Ricardo Vieira / ABreu Advogados
O leitor, se conduz, e teve a necessidade de estacionar ao ar livre já deve ter tido a experiência de ver colocado no vidro da frente da sua viatura um “AVISO DE INCUMPRIMENTO”, chamando-o a transferir um determinado valor através de referências multibanco. Muitos de nós, assustados com essa “notificação” apressadamente vão pagar esse valor julgando que, com isso, “livram-se” de multas e consequentes penalidades.
A verdade porém não