Erro de mãe e pai

Pais errantes!? Oh! Mas os pais erram? Sim! Os pais erram como qualquer pessoa, em qualquer circunstância. Erram os pais, erram os avós, erram os tios, erram os professores, erram os psicólogos, os sacerdotes, os médicos, os juízes… Os pais erram, naturalmente, porque são humanos e “errar é humano”.

Os pais, porém, padecem de um “erro cardíaco”: erram por amor. O amor cega. Hoje falo-vos dos pais que erram por “cegueira de amor” e por desamor…

Enquanto humanos, de corpo e alma, estamos em permanente trabalho de mediação entre os sentimentos e a razão, todavia, como pais, esta tarefa de conciliação interior fica não raras vezes subordinada à afeição. Consequentemente, agimos em desfavor da razão por recearmos as suas mais custosas implicações ou as suas consequências não agradáveis no imediato, refugiando-nos na ilusória ideia de que o conflito e o confronto, resultado da aplicação da razão fundamentada na experiência, afasta de nós os nossos filhos.

Por defeito e simplificação, comummente, se polarizam dois grupos de pais: os autoritários e os tolerantes/permissivos.

Particularmente, considero a exigência e a autoridade princípios básicos e estruturantes de qualquer boa educação. Contudo, com o cuidado de não igualar ou confundir a autoridade e o autoritarismo e, tanto menos, sem a equiparar ao autoritarismo imbuído de insensibilidade e rejeição. O autoritarismo puro e contínuo infertiliza o desenvolvimento de qualquer personalidade; fazem-na sentir inferior, insegura; deixam-na carente, revoltada, insatisfeita, consigo mesma e com os outros. O autoritarismo submete. A submissão não é aceitação, não é “conformação” e tanto menos é compreensão. A submissão é apenas uma conformidade aparente, subjugada, exterior, mas que desperta um fervoroso e odiento labor interior, desperta no íntimo pensamentos, objetivos e projetos sombrios com repercussões potencialmente destrutivas e de explosão em tempo imprevisível.

Exigência e firmeza de pai e mãe não é desamor, é responsabilidade! A exigência é a marca da experiência que nos move e que nos leva a seguir por caminhos que garantam a segurança, a qualidade e a responsabilidade daqueles que amamos. Conforme dizia Pedro D’Orey da Cunha (1992) “as crianças não arrebentam (…) quanto mais exigimos delas, contando que seja com respeito, com o devido encorajamento e compreensão”. Não receemos corrigir! Corrigir sempre, com a devida serenidade, com tanto menos intimidação e tanto mais fundamentação. Contando que os nossos filhos nos percebam. Sendo certo que perceber não é aceitar e aceitar não é perceber. Não nos justifiquemos: é “descredibilizante”! Fundamentemos! Assumamos a nossa missão de pais com todo o autodomínio, com toda a serenidade, convicção, verdade e transparência; façamos ver as consequências, os perigos e as vantagens de uma ou outra opção que os nossos filhos possam ter diante de si. Não receemos a nossa atuação corretiva ainda que sob o protesto dos nossos filhos. Há sementes que se lançam ao campo que só vemos brotar bem mais tarde e cujo fruto surge em tempo ainda bem mais longínquo. Mas ainda que só sejam visíveis tardiamente, conservam em si toda a qualidade e essência que lhes foi depositada outrora…

Num outro polo estão os pais permissivos, aqueles que não corrigem, não repreendem, não orientam, mas assistem a tudo o que os filhos querem fazer, permitindo e até servindo todos os impulsos e intentos dos seus filhos, de modo inconsequente. Ser permissivo é consentir, tolerar tudo quanto os filhos queiram fazer. Ser permissivo é acreditar que o seu filho é um primor e que tudo e todos ao seu redor devem servir de recurso e trampolim aos seus intentos; é acreditar que os mais ténues limites são “traumatizantes”. Lembremo-nos que é importante reconhecer desde a mais tenra idade que há limites para tudo. É o reconhecimento do limite que se impõe que me permite agir em conformidade com o respeito devido aos outros, no reconhecimento pelos seus direitos e no respeito por mim mesmo.

