Eurodeputada Liliana Rodrigues: caso Grécia é “uma vergonha para a liderança europeia”

Liliana RodriguesLiliana Rodrigues cumpre agora um ano como eurodeputada eleita pelo PS. O balanço é positivo. Tem sido uma experiência de “grande aprendizagem”. Quando falou com o FN, o referendo com a Grécia ainda não tinha acontecido. Mas considerou esta saída uma precipitação para a Grécia. Lamenta também “as declarações inapropriadas e sem sentido de Estado por parte de quem governa países que estão no cerne da própria constituição da União Europeia. Vi insultos, chantagens e, no fim, nada. Nenhum resultado. Inflexibilidade pura e dura. Ninguém quer ficar manchado na imagem e o povo grego acaba por ser um “detalhe”, um “dano colateral” que ainda deposita esperança na capacidade de diálogo das partes envolvidas. Uma vergonha para a liderança europeia”.

Funchal Notícias – Que futuro antevê para a Grécia?

Liliana Rodrigues – Acredito numa solução razoável, mas creio que o referendo pode ser muito perigoso. Seja qual for o resultado, sim ou não, houve uma porta que se bateu a meio das negociações. De ambas as formas, o povo grego sairá lesado. Penso que o governo grego precipitou-se, mas ainda vejo a possibilidade do entendimento.

Lamento profundamente que não se tenha tido o bom senso de negociar à porta fechada, lamento também as declarações inapropriadas e sem sentido de Estado por parte de quem governa países que estão no cerne da própria constituição da União Europeia. Vi insultos, chantagens e, no fim, nada. Nenhum resultado. Inflexibilidade pura e dura. Ninguém quer ficar manchado na imagem e o povo grego acaba por ser um “detalhe”, um “dano colateral” que ainda deposita esperança na capacidade de diálogo das partes envolvidas. Uma vergonha para a liderança europeia.

Na terra da Filosofia, o diálogo parece ausente e tudo se esgota num monólogo retórico recheado de números, mas que pouco dizem ao cidadão comum, uma retórica vazia de conteúdo. Esperava bem mais daqueles que lideram a Europa.

FN – Acha que a União Europeia está a ser demasiado ditadora e inflexível no plano de austeridade?

LR – A União Europeia não está nisto sozinha. Tem um FMI muito duro na sua visão do mundo e das pessoas. Existem credores e devedores. Ponto. É assim que entendem o mundo. Deixam de fora as circunstâncias e não admitem o erro. A austeridade só trouxe mais miséria.

Acima de tudo, acho que os governos que aceitaram passivamente a austeridade como a única forma de fazer política também têm de ser chamados à responsabilidade. Nada fizeram para evitar a degradação dos diversos países que foram massacrados com desemprego, emigração, fome, cortes salariais, ou seja, com a delapidação gradual do Estado Social. A queda e a destruição do Estado Social é bastante visível por esta direita que não vê nem se revê nas pessoas. Há uma agenda por trás desta política, não tenhamos ilusões. Cabe ao Partido Socialista e a todos aqueles que não se revêm nestas políticas que matam lá estar para erguer a voz e combater uma direita demasiado à direita. Não me lembro de uma direita tão conservadora como esta. Mas eu sou filha de Abril. Não conheci assim tantas direitas à direita.

FN – Quais as consequências para Portugal?

As consequências da austeridade são visíveis em Portugal. Os dados da emigração, da fuga da geração mais bem qualificada de sempre, o desemprego, sobretudo o jovem, a baixa natalidade, os cortes nos salários e pensões e a incapacidade de fazer planos para o futuro mostram bem o que se fez ao país em quatro anos.

Foto retirada da página pessoal do facebook
Foto retirada da página pessoal do facebook

O caso da Grécia não afectará directamente a região, em caso de saída (que não acredito que aconteça) mas a médio prazo atingirá todos nós. E quando digo todos nós não me refiro apenas a Portugal, mas a toda a Europa.

FN – Acaba de concluir um ano de mandato como deputada do PS no Parlamento Europeu. Que balanço faz a estes 12 meses de uma nova experiência política.

