A propósito de uma sondagem…

Uma sondagem sobre as próximas eleições autárquicas divulgada, estrategicamente, pelo ‘Diário de Notícias’, após a apresentação da candidatura da coligação ‘Confiança’ à Câmara Municipal do Funchal, deve merecer a nossa atenção, embora, obviamente, esteja sujeita às contingências dos estudos desta natureza (DN, 21-07-2017, p. 2).

Se o estudo permite concluir que a coligação, liderada por Paulo Cafôfo, seria vencedora, no período em que se realizaram as entrevistas, também é certo, como escreveu o DN, que, relativamente à sondagem de Janeiro passado, perdeu 5,5 %.

Como todos sabem, as eleições não se ganham com sondagens, na imprensa ou nas redes sociais. Ajuda, mas não chega. Determinante é o trabalho no terreno. Mas a vitória decorre do escrutínio, após o encerramento das urnas.

Mesmo assim, os estudos de opinião têm o mérito de suscitar a reflexão. É isso que tentamos fazer.

Quanto a Paulo Cafôfo e à coligação ‘Confiança’ que lidera, composta pelo PS, JPP, BE, PDR e Nós, Cidadãos!, interessa, em nosso entender, ter em conta o seguinte:

1.   Sendo a ‘Mudança’ um projecto de poder, que tem vivido muito de estratégias de comunicação e publicidade nos media, em particular no ‘Diário de Notícias’ do Funchal, convém esclarecer os funchalenses, inequivocamente, acerca da forma verbal «Cumprimos», palavra-chave nos cartazes da ‘Confiança’ já afixados, para que os eleitores possam reconhecer que a Câmara da ‘Mudança’ executou, com sucesso, o seu programa.

2.   A previsão de vitória recomenda mais trabalho junto do eleitorado.

3.   Paulo Cafôfo deverá ainda elucidar os funchalenses se tenciona ou não cumprir integralmente o mandato para o qual se recandidata.

4.   Por fim, há que resolver a questão do relacionamento com a liderança do PS-Madeira. Já não dá para dissimular. Fica-se com a impressão de que há um PS Regional e um PS com sede na Câmara do Funchal. Carlos Pereira, nas últimas semanas, tem tido alguns dissabores com o Poder Central, como foi público relativamente à discussão do Estado da Nação (DN, 13-07-2017, p. 19) e à votação do relatório da comissão de inquérito sobre a Caixa Geral de Depósitos (DN, 20-07-2017, p. 14). Parece também ter sido surpreendido com a deslocação de António Costa ao Funchal, para a cerimónia de apresentação dos candidatos da coligação ‘Confiança’ à Câmara Municipal. Tanto neste evento na Praça do Município, como no anterior de anúncio da candidatura e do respectivo mandatário, na UMa, aparentava estar um tanto ao quanto agastado. Os eleitores não apreciam a bicefalia do PS-Madeira. Por um lado, há um presidente, legitimamente eleito; por outro, há um independente, conotado com o PS, valido de António Costa – ao que consta, que tem mais popularidade e, provavelmente, vale um número de votos superior ao de Carlos Pereira. Mais do que uma cabeça, só na mitologia grega!

Relativamente à candidatura do PSD, verifica-se, através deste estudo de opinião, uma ligeira subida. Rubina Leal fez bem em deixar as suas funções governativas e em anunciar alguns elementos da sua lista. Pecou por não sair mais cedo, duas ou três semanas. Se se tivesse demitido antes do debate do Estado da Região, não teria dado azo às críticas que lhe foram dirigidas. Todavia, como já foi apontado, a selecção primordial na estrutura do Governo denota ausência de envolvimento com a sociedade civil. Preferiu homens e mulheres de confiança política. Aliás, nos tempos actuais, parece que o PSD trabalha apenas no círculo bem restrito dos amigos fiéis dos fiéis amigos, sem olhar a competências. Mas esse não é o problema maior desta candidatura. O que sobressai, ao nível da imagem e do discurso, é uma candidata que parece estar contrariada neste desafio das autárquicas. Fica-se a pensar que aceitou a candidatura apenas por obrigações com o seu partido, mas que, talvez, preferia o lugar de secretária regional, onde até, publicamente, se lhe reconhecia competência. Por outro lado, o facto de já ter desempenhado o cargo de vereadora na Câmara do Funchal poderá ser interpretado sob duas perspectivas: conhece a casa e a problemática do município, o que é positivo; esteve na autarquia vários anos e não foi capaz de resolver alguns dos problemas que, presentemente, enuncia e promete solução, o que lhe retira credibilidade. Dedicada agora, exclusivamente, à campanha eleitoral, é de crer que surja com mais motivação e convicção e tente congregar o eleitorado social-democrata. Todavia, argumentos medíocres do tipo «os municípios não governados pelo PSD são um desastre» ou «o cabeça-de-lista da ‘Confiança’ é o candidato de Lisboa» dificilmente cativarão os cidadãos. A memória é curta! Não se lembram do estado das finanças de algumas Câmaras em 2013, governadas durante décadas pelos social-democratas, como as do Funchal e de Santa Cruz. Esquecem o apadrinhamento de Passos Coelho a Miguel Albuquerque. O que o bizarro patrono disse no Chão da Lagoa, no domingo passado, só poderá ser explicado por diminuição ou perda temporária da memória, efeito da poncha ou, então, por considerar os madeirenses estúpidos e incapazes de se lembrarem das suas políticas para a RAM, enquanto primeiro-ministro. Graves e alucinadas contradições que o PSD de Albuquerque e Rubina Leal engoliu, aplaudiu e mimoseou com umas pancadinhas nas costas, sem nó autonómico na garganta!

Segundo a sondagem referida, o CDS conseguirá eleger um vereador, o que é muito pouco para as aspirações de Rui Barreto. E isso resulta da dificuldade de interacção com os funchalenses. Problema endógeno do CDS que, durante algum tempo na Madeira, José Manuel Rodrigues, por ser figura mediática, de trato acessível e presença assídua no terreno, conseguiu suplantar.

Das restantes candidaturas, julgo que apenas Gil Canha poderá vir a  ser eleito, principalmente pela sua irreverência, humor, denúncia de situações, no mínimo, estranhas e por um discurso não formatado ao cânone oficial, que seduz um nicho do eleitorado não alinhado nem arregimentado. Contudo, precisa de fazer crescer a sua credibilidade e deixar de passar a imagem de que concorre para «vingar» aquilo que denomina ter sido a sua defenestração da Câmara Municipal do Funchal, aquando da cisão da ‘Mudança’.

Dificilmente, a CDU elegerá um vereador, pela reincidência inconsequente do candidato e pelo facto de a ‘Confiança’, através do BE, ir buscar votos ao eleitorado daquela coligação, sobretudo entre os não fiéis do PC.

Já Roberto Vieira e Raquel Coelho irão apenas tentar consolidar o seu eleitorado no Funchal ou afirmar os respectivos partidos, mas sem o número suficiente de votos para a sua eleição.

Tudo isto são conjecturas. Só a 1 de Outubro se ficará a conhecer a composição da CMF. E Setembro será, por certo, um mês de intenso trabalho para os candidatos divulgarem os seus ideais e, em especial, esperamos, apelarem à participação no acto eleitoral, porque uma abstenção elevada poderá alterar os cenários previstos.