Mas nem tudo se divide e se concentra em dois extremos (autoritarismo e permissividade). Outros erros ainda vamos cometendo sem que sejamos autenticamente autoritários e/ou permissivos.

O “erro de enlevo” reside nos pais perdidamente encantados pelos filhos, mas mais que encantados “encegueirados”. São aqueles cujos filhos fazem “trinta por uma linha”, são capazes de magoar e insultar qualquer pessoa em seu redor, mentem ardilosamente, fazem as maiores diabruras, mas… Os pais piedosos, “fiéis”, crentes que acolheram no seu lar um Deus Menino afirmam acerrimamente: “o meu filho não era capaz de fazer isso”, “o meu filho não mente”. A responsabilidade é sempre do contexto, das circunstâncias, dos outros… E aqui o erro é tão grande e a fé é tanta que nem mesmo as mais credíveis e verdadeiras testemunhas, nem as flagrantes imagens (fotos ou vídeos) permitem abalar esta ilusão e curar desta “embeiçada cegueira”.

O erro de “cato por nenúfar” consiste em acreditar piamente que toda a planta que surge na proximidade de um lago é um nenúfar, ainda que revestida de espinhos; é ver as feridas causadas pelos espinhos do cato e continuar a acreditar que o cato é um nenúfar. É nefasto estar diante dos erros e imperfeições dos filhos e dos males por eles perpetrados e fingir não ver estes defeitos e estes erros. Esta cegueira, esta transigência, a par do perdão e das desculpas imediatas e recorrentes, transformam os filhos em personalidades camaleónicas, manipuladoras, sorrateiras; caminhantes voluntários dos itinerários sinuosos da perdição.

O “erro de sacerdote” é praticado pelos pais que perdoam tudo o que os filhos fazem, desde que os filhos peçam desculpa (perdão!). O perdão e as desculpas não devem ser concedidos de imediato face à verbalização das tão conhecidas e até banalizadas “palavras mágicas” (desculpe!). Há erros que devem ser mesmo reparados e não meramente desculpados. Conceder automática e sistematicamente o perdão na sequência de meras palavras de desculpa é promover personalidades irresponsáveis e manipuladoras, pois acabam por interiorizar que podem sempre fazer o que lhes aprouver sem antes pensar duas vezes nas suas consequências. É necessário olharmos criticamente para a máxima popularizada de que “as desculpas evitam-se”. Primeiro: o que se deve evitar são os procedimentos que, em consciência do respeito e responsabilidade para com os outros, nos levam e ter de pedir desculpa. Segundo: antes ou a par de qualquer pedido de desculpa deve haver lugar à reparação do erro cometido, sendo certo que “palavras” não reparam erros… E erros irreparáveis são erros de gravidade maior!

Há o “erro de baby-sitter”. Aqueles pais superprotetores que estão permanentemente em redor dos filhos, como se estes fossem eternamente bebés, vedando aos filhos a possibilidade de sentir por si mesmos o mundo, de experienciar novas situações. São pais inibidores da possibilidade dos filhos se confrontarem com desafios, com novidades, com aventuras, tornando-os incapazes de agir por conta própria, incapazes de avaliar contextos e situações e de agir e tomar decisões. É necessário promover a autonomia, a autorregulação, em detrimento da dependência. É preciso dar espaço, vigiar continuamente, mas o mais distante possível, subtilmente.

Outro erro dos pais é o “erro de por ti”, quando tomam o lugar dos filhos na resolução dos problemas que deveriam ser assumidos e resolvidos pelos filhos. São aqueles pais que desde bem cedo começam a querer fazer os trabalhos da escola pelos meninos; vão falar com o amigo do filho porque estão brigados e o seu menino está triste; na adolescência querem meter-se entre os arrufos dos primeiros namorados, etc. Assumir compromissos e fazer o que quer que seja no lugar dos filhos e por eles está longe de ser saudável e dificilmente contribuirá para o amadurecimento psicológico dos nossos filhos.

