Elementos madeirenses prosseguem investigação na antiga fortaleza lusa de Quelba, nos Emirados Árabes Unidos

Uma equipa de arqueólogos portugueses, que integra o historiador madeirense Rui Carita e o investigador João Lizardo, tem trabalhado desde Janeiro de 2017 no Médio Oriente, mais precisamente na zona da antiga fortaleza de Khor Kalba, nos Emirados Árabes Unidos. Na equipa têm participado vários elementos da Madeira. Já a 29 de Dezembro de 2016 o Funchal Notícias dava conta desta colaboração, informando que a equipa de arqueologia era formada por docentes, alunos e ex-alunos, ligados à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e ao seu Instituto de Arqueologia e Paleociências. Sob direcção dos professores Rui Carita, Rosa Varela Gomes e Mário Varela Gomes, iria proceder a uma escavação arqueológica na antiga fortaleza portuguesa de Quelba.

Quelba, ou Kalba,  é uma cidade localizada na costa este dos Emirados Árabes Unidos, encontrando­-se a 8 quilómetros de Furaijah, sendo delimi­tada a sul pelo Sultanato de Omã e a norte pelo enclave de Madha. A cidade foi conquistada por Gaspar Leite, por ordem de Rui Freire de Andrade, em 1624, refere Ana Margarida Martinho num texto relativo à arquitectura militar portuguesa, disponível no portal HPIP, na Internet, que divulga o património de influência portuguesa, sob os auspícios da Fundação Calouste Gulbenkian.

“A Fortaleza de Quelba integrava o conjunto de fortifi­cações complementares à estrutura defensiva e comer­cial da praça de Mascate, em conjunto com as fortale­zas de Matara e Curiate”, refere-se.

Segundo Rui Carita referia ao FN em 2016 “esta é a primeira missão arqueológica da responsabilidade de equipa inteiramente portuguesa, e que conta com o apoio logístico do Instituto de Arqueologia e Paleociências da UNL, na Península Arábica, em zona frequentada pelos Portugueses a partir do século XVI”. O projecto resultou de um convite por parte das autoridades locais e do Emir Sheikh Sultan III bin Muhammad Al-Qasimi, do Emirado de Sharjah, que assumiram todas as despesas.

O investigador e advogado João Lizardo
Entretanto, e dentro dos contactos estabelecidos, refere o historiador, “encontra-se a extensão a uma campanha de prospecção de arqueologia subaquática, prevista para Setembro de 2018; a participação na exposição organizada para a visita da Comunidade Europeia, em Outubro de 2018, nova campanha em Kalba, em Janeiro de 2019; e uma exposição a realizar no Museu nacional de Arqueologia, nos Jerónimos, em Lisboa, em Abril de 2019.
Rui Carita, ao centro
Segundo refere Rui Carita num texto a que tivemos acesso, as relações entre a Euriooa e várias cidades comerciais na Península Arábica são bastante antigas, como o demonstram as escavações arqueológicas no complexo de Mleiha, onde artefactos de influência grega clássica foram descobertos, incluindo moedas imitando as helénicas, bem como pequenos objectos de bronze e outras peças.  A situação continuou durante a implantação do Império Romano e aumentou nos anos subsequentes, com a expansão islâmica. Num curto período de tempo, as cidades árabes do Al-Andaluz tornaram-se referências no mundo islâmico, importando numerosos produtos do Médio Oriente.
Durante a Idade Média, os contactos da Europa com o Extremo Oriente e a China eram conduzidos através da Rota da Seda, pelas rotas terrestres e marítimas. Veneza tinha o monopólio da distribuição dos produtos orientais, o que se reflectiu de forma paradigmática nas memórias do mercador Marco Polo.
Porém, as circunstâncias mudariam de forma dramática com a chegada de Vasco da Gama à Índia, em 1498, que num curto período de tempo, levou a vários encontros com Veneza, dada a consciência que os mercadores venezianos tinham das mudanças que ocorreriam no comércio internacional entre o Oriente e a Europa.
As relações de Portugal com o Oriente motivaram adaptações de tecnologia naval islâmic, incluindo o uso do astrolábio e o investimento na construção naval, tendo a caravela provavelmente incorporado várias contribuições dos navios mediterrânicos islâmicos. Assim, a relação de Portugal com a costa dos futuros Emirados Árabes Unidos data de 1507, aquando da primeira tentativa para dominar a ilha de Ormuz, seguindo-se a mesma estratégia relativamente aos portos continentais, e estabelecendo-se alianças com as autoridades locais. O comércio de pérolas, mas também de cavalos e tecidos, principalmente tapetes, entre as duas margens do estreito de Ormuz motivou o estabelecimento naquela área, que se tornou também um entreposto de apoio à passagem das longas viagens do Oriente para o mundo ocidental e vice-versa.
O comércio tradicional português no mar Arábico, na península que hoje se pode identificar na cartografia portuguesa como Arábia Félix, atraiu na atenção dos restantes centros comerciais onde os portulanos (cartas náuticas), registo de fortalezas e outros circulavam. Assim, os holandeses e os britânicos dedicaram-se, no final do século XVI, às mesmas actividades e rotas. Em Outubro de 1648, os portugueses assinaram um tratado de paz com vários xeques arábes, em Mascate. Nessa cerimónia foi assinalada a presença de Al-Qasimi, a quem pertencia à fortaleza de Khor Kalba, que lhe foi restituída. As relações comerciais entre portugueses e árabes eram no entanto de mútuo benefício, sendo assim mencionadas no tratado, e permanecendo activas, portanto, naquela região.
Num curto período de tempo, refere Rui Carita, as trocas comerciais entre Oriente e Ocidente realmente abriram uma nova página na história mundial, tendo sido assim dados os primeiros passos para a chamada globalização. Ao mesmo tempo, as viagens marítimas portuguesas do século XV combinaram tecnlogia europeia e islâmica, não apenas através dos instrumentos náuticos mas nas embarcações e nos pilotos que tripulavam as mesmas, contribuindo para dar ao mundo uma verdadeira dimensão universal.