Doutorado em história alerta: Grécia quer sair do euro mas com “capital de queixa” contra a UE

villaverdecabral_frame1003aac0_400x225O futuro da Grécia continua em suspense: sai ou continua na zona euro? O assunto começa a ficar gasto de tão falado que tem sido e as decisões vão ter que ser tomadas. Ninguém quer arriscar prognósticos, nem historiadores nem economistas. O Funchal Notícias auscultou a opinião do professor Manuel Villaverde Cabral, doutorado em história, investigador do Instituto de Ciências Sociais e  com um grande currículo na análise das questões sociológicas.
Funchal Notícias – A Grécia está na iminência de sair do Euro. Como analisa esta questão?
Manuel Villaverde Cabral – Penso que já estivemos mais longe do Grexit. Na minha opinião, o Syriza quer sair do euro desde o início, mas tem estado a tentar acumular «capital de queixa» para dizer aos eleitores que a culpa não é deles mas sim da alegada intransigência da Zona Euro. Esta última tem tido 3 problemas e só por isso a Grécia sobreviveu até agora: 1.º Não quer que o Syriza possa apresentar-se como vítima, o que nunca será fácil de evitar, pois parte dos gregos, mesmo sem terem votado no Syriza, terá tendência para culpar o estrangeiro, não gostam dos alemães por causa da segunda guerra mundial, etc.; 2.º A Europa tem algum receio (ninguém sabe o que se passará ao certo, pois não há precedentes) que a saída da Grécia provoque convulsões na ZE, para começar em Portugal e por aí fora; 3.º Os USA têm medo que o Syriza, se continuar a ser apoiado pelos eleitores depois de a Grécia sair do euro, se vire diplomática e politicamente para a Rússia e porventura a China, como aliás o Obama já tem feito imensa pressão com a União Europeia por causa disso; é a dimensão geopolítica disto e que o Syriza não hesitou a usar desde o início, tendo-se aliado no governo com um partido nacionalista de extrema-direita.

A Grécia insiste em não efectuar cortes nas pensões (foto Rui Marote)

Funchal Notícias – Tendo sido a Grécia o berço da cultura do Ocidente, o que aconteceu desde então para se chegar à situação atual?

 
MVC – Isso é bonito de recordar mas não tem qualquer impacto, a não ser porventura para os gregos que julgam ser os descendentes de Péricles, só que esquecem que foram dominados durante mais de 1000 anos pelos Turcos até há cerca de 2 séculos apenas de independência. Em suma, a Grécia de hoje tem menos que ver com o «ocidente» do que Portugal de certeza! A situação actual resultou, ao contrário do que sucedeu em todos os outros países intervencionados, da incapacidade, falta de vontade e oportunismo dos governos anteriores da Grécia em fazer o género de reformas que nós e os outros países fizemos, conseguindo regressar aos mercados que era e continua a ser o objetivo da chamada austeridade fiscal. Ainda hoje os gregos têm um PIBpc superior ao nosso: como?! E no entanto, com mais tempo para resolver a crise, mais dinheiro, um perdão e juros mais baixos da dívida, a Grécia perdeu 25% do PIB enquanto Portugal só perdeu 6-7% e já está a recuperar um bocadinho, para não falar da Irlanda e da Espanha!
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