Outro erro é o erro de “dinheiro para tudo”. Este erro consiste em permitir o excesso de dinheiro nas mãos dos filhos, algumas vezes para descargo de consciência, sob a ilusão de compensar a sua ausência como pai ou mãe, outras vezes sob a ilusão de ser benfeitor para que os filhos não sintam as dificuldades que os pais no seu tempo tiveram. É importante termos consciência que embora o dinheiro seja ou pareça libertador das restrições materiais, o fato é que, com o tempo, o excesso ou fácil acesso ao mesmo faz dos nossos filhos reféns dos seus próprios impulsos e caprichos, tornando-os no futuro cativos da sociedade, de uma sociedade consumista, exibicionista e fútil. Por outro lado, quando são habituados a este ganho fácil, ao depararem-se com a falta do dinheiro tendem a submeter a família com exigências e ameaças. O excesso de dinheiro e o facilitismo no acesso ao mesmo tornam os filhos egoístas, exigindo tudo, acreditando que tudo lhes é devido pelos outros. Quando algo lhes falta não se sentem compelidos a esforçar-se e a trabalhar para o conseguir, ficam simplesmente a olhar em volta na esperança de ver quem lhes trará o que querem ou de ver a quem o vão subtrair ou exigir.  Acreditam que o mundo gira à sua volta, que tudo lhes é devido e que todos, de algum modo, lhes devem algo. Não assumem a sua responsabilidade, culpam os outros pelas suas perdas, pelos seus infortúnios, pela sua fraqueza, pela sua pobreza, pois cresceram com tudo e todos ao seu serviço. Atenção, pais! O dinheiro permite comprar muita coisa, mas nunca conseguirá preencher o vazio deixado pela falta de convívio, pela falta de diálogo, pela falta de presença e pela falta de ternura de um pai e de uma mãe; porque o dinheiro não nos escuta, porque o dinheiro não nos fala, porque o dinheiro não nos corrige, porque o dinheiro não nos orienta, porque o dinheiro não nos abraça, porque o dinheiro não nos sorri, porque o dinheiro não nos dá carinho, porque o dinheiro não nos aquece o coração. O dinheiro apenas paga, mas nem tudo aquilo que, efetivamente, faz de nós seres humanos felizes se encontra à venda, quanto muito conquista-se e conquista-se não pelos adereços que colocamos sobre nós, mas pelo que está e  vem de dentro de nós.

Outro erro é o “erro de ilusionismo”. Este erro reside em esconder os problemas, os perigos reais e iminentes. Creio que os perigos evitam-se apresentando-os como tal, explicando-os e não os camuflando. Antes ser capaz de os reconhecer para os contornar do que não os reconhecer e caminhar ingenuamente para eles. É preciso preparar para a eventualidade do surgimento desses perigos e para a forma de lidar com eles, acaso surjam em circunstâncias em que nós, pais, não estejamos por perto. Antes a prevenção, a explicação! Preparemos os nossos filhos para a nossa ausência, para a nossa falta, porque não estaremos sempre presentes para afastar os perigos do caminho.

