sobre a Conservação e o Restauro de Monumentos e Sítios (1964)

Os monumentos de um povo, portadores de uma mensagem do passado, são um testemunho vivo das suas tradições seculares. A humanidade tem vindo progressivamente a tomar mais consciência da unidade dos valores humanos e a considerar os monumentos antigos como uma herança comum, assumindo colectivamente a responsabilidade da sua salvaguarda para as gerações futuras e aspirando a transmiti-los com toda a sua riqueza e autenticidade. É essencial que os princípios orientadores da conservação e do restauro de edifícios antigos sejam elaborados e acordados a nível internacional, ficando cada país responsável pela sua aplicação no âmbito específico do seu contexto cultural e das suas tradições. A carta de Atenas, de 1931, ao expressar pela primeira vez aqueles princípios, contribuiu para o desenvolvimento de um amplo movimento internacional, traduzido na elaboração de vários documentos nacionais, na actividade do ICOM e da UNESCO e na criação, por esta última entidade, de um Centro Internacional para o Estudo da Preservação e do Restauro do Património Cultural O desenvolvimento dos conhecimentos e o espírito crítico têm trazido a atenção sobre problemas novos e mais complexos; é, portanto, chegada a altura de reexaminar aquela Carta para, através de um estudo mais aprofundado dos seus princípios, se proceder ao alargamento do seu âmbito traduzido na elaboração de um novo documento. Em consequência, o II Congresso Internacional de Arquitectos e Técnicos de Monumentos Históricos, reunido em Veneza de 25 a 31 de Maio de 1964, aprovou o seguinte texto: Definições Art. 1 – O conceito de monumento histórico engloba, não só as criações arquitectónicas isoladamente, mas também os sítios, urbanos ou rurais, nos quais sejam patentes os testemunhos de uma civilização particular, de uma fase significativa da evolução ou do progresso, ou algum acontecimento histórico. Este conceito é aplicável, quer às grandes criações, quer às realizações mais modestas que tenham adquiridos significado cultural com o passar do tempo. Art. 2 – A conservação e o restauro dos monumentos devem recorrer à colaboração de todas as ciências e técnicas que possam contribuir para o estudo do património monumental. Art.3 – A conservação e o restauro dos monumentos têm como objectivo salvaguardar tanto a obra de arte como as respectivas evidências históricas. Conservação Art. 4 – Para a conservação dos monumentos é essencial que estes sejam sujeitos a operações regulares de manutenção. Art. 5 – A conservação dos monumentos é sempre facilitada pela sua utilização para fins sociais úteis. Esta utilização, embora desejável, não deve alterar a disposição ou a decoração dos  edifícios. É apenas dentro destes limites que as modificações que seja necessário efectuar poderão ser admitidas. Art. 6 – A conservação de um monumento implica a manutenção de um espaço envolvente devidamente proporcionado. Sempre que o espaço envolvente subsista, deve ser conservado, não devendo ser permitidas quaisquer novas construções, demolições ou modificações que possam alterar as relações volumétrica e cromática. Art. 7 – Um monumento é inseparável da história de que é testemunho e do meio em que está inserido. A remoção do todo ou de parte do monumento não deve permitida, excepto quando tal seja exigido para a conservação desse monumento ou por razões de grande interesse nacional ou internacional. Art. 8 – Os elementos de escultura, pintura ou decoração que façam parte integrante de um monumento apenas poderão ser removidos se essa for a única forma de garantir a sua preservação. Restauro Art. 9 – O restauro é um tipo de operação altamente especializado. O seu objectivo é a preservação dos valores estéticos e históricos do monumento, devendo ser baseado no respeito pelos materiais originais e pela documentação autêntica. Qualquer operação desse tipo deve terminar no ponto em que as conjecturas comecem; qualquer trabalho adicional que seja necessário efectuar deverá ser distinto da composição arquitectónica original e apresentar marcas que o reportem claramente ao tempo presente. O restauro deve ser sempre precedido e acompanhado por um estudo arqueológico e histórico do monumento. Art 10 – Quando as técnicas tradicionais se revelarem inadequadas, a consolidação do monumento pode ser efectuada através do recurso a técnicas de conservação ou de construção cuja eficácia tenha sido demonstrada cientificamente e garantida através da experiência de uso. Art. 11 – As contribuições válidas de todas as épocas para a construção de um monumento devem ser respeitadas, dado que a unidade de estilo não é o objectivo que se pretende alcançar nos trabalhos de restauro. Quando um edifício apresente uma sobreposição de trabalhos realizados em épocas diferentes a eliminação de alguns desses trabalhos posteriores apenas poderá ser justificada em circunstâncias excepcionais, quando o que for removido seja de pouco interesse e aquilo que se pretenda pôr a descoberto tenha grande valor histórico, arqueológico ou estético e o seu estado de conservação seja suficientemente bom para justificar uma acção desse tipo. A avaliação da importância dos elementos envolvidos e a decisão sobre o que pode ser destruído não pode depender apenas do coordenador dos trabalhos. Art. 12 – Os elementos destinados a substituírem as partes que faltem devem integrar-se harmoniosamente no conjunto e, simultaneamente, serem distinguíveis do original por forma que o restauro não falsifique o documento artístico ou histórico. Art. 13 – Não é permitida a realização de acrescentos que não respeitem todas as partes importantes do edifício, o equilíbrio da sua composição e a sua relação com o ambiente circundante.  Art. 14 – Os sítios dos monumentos devem ser objecto de um cuidado especial, por forma a assegurar que sejam tratados e apresentados de uma forma correcta. Os trabalhos de conservação e restauro a efectuar nesses locais devem inspirar-se nos princípios enunciados no artigos precedentes Escavações Art. 15 – Os trabalhos de escavação devem ser efectuados de acordo com as normas científicas e com a “recomendação definidora dos princípios internacionais a aplicar em matéria de escavações arqueológicas”, adoptadas pela UNESCO em 1956. Devem ser asseguradas a manutenção das ruínas e tomadas as medidas necessárias para garantir a conservação e a protecção dos elementos arquitectónicos e dos objectos descobertos. Para além disso, devem tomar-se todas as medidas que permitam facilitar a compreensão do monumento, sem distorcer o seu significado. Todos os trabalhos de reconstrução devem ser rejeitados a priori. Só a anastylosis, isto é, a remontagem das peças soltas que existam num estado de desagregação pode ser permitida. Os materiais utilizados para a reintegração deverão ser sempre reconhecíveis e o seu uso restringido ao mínimo necessário para assegurar as condições de conservação do monumento e restabelecer a continuidade das suas formas. Publicação Art.16 – Os trabalhos de conservação, restauro ou escavação devem ser sempre acompanhados por um registo preciso, sob a forma de relatórios analíticos ou críticos, ilustrados com desenhos e fotografias. Todas as fases dos trabalhos de reparação, consolidação, recomposição e reintegração, assim como os elementos técnicos e formais identificados ao longo dos trabalhos devem ser incluídos. Este registo deverá ser guardado nos arquivos de um organismo público e posto à disposição dos investigadores. Recomenda-se também, que seja publicado.