Como (não) se convive com a crítica…

Esta ideia peregrina de varrer para debaixo do tapete sempre que há uma crítica, já foi “chão que deu uvas”, como diz o povo. Já deu, mas não dá mais. Qual foi a parte que os políticos não entenderam? Quem não entendeu isto, não conhece aquele que podemos chamar de novo enquadramento do eleitorado, resultante de uma nova forma comunicacional, que não tem nada a ver com a estratégia seguida pelos partidos e pelos governos, que se prenderam a modelos ultrapassados, circunscrevendo-se aos mecanismos tradicionais, enquanto paralelamente ia sendo construído um “mundo” de comunicação onde também é preciso estar, pensar e agir em conformidade, sem dramas. E não é metendo esse mundo no âmbito das “fake news” (que há efetivamente) que vão chegar lá, que vão travar notícias, que vão passar notícias, como se tudo estivesse controlado. Já foi assim, hoje não é. E como não é, é importante reagir em consonância com aquilo que é efetivamente. É preciso saber lidar com as novas realidades sem ser com modelos antigos, gastos, sem a eficácia de outros tempos.

É simples, o eleitorado mudou, está mais atento ao debate, uma parte dele gerado na internet, circulando em segundos e provocando situações que obrigam a respostas imediatas, obrigam a um redimensionamento dos gabinetes de comunicação, que vão muito além das partilhas, em grupo, de notícias de jornais, muitas delas passadas pelos próprios departamentos governamentais como se isso fosse, por si só, resolver insuficiências. É uma estratégia que vem de longe, mas já não chega,. É preciso mais qualquer coisa para que o resultado final possa ser aquele que está pensado e para o qual há tanto investimento. No fundo, paga-se muito para pouco efeito.

Aquilo que se passou com a reportagem da TVI, relativamente à Unidade de Medicina Nuclear (na realidade, Medicina Nuclear é uma coisa Radiologia é outra, o que não invalida a existência de eventuais problemas), demonstra bem que ainda não estamos preparados para estas realidades, ainda reagimos muito por impulso, ainda estamos num patamar em que o mundo está contra nós e temos uma atuação imaculada em todas as frentes, não há problemas. Temos muita facilidade em gerir notícias positivas, ficamos muito satisfeitos com as palmadinhas nas costas, mas temos grandes dificuldades e impreparação para gerirmos notícias negativas, ou pelo menos dúvidas sobre a existência de factos negativos, perante os quais é importante e decisivo ter cabeça fria. E é preciso mudar isso se quiserem ir a algum lado. Da crítica nasce a luz, mas parece que os políticos preferem viver às escuras.

É evidente que numa situação daquelas, o aproveitamento político é dado adquirido. É assim, não há nada a fazer. Há dúvidas sobre isso? Mas é preciso marcar a diferença na forma de agir e reagir. Agindo e reagindo, na mesma, mas deixando de colocar a situação no inimigo com razão zero, do género se não é a favor, é contra. Não há um ser pensante que imagine que uma crítica até pode ser a favor parecendo contra? Não é com debates de “tiro ao boneco”, sem esclarecer, à moda antiga, que se resolvem as situações porventura incómodas. Nem com entrevistas “a pedido”, à pressa, sem preparação. É com discernimento, de todas as partes, para haver esclarecimento e posterior atuação em conformidade. Com estratégias de estilo partidário os governos não se governam. Ou melhor, governam-se, mas só para dentro.

É preciso acabar com aquela imagem, própria dos meios pequenos, de província, com o devido respeito para a província, onde uma crítica implica, logo, a consequente “crucificação”, por ser fácil “imolar” pessoas numa área pequena. Assim, à primeira vista, é “louco”. E esta é uma reação por parte dos que são diretamente atingidos, mas em massa, também, pela “legião” mais próxima.

Não é dizer mal por dizer mal nem dizer que está bem porque sim. Se defendemos uma Região para o futuro, em termos empresariais, em termos culturais, em termos democráticos, o Governo já vai à Assembleia, já tem aparentemente um discurso mais aberto, mas depois surgem estas situações e cai tudo por terra, fica tudo com uma visão turva, como se faltasse essa aprendizagem desde miúdos. E o ano de eleições não justifica tudo. É uma questão de atitude que o mundo, à volta, obriga a mudar.

É claro que a Saúde na Madeira tem aspetos positivos, há um trabalho que, na sua maioria, é feito com responsabilidade, envolvendo o Governo, através da secretaria da Saúde, passando pela administração do SESARAM e pelos profissionais que trabalham no setor. Há casos de sucesso, há empenho a registar, há comportamentos de grande profissionalismo, salvando vidas todos os dias e apresentando resultados importantes do ponto de vista do serviço prestado aos madeirenses e portosantenses. Mas também há o outro lado, o das opções políticas menos bem conseguidas, talvez enquadrando-se esta questão da Medicina Nuclear, o da negligência médica, o das listas de espera, para consultas e cirurgias, um ou outro tratamento de um ou outro profissional, que coloca em causa a imagem do serviço no seu global, tudo isso existe e tudo isso pode e deve ser abordado sempre que se justificar, sem que isso seja crime lesa Pátria ou seja motivo para que tanto o Governo como alguns profissionais sintam a sua ação posta em causa, até porque, julgo eu, certamente não deverão estar a pensar que são infalíveis.

E esta coisa de vir dizer que aquilo que deve passar para fora é o positivo e não o negativo, é de bradar aos céus do ponto de vista da transparência. O Serviço de Saúde existe para ser positivo, a anomalia é o que há de negativo. Se essa anomalia não for falada ou denunciada, como queiram, daqui a uns tempos levantamos o tapete e não há quem possa limpar. O que é preciso é ter respostas. E o problema, às vezes é esse, na falta de respostas, “mata-se” o mensageiro.

Independentemente de quem denunciou, há uma situação que deixa eventuais dúvidas, cujos esclarecimentos podem não corresponder à forma exata como o problema foi colocado. É preciso que tenhamos clarividência, também do lado de quem acusa, para que as situações possam ser avaliadas sem que haja excessiva questão pessoal envolvida, que até pode haver, mas que não é, para já, chamada para o caso. Pede-se responsabilidade e prudência de quem apresenta as denúncias, até como forma de credibilizar a defesa a que se propõe. Pede-se respostas dos serviços públicos pagos pelos contribuintes, com base em dados realmente credíveis.

A questão central é o doente e o serviço que é prestado. E a comissão parlamentar de inquérito pode ser um espaço de debate importante para a clarificação do assunto, se o seu funcionamento for, também ele, a pensar mais no doente do que nos interesses, quer do Governo, quer do Serviço de Saúde, quer dos privados.

Se assim não for, não há cura para esta “doença”. Para esta e para outras…