Padres do Carmo recordam Santa Teresa d´Ávila: “Ora e serás feliz!”

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As portas da Igreja do Carmo estão abertas ao público para a exposição sobre Santa Teresa. Fotos Rui Marote

A Ordem dos Padres Carmelitas Descalços no Funchal, representada nesta cidade através da Igreja do Carmo, apresenta ao público uma Exposição sobre o V Centenário do Nascimento de Santa Teresa d´Ávila. Esta figura reveste-se de grande importância na tradição cristã católica, dado tratar-se de uma freira carmelita, mística e santa que remonta ao século XVI e que se destacou, desde tenra idade, pela extrema bondade para com os outros e a entrega ao serviço de Deus na terra. A oração era, para esta mulher, desde tenra idade, o fermento da vida e da felicidade.

Os Irmãos do Carmo prestam homenagem a esta figura santa da Igreja e da sua congregação e consideram o seu discurso atualíssimo.O Funchal Notícias falou com o Superior, Padre Vasco da Costa, que nos deixou o seu testemunho sobre a Exposição e a importância nos dias de hoje do exemplo desta Santa.

Funchal Notícias – O que significa comemorar hoje Santa Teresa de Jesus?Padre Vasco da Costa – Comemorar, hoje, Santa Teresa de Jesus significa várias coisas:

– Correr o risco de se conhecer a si mesmo como alguém que não se encontra “vazio”, mas habitado por Deus

– Aprender a viajar até ao interior e a viver, a partir de dentro, todas as realidades exteriores;

– Vir a dar valor ao silêncio e chegar a recolher-se;

– Começar a descobrir a oração como um trato de amizade com Deus, estando muitas vezes a sós;

– Conseguir fazer a experiência de Deus e de Cristo;

– Tornar-se dócil às moções do Espírito que nos renova, desinstala e compromete com este mundo;

– Passar a compreender e amar a Igreja;

– Cair na conta de uma virtude chamada “determinação”, capaz de conferir poder de arranque, e de um humanismo que deve revestir as nossas relações com os outros.

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Livro da Vida: um testemunho de fé.

Funchal Notícias – Qual o significado desta exposição na Igreja do Carmo?

A exposição que está a decorrer na nossa Igreja, desde o dia 13 até ao 27 de Maio, anda à volta de uma das obras maiores de Santa Teresa de Jesus. Trata-se de dar a conhecer a figura e a sua primeira grande obra, intitulada «Livro da Vida».

Percorrendo os diversos painéis enumerados, é possível ficar com uma visão alargada desta Mestra de vida interior e de oração, cuja intenção neste escrito foi a de narrar as graças que Deus lhe fez e a resposta que foi dando em contraste ou em harmonia. Segundo ela, essas graças também nos podem ser concedidas e a nossa resposta pode não ser muito diferente da sua. Mas há um caminho a percorrer, sem nunca parar, passe o que passe: o caminho da oração.

Elementos-chave que vão aparecendo e permitindo captar a autora e o interesse da obra para os homens e mulheres do nosso tempo:

Vertente subjectiva do Livro da Vida: Autobiografia; mas também teologia, lição de alcance universal, doutrina;

Vertente objectiva: o Livro é um tratado de vida espiritual. A experiência é o ponto de partida; a lição é o seu objectivo;

– Teologia narrativa. A tese, a conclusão a que Teresa quer levar os leitores é esta: A oração é transformante. E Apostólica, poderíamos acrescentar: valor eclesial, serviço de evangelização;

O argumento é simples: transformou-me. E o mesmo acontecerá “à pessoa que tenha oração e nela perseverar” e não a abandone, por mais faltas que cometa (V 19, 4). O bem é ter oração (V 8, 4); o mal está em abandoná-la (V 15, 3).

– Confissão e mensagem: “Pois se a coisa tão ruim como eu, tanto tempo sofreu o Senhor – e vê-se claramente que por aqui se remediaram todos os meus males – que pessoa, por má que seja, poderá temer?” (V 8, 8).

Esse bem, que a oração realiza no homem e mulher de hoje, tem duas expressões determinantes: a verdade e o amor. A oração é caminho, entrada na verdade de Deus e da pessoa. Verdade que é, substancialmente, o amor – comunhão, vida partilhada. Quando Teresa afirma que a oração consiste em “estar com”, não se refere apenas, nem principalmente, ao acto de orar, mas ao nós como forma de ser e viver na verdade e no amor que é Deus, de que Ele nos faz participantes; sermos, como Ele, presença de amor na verdade da nossa vocação original, única: a união com Deus.

Assim, a partir da constatação agradecida por aquilo que Deus nela realizou, surge o premente chamamento ao leitor: “por isso, dê-se pressa a servir a Sua Majestade para me fazer a mim mercê, pois… verá, pelo que aqui vai, quão bem se emprega a vida em dar-se tudo… a Quem tão sem medida Se nos dá” (Cta. epíl. 3).

Funchal Notícias – Em que medida o exemplo de Santa Teresa poderá ajudar os homens e mulheres a serem mais felizes?

 VC – Teresa de Jesus, sem dúvida alguma que nos pode ajudar a ser mais felizes. Só que a felicidade de que nos fala surge da oração e da relação com Cristo. Se aceitarmos, como ela, entrar nessa aventura, poderemos ir experimentando aquela outra parte da felicidade que nos falta.

Ora”, diz-nos Teresa. E serás feliz!… Teresa é oração. Esta é a chave da sua vida. Uma oração que se vai tornando escuta amorosa, diálogo de amizade com quem sabemos que nos ama (V 8,5). Face à nossa cultura actual, que nos acelera e nos empurra a viver superficialmente, Teresa convida-nos a empreender um caminho pessoal em direcção à água viva que sacia a sede de felicidade.

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Esse caminho passa pela interioridade, esse mundo tão próximo de nós, mas, ao mesmo tempo, tão desconhecido, onde radica a nossa grandeza e dignidade: “A alma é como um castelo, todo de diamante…” (Moradas I,I,I). Trata-se de abrir o nosso interior a Deus, ou melhor, de descobrir que “não estamos vazios” (Caminho 18,10): que Deus fala, com voz distinta da nossa, dentro de nós. Um itinerário humilde, reconhecer, com simplicidade, a própria realidade e descobrir nela o olhar amoroso de Deus, o de Jesus no Evangelho.

Mais, “relaciona-te com Cristo”. E serás feliz!… Teresa é de Jesus. A sua oração é amizade com Cristo, que se fez Homem como nós, para acompanhar as nossas vidas: “ajuda e dá força; nunca falta; é amigo verdadeiro… portanto, não queira outro caminho… (V 22,6-7). Por isso, a sua oração é vida e a sua vida oração: é toda uma história de seguimento de Jesus, de identificação com Cristo, o Caminho: “Juntos andemos” (Caminho 26,6). A felicidade de Teresa, o seu encanto, a sua força, é Cristo. Aproxima-te d’Ele, através do Evangelho. Segue-O.