Rui Nabeiro – “in memoriam”


Partiu um HOMEM, com maiúsculas. Como poucos.
Por coincidência, ou talvez não, deixou este mundo no dia do PAI.
Ele que foi um PAI de família para tantos filhos de tantas famílias, hoje órfãos de sangue ou de coração.
Inexoravelmente, pelo privilégio de ver florir muitas primaveras, vi igualmente partir muitos homens. Muito poucos, reconheço, da estatura humana, ética, moral e profissional do Grande Senhor Rui Nabeiro.
Confesso que, nas muitas cerimónias fúnebres que presenciei, não raras vezes ouvi dizer daqueles que partiam “Foi bom homem”, “Era boa pessoa”, “Assim houvesse muitos”.
Uma pessoa, quiçá induzida pela compaixão e perdão das faltas humanas, poderia mesmo ser levada a pensar que na morte, afinal, somos todos boa gente e, caso não o tenhamos sido, aquele é o momento de o sermos, nem que por uma só vez.
Com um ou outro senão, a perceção é a de que todo o falecido, no fundo, no fundo, apesar dos pesares, até que “era boa pessoa”, por mais malfeitorias que praticasse, mesmo que convictamente, até ao último sopro de vida.
Hoje, para tristeza, saudade, gratidão e verdadeiro reconhecimento de muitos homens, foi acompanhado até à última morada terrena um HOMEM que muitos tiveram a honra e o excecional privilégio de conhecer, admirar e amar. Partiu um bom HOMEM, uma boa PESSOA”, a sério, sem melosas hipérboles ou piedosos eufemismos.
Rui Nabeiro construiu uma família, um império, e fez do império uma família.
Deixou fortuna em Património, deixou fortuna, em amizades para a vida, gratidão a quem ajudou a ter pão, prova viva de que o trabalho dignifica o homem, e certeza de que a Economia e o seu florescimento podem e devem deve ser postos ao serviço do homem, e não inversamente.
Era o Patrão, sim. Todos o reconheciam como tal e assim o respeitavam. Não pelo peso da hierarquia, não por receio de exploração, exercício abusivo de poder, chantagem, pressão, assédio, humilhação, ingratidão, chantagem, prepotência ou ameaça de despedimento, como tantos crápulas, ditos Patrões, empresários, administradores, gestores ou CEO, em estrangeiro “chique a valer”, que nunca o viram como exemplo a seguir ou emular, por mais formações em gestão, administração ou relações públicas e humanas que pudessem frequentar durante 600 anos.
Recorde-se que, só a título de exemplo contrastivo, Zeinal Bava, de má memória,como tantos outros Comendadores (que é, com toda a certeza, “modelo” de Empresário de sucesso para muitos aspirantes a “Eu é que sou o Presidente da Junta”, educados na ganância, amadurecidos na obscuridade, protegidos pela sombra e embalados na impunidade) foi o gestor da PT mais premiado de sempre, eleito melhor CEO do setor das telecomunicações na Europa e, upa, upa, agraciado com a Grã-Cruz da Ordem do Mérito Empresarial, Classe Comercial.Depois foi o que se viu e não merece mais uma linha.
Acredito que alguns dos empresários e políticos que hoje acompanharam o funeral do Senhor Comendador Rui Nabeiro, aproveitando as câmaras e os microfones para tecer-lhe rasgados louvores e dramáticas homenagens, não apenas como Empresário, mas igualmente como exemplo de autarca, mais não fizeram que discursos de circunstância ou mesmo de aproveitamento eleitoralista, debaixo da íntima e inconfessável convicção de que o Senhor Comendador não passava de um camponês com olho para o negócio, “inculto”, mas esperto,e ingenuamente generoso. Enfim, “povo”, como alguém disse, daí se subentendendo que nunca esteve ao nível das pseudo-elites da grande finança dos ladrões de colarinho-branco, do título de berço ou da brilhante intelectualite,  fantasmática “Crème de la crème”, que desgoverna e esbulha o país em todos os domínios, em nome do “interesse nacional” do seu umbigo.
Na verdade, um HOMEM da sua grandeza, sustentada na atitude generosa e AMIGA que no seu coração morou, semeando sonhos e dividindo frutos, está muito, muito acima da mediocridade, do egoísmo, chico-espertismo, ganância e cegueira de um muito pouco “Admirável mundo novo” que todos os dias se ergue em sentido contrário ao que Rui Nabeiro sonhou e partilhou.
Bem-aventurados os homens de boa vontade!

Como no poema de Alfredo Barroso “Bonita”, ficam os versos finais  que traduzem a grandeza de Rui Nabeiro: “é tão difícil encontrar pessoas assim bonitas/ é tão difícil encontrar pessoas assim pessoas”.