Outro erro é o “erro de predileção” ou o “erro Cinderela”: preferir um filho em lugar de outro. Este talvez seja o erro mais deplorável e ignoto, pois é um erro tão evidente para quem observa pais e filhos e nunca ou raramente reconhecido por quem o pratica. A predileção, por vezes, é expressa pelas formas mais subtis: um sorriso radiante e espontâneo para um e um comedido para outro; as palavras elogiosas para um e as palavras insonsas para outro; as brincadeiras permitidas a um e as limitações às brincadeiras de outro; o ócio permitido a um e o trabalho e responsabilidade exigidos a outro; os elogios dirigidos a um e a indiferença às qualidades de outro; a possibilidade de escolha dada a um e a limitação de opções a outro, etc. etc. etc. O modo de se expressar, aquilo que se tolera pelo modo de falar, pela altura com que fala, pelos gestos e comentários que são permitidos a um e a outro não… Esta preferência assume astutos contornos, muito ardilosamente veiculada pelo tom de voz, pelo sorriso, pelas palavras utilizadas. Aspetos discursivamente negáveis sob a justificativa da ocasionalidade, mas muito intensamente sentidos por quem os vive, por quem os sente na primeira pessoa. É necessário que ponderemos bem quando falamos, quando respondemos, quando orientamos, quando procedemos de determinado modo, quais os fatores que invisivelmente já se infiltraram em nós, que preconceitos estão em nós, o que estará a condicionar o nosso tom de voz, a nossa emoção, os nossos procedimentos, a nossa decisão. São os “vírus de atitude” que não se “vêm”, mas atacam dissimuladamente de forma altamente discriminatória.

Ainda há o “erro de família S. Valentim”. Os pais que, aquando da adolescência dos filhos e em alguns casos até na infância (ridículo!), querem abraçar em sua casa os namorados e namoradas dos filhos. Abrem as portas da sua casa para conhecer e mostrar a sua aprovação pelo namoro; chegam mesmo a promover convívios, se possível juntando até as duas famílias. Será sob a ilusão antiquada de que namorando em casa estão sob vigilância? Sob a ilusão de que deste modo não farão “asneira”, não se precipitarão? Se é esta a razão é grande a ilusão e chocante será a desilusão! Adolescentes e jovens quando amam, amam intensamente, cada qual ao seu jeito e isso, indiscutivelmente, deve ser respeitado. Porém, em muitos casos, esta apresentação à família tem mais de danoso do que de benéfico. Muitos relacionamentos são fugazes experiências, que ao serem “oficializados” com as famílias deixam os namorados sob uma grande pressão. Muitos relacionamentos, noutras circunstâncias, apartados das famílias, já teriam terminado, mas vêem-se coagidos a mantê-los para corresponder ou não defraudar as expetativas dos pais ou, pior, por medo da reação dos familiares. E assim se arrastam e empurram para compromissos sérios namoros cuja relação já perdeu total qualidade. Namoros são isso mesmo, namoros, e devem ser vividos entre os pares. O que é fundamental é sentarmo-nos e falarmos com os nossos filhos sobre a qualidade do namoro que estão a viver, mas não façamos do namoro dos nossos filhos um compromisso dos seus pares para connosco (pais).

O erro de “auto endeusamento” prefigura-se naqueles pais moralistas que esmagam e travam o desenvolvimento da personalidade dos seus filhos. Os pais que “se investem e se vestem” de uma auréola de plenitude, colocando os filhos numa ansiedade permanente; sem dar espaço aos filhos para viverem a sua forma de pensar e sentir, acabam sufocando-os com tanto moralismo. A par destes estão os contínuos orientadores e perfecionistas que fazem dos filhos ansiosos dependentes dos pais. Os filhos, presos às configurações em que os pais os coagem a viver, acabam tornando-se inábeis na resolução de situações por método próprio. Há ainda o “erro de ego” que leva alguns pais a ignorar os filhos publicamente ou, por outro lado, a serem extremamente austeros para que os filhos não causem qualquer mácula

à sua vaidade, à sua real ou imaginária projeção social. São aqueles que pouco exemplo, escassa atenção e insuficiente tempo dedicam aos filhos e, em inconsciência, “dizem-se” envergonhados por estes.

Há ainda o “erro de estafeta”. Os pais que se tornam exigentes por sua insatisfação pessoal, que por não realização dos seus sonhos coagem os filhos a prosseguir e a realizar aquilo que não conseguiram realizar no seu tempo, ignorando as capacidades e os gostos pessoais dos seus descendentes. Querem que os filhos realizem os sonhos que os pais não conseguiram realizar. Estes, por vezes, pressionam ou, por outro lado, exigem e financiam ao máximo os filhos em prol da realização dos seus projetos falhados no seu tempo de crianças ou jovens. Querem que os filhos percorram um percurso académico, profissional ou artístico, que realize o gosto dos pais e não as aptidões e preferências dos seus filhos.

