A demagogia e a mentira

mota-torres-iconPertenço ao universo dos que entendem ser a democracia, sob os pontos de vista conceptual, teórico e prático, servindo-se dos valores que a justificam e suportam, a única forma civilizada e séria de colocar nas mãos de cidadãos livres a possibilidade de estes escolherem de entre eles, quem, como e o que pretendem para si próprios e para a comunidade que integram, no quadro de uma sociedade politicamente organizada. Idealmente, a democracia seria, sempre, o território em que os escolhidos satisfariam com zelo, celeridade, eficiência e eficácia todos os pressupostos que determinaram a opção civicamente tomada e de que eles são os incumbentes. Não menos ambicionável seria que, em todos os momentos, a responsabilidade da escolha assentasse em boa e cuidada informação, num exigente espírito crítico, na percepção clara do que é, ou não, exequível e, não menos importante, no conhecimento largo daquele, – ou daqueles -, em cujas mãos serão colocadas as expectativas, a vontade, os anseios, a esperança, em suma.

Da relação que se vai estabelecendo entre os que escolhem e os que vão ser escolhidos e da troca de informação entre eles, matura-se a decisão e define-se a opção. O futuro testemunhará do acerto, ou não, da decisão tomada e, para isso, como referencial, estará o cardápio das promessas eleitorais e o seu cumprimento ou a insatisfação e decepção pelo incumprido.

Temos todos um pouco a consciência de que a mentira, de entre outras criticáveis práticas, ao destruir a confiança, é a mais poderosa arma, porventura letal, apontada à democracia e, portanto, combater a mentira é uma obrigação para todos os que não se querem, por ela, deixar subjugar. Importa, assim, que nos não deixemos embalar nas costumeiras frases da generalização abusiva – “são todos iguais”, “são todos uns mentirosos”… – que, como é sabido, é tudo menos inocente, e tem como objectivo perverso minar os alicerces da democracia e questioná-la no que ela tem de mais significativamente consolidado: a confiança.

Que não se confunda demagogia com mentira – um demagogo é criticável; um mentiroso é, necessariamente, excluível. A democracia e o seu exercício acomodaram a pequena demagogia por ser, diria, inevitável a tentativa de ir ao encontro das vontades e anseios legítimos das populações e, daí, eventualmente, tirar proveito no momento decisivo; a mentira, – fundada em promessas que, no futuro, não só não serão cumpridas, como, ao invés, darão lugar à despudorada concretização do seu oposto -, pelo contrário, é, e deve ser repelida pela democracia porque a destrói.

Daqui a uns dias, os madeirenses vão ser chamados a escolher quem os representará nos próximos quatro anos na Região e, lá para o Outono, corresponderão ao desafio de decidir quem querem ver, em seu nome e na sua defesa, no País. Estes dois momentos estou certo, convidar-nos-ão, a todos, ao exercício da razão, à valorização das nossas convicções, ao sublinhar das nossas prioridades, à afirmação de uma cidadania exigente e a um querer, este sim, irrevogável, no fortalecimento da democracia e dos seus inquestionáveis méritos.