Afinal, quanto vale um aluno na histeria dos rankings das escolas?

Os resultados dos exames nacionais foram divulgados e com eles todas as escolas deitam contas à vida sobre o desempenho da razão de ser da sua existência: os alunos. A cena que se segue é a previsível publicação nacional dos rankings das escolas e uma leva de comentadores externos a falar do que pouco ou nada sabem, da dinâmica do ensino e das escolas.

É tempo de ir contra a corrente das estatísticas e do folclore dos números, embrulhados pela voragem mediática das melhores e das piores escolas do país. Eu hoje quero falar dos médios e dos últimos, daqueles jovens que passaram pela escola com uma mochila de nada e de lá saíram acarinhados pela resiliência e abnegação dos seus mestres e das direções das suas escolas que não trabalham para a fotografia. Sim, não figuram nas estatísticas, passam ignotos na espuma dos dias, mas levam a escola a travar batalhas diárias por eles e pelas suas famílias, como um pai zeloso que acredita sempre no regresso dos filhos que teimam em esbanjar a herança. Se soubessem como, assim, na dificuldade, o ensino vale a pena por ser gratificante pegar na mão de gente que acredita que é nada e sai da escola a pensar diferente, a querer também ter o direito a rasgar horizontes.

Mas o sistema gosta de narrativas e de números que encham o olho. Faz parte. É um bouquet que adorna retóricas inflamadas e que põe em bicos de pés outros tantos que, de outra forma, não sabem ser, pois alimentam-se do cálice da ribalta e dos elogios nas redes sociais. Certamente que depois dos números dos rankings, haverá quem pegue no chicote e peça mais e mais às equipas que integram as escolas do país. E depois de muito analisar, cruzar dados e imaginar, acharão que, no próximo ano, é que será, ou tudo ou nada. Como se uma escola fosse uma mercearia de “toma lá, dá cá”. A pressão pública sobre as escolas é grande, como se elas fossem casas de entretenimento ou de piruetas olímpicas de escala. Quanta pressão! Quanta precipitação! Quantos são os sacrificados desta máquina trituradora dos rankings que todos os anos deixa em sobressalto tanta gente. E isto nada tem a ver com não valorizar o mérito. Quem trabalha no terreno, bem sabe que os alunos aritmeticamente brilhantes são normalmente discretos, humildes e focados num trabalho aturado e persistente, sempre de mãos dadas com os seus professores que nunca os deixam cair. Que dizer até daqueles que vão a exame com notas de encher as medidas e os valores implacáveis da pauta revelam uma queda livre? Serão menos bons, por isso, e mancharão o ranking deste ou daquele lugar?

Do que ninguém fala é do desafio que constitui pegar numa turma de jovens que não rebenta com a escala e, por acréscimo, traz um mundo de problemas de casa, passeando-se pelos corredores das escolas ou reclinando a cabeça no colo dos diretores de turma, pedindo diariamente ajuda e consolo. Quem os escuta? Os peritos? Os comentadores?  Este é verdadeiramente o grande desafio que se coloca a quem entra em campo com a camisola de “Professor”. Jogar com Pessoas, sem genealogia, mas ávidos de alguém que lhes dê o palco para que possam ser também felizes na vida.

Uma adenda final: escrutinem também os resultados à luz da pandemia e procurem medir o esforço hercúleo e invisível feito pelas direções das escolas e dos professores para assegurar a normalidade em tempo de anormalidade. Já pensaram como caminharam os alunos mais pequeninos na solidão dos seus problemas e complexidade dos seus agregados? Pois houve sempre do outro lado um professor a lembrar, noite e dia, que a tempestade iria passar e que o abalo do barco era grande mas era impossível naufragar porque é sempre proibido desistir. Quanto vale isto no ranking nacional das escolas?

Secundando as palavras de Rubem Alves, concentremo-nos no essencial, sejamos todos mestres “do espanto”, criando “a alegria de pensar” nos jovens (https://www.youtube.com/watch?v=LZDw-6-rYX4) . Quanto aos rankings, valem o que valem, relativizem os números, filtrando-os com as circunstâncias de cada realidade, e procurem, sim, dar medalhas a quem torna possível a descoberta da aprendizazem e tudo fazem para as portas das escolas abrirem sempre com um sorriso que fazem os alunos acreditar que nada é impossível.