Há ainda o “erro de despojo”. Aqueles pais que de olhar dá pena: a vê-los caminhar lado a lado com os seus filhos, os filhos parecem príncipes e os pais seus lacaios. Estes são pais que desistem de investir em si mesmos, para investir todo o seu ser, todo o seu tempo e todos os seus recursos em favor dos seus filhos. Não falo dos que sacrificam o acesso ao melhor do mercado ou evitam o supérfluo em prol de reunir meios para apoiar a vida académica dos filhos ou para lhes ajudar futuramente nos seus projetos de vida; falo daqueles que se esquecem de si mesmos, esgotam-se, deixam-se andar desarranjados, cansam-se ao limite, andam tristes (até mesmo mal alimentados) e quase que moribundos para satisfazer os caprichos, o consumismo, as modas, as futilidades desejadas e até exigidas pelos filhos.

Outro erro de pai e mãe é a mentira. Quantos mentem prometendo aos filhos aquilo que de antemão sabem que não estão em condições de cumprir. Outros mentem, iludem, para que os filhos se calem pontualmente, para que deixem os pais em paz, para que não chateiem. Um dos contravalores que mais magoa, que mais desilude e mais levanta a barreira da desconfiança e afasta os indivíduos, é a mentira. Porque ainda que a afeição nos impila a acreditar, no fundo, a sombra de uma mentira dada ou de uma promessa não cumprida não nos permite voltar a depositar confiança nessa mesma pessoa. A mentira alavanca a desconfiança e a desconfiança nunca favoreceu a aproximação.

Outro erro é o “erro do descrédito e da insensibilidade”. Algo que muito magoa qualquer indivíduo, sobretudo os mais novos, é sentir que são postas em causa as suas capacidades; sentir que é ridicularizado pela sua forma de pensar, pela sua forma sonhadora ou fantástica de perspetivar a realidade, pelo modo mágico e/ou até ingénuo de conceber tudo em seu redor. Os pais que fazem comentários depreciativos e riem perante as opiniões e os sentimentos dos filhos, perante os seus problemas e os seus medos, cavam um fosso de separação entre eles, perdem a sua confiança, afastam-nos. Recordemo-nos que o desdém, a aspereza e a zombaria não conquistam corações. O erro de descredibilização, que tantas vezes se prefigura por palavras que dizem “és um ladrão”, “és um mentiroso”, “és um feio”, “és um malcriado”, “és um mal-educado”, é um erro arrasador, destrutivo, perverso. Um erro que classifica e coloca o filho numa categoria que não corresponde à realidade. Os pais estão a ser injustos; ofendem o filho, ensombram as representações que ele tem sobre si mesmo, comprometem a confiança que ele tem em si mesmo e ainda dão o exemplo ao filho de como injuriar os outros. Destroem a sua força intrínseca e motriz para ser melhor e passam a alavancar a frieza, a insensibilidade, a revolta e até o desprezo pelos outros.

De todos estes, o pior erro deve ser a indiferença. Aqueles pais que, quer o filho faça ou não faça, diga ou não diga, sinta ou não sinta, o que quer que seja, para eles tanto lhes dá: são completamente indiferentes! A indiferença, sim, é do mais arrasador, pois é a forma muda de revelar falta de amor pelos filhos e, sendo muda, veda aos filhos a oportunidade de compreender as razões e a possibilidade de “retaliar”, mergulhando-os num silêncio doloroso e mordaz.

Os filhos desprezam quem os não ouve, quem não os compreende e prezam e seguem quem os ouve. Às vezes é melhor ouvir atentamente e não dizer nada do que criticar e desclassificar. A crítica depreciativa afasta-os de nós. O silêncio arrelia-os, inquieta-os, mas fá-los ficar a pensar no seu significado. Ponderemos e, dos dois males, optemos pelo menor.