LR – De muito trabalho e aprendizagem. Aprender sempre. Muitas dores de cabeça e algumas vitórias. Os relatórios são o melhor sintoma disso. Tem valido a pena.Mas penso que os madeirenses e portossantenses saberão avaliar o trabalho de qualquer deputado, não apenas do Parlamento Europeu.

FN – O que mais lhe tem custado até este momento?

LR – Estar longe da família e dos amigos. Da minha rotina. Dos animais que tanto admiro.

FN – O que gostaria ainda de concretizar?

LR – O que mais desejo é o respeito pela dignidade humana. Desejo muito poder ajudar no caso dos emigrantes do Mediterrâneo.

Outra  ambição é a de ajudar mais as mulheres e crianças na Síria. Não será fácil. Soube de um caso de uma rapariga que foi vendida 22 vezes. Outras tantas estão a ser vendidas por um maço de tabaco. Mortas. Humilhadas. Violadas. Sinto-me impotente.

FN – Os madeirenses valorizam o trabalho do eurodeputado?

LR – Penso que sim. As palavras de carinho que recebo mostram isso. Acima de tudo, os madeirenses valorizam a Europa. Percebem claramente que a integração europeia foi e é bastante positiva para todos nós.

FN – Falemos do PS/M e do recente XXVII Congresso onde também esteve presente. Como viu esta Reunião Magna?

LR – Este congresso teve a particularidade de trazer para primeiro plano alguns rostos socialistas que têm andado mais afastados do PS Madeira, ou que pelo menos não têm surgido de uma forma tão ostensiva.

Creio que foi um bom exercício de reflexão, onde todos puderam ter voz e dizer o que querem para o futuro do PS Madeira, da própria região e do país.

Este é o tempo de se criarem laços e definirem projectos com objectivos comuns. Este é um tempo de união para crescer.

Faço uma avaliação positiva dos dois dias de congresso, destacando a questão da Cultura, elemento constituinte do socialismo democrático e que estará de forma vincada na agenda do Partido Socialista.

Ao novo Presidente desejo as maiores felicidades e terá a mais cordial e forte cooperação da minha parte.

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O que mais custa, diz Liliana Rodrigues, é estar longe da família e dos animais que tanto ama.

FN – Acha que Carlos Pereira tem condições para renovar o partido e torná-lo vencedor?

LR – Um líder tem sempre essa capacidade e o Partido Socialista escolheu o seu presidente. Ninguém tem dúvidas das competências técnicas e específicas do Dr. Carlos Pereira. Ninguém pode acusá-lo de não combater as políticas de direita que tanto mal fizeram ao país e à região.

Acredito que encontrará forças para dialogar com todos e, acima de tudo, criar um projecto de união. Todos serão chamados a se pronunciar. Ninguém ficará de fora ou impedido de, com as suas diferentes competências, dar um contributo fundamental ao PS Madeira e à região. Os diversos órgãos recentemente criados na estrutura do PS revelam esse sentido.

Como sabe, eu sou uma mulher de esperança e não a perco nem nos piores momentos. O momento actual será provavelmente um dos piores momentos da vida do PS Madeira. Portanto, o desafio que o novo presidente tem é enorme. Mas são as vitórias difíceis aquelas que mais gozo nos dão.Terá o apoio de todos nós pois a inclusão é um valor fundamental do socialismo democrático.

FN- O facto de Carlos Pereira ter anunciado que não fará coligações nas próximas eleições não terá sido precipitado? Com Paulo Cafôfo presente e a meio do mandato, eleito por uma coligação liderada pelo PS/M?

LR – Isso já foi devidamente esclarecido. O que foi dito no Congresso é que o PS não apoiará coligações onde o seu partido não esteja presente. Onde não participe directamente nas listas.Não é o caso da Coligação Mudança, que faz juz ao seu nome.

Reitero o que atrás disse, ninguém ficará de fora. Isso responde à sua questão sobre Paulo Cafôfo, até porque ele e a sua equipa estão a fazer um excelente trabalho numa lógica de coligação democrática que é, não apenas ouvida, mas que se traduz em acções concretas. Co-ligar é isso mesmo. Estar em ligação. E o PS Madeira faz parte desta ligação.