As crianças e jovens procuram sempre pautar a sua personalidade, as suas opções, por alguém, daí a tão fervorosa identificação e seguimento de determinados ídolos (no desporto, no cinema, na música). É importante que os pais compreendam isto e que se coloquem ao lado dos seus filhos, procurando ser eles mesmos os ídolos de maior e melhor referência para estes. De contrário, a procura fora do ambiente familiar será uma fatalidade porque, sendo inexperientes, facilmente se deixarão guiar pelos que se abeiram deles de espírito destemido, maliciosos, mas bem-falantes.

Apesar de todo o bom senso e experiência estamos sempre sujeitos a cometer erros. O importante é, efetivamente, conseguirmos reconhecê-los e fazer o possível por os reparar e evitar. Todos nós tentamos o nosso melhor como pais diante das mais inusitadas circunstâncias. Acredito que a melhor forma de nos consciencializarmos dos nossos erros e de os conseguir reparar é dedicando tempo para ouvir os nossos filhos. Primeiro escutá-los para compreendê-los e para conhecermos os efeitos das nossas atitudes. Depois, mais que moralizar, dar um saudável testemunho de vida. É fundamental testemunhar e orientar em várias vertentes: ser exemplo na forma como procede; dar exemplo de cortesia no trato com os outros;  partilhar vivências positivas (ou não positivas), respostas assertivas e consequências daí resultantes; sensibilizar para decisões refletidas, corretas, pacíficas, responsáveis, consequentes; motivar para a leitura de bons livros, de boas revistas, para a visualização de bons programas televisivos, para a diversão com jogos positivos e educativos; incutir o cumprimento de rotinas, de hábitos; insistir nos melhores resultados, na qualidade; compelir à assunção de responsabilidades; exigir o cumprimento de obrigações…

As restrições, os limites, o “não”, as reprimendas, a firmeza, são sinónimo de amor e competência. O erro está em vergar-se e ceder ao julgamento infantil das crianças quando nos respondem que “a mãe não deixa eu fazer ou não me dá o que quero porque não gosta de mim”. Quanto mais facilitismo e menos realismo permitirmos que a criança experimente mais infeliz será essa criança em adulto, pois não se conquista a felicidade e o sucesso em sociedade pelo facilitismo ou, pelo menos, não de forma honesta, digna. É necessário cultivar o otimismo, mas o otimismo que encara o real como tal. Ser otimista é diferente de ser “fantasmagórico”! O otimista consegue prefigurar uma solução, tem esperança perante os problemas, perante a custosa realidade, o fantasmagórico fecha-se à realidade, vive alheio às circunstâncias reais, perverte o real por comodismo, ilude-se e ilude os outros.

Aquilo que os pais nunca tiveram, hoje têm-no cada vez menos: o monopólio da educação dos seus filhos. Consequentemente, mais importante do que as palavras que os fazemos ouvir são os cenários de vida que os fazemos ver e viver.  Estejamos convictos de que quanto mais afastados estivermos dos nossos filhos, mais próximos eles estarão da influência de outros; quanto menos nós os ouvirmos, mais eles escutarão e se deixarão influenciar por quem lhes falar; quanto mais perguntas deixarmos por responder, mais respostas eles irão procurar. Por muito que esta realidade seja custosa para mim, enquanto pai errante, por muito custosa para vós, nestes ténues condicionalismos reside a diferença dos resultados da educação familiar.

Concluindo, não se demitam e não se considerem de pouca influência os pais, no masculino, na conduta e educação dos filhos. A sensibilidade e a capacidade para lidar com os filhos não estão dependentes do sexo, ou seja, não será a mãe mais hábil do que o pai, nem vice-versa; esta crença assenta na ligação biológica de maior dependência da mãe resultado da gestação e amamentação, porém, na educação, propriamente dita, esta prevalência dissipa-se entre pai e mãe. Os erros e os sucessos da educação dos nossos filhos assentam na dupla e proporcional responsabilidade de pai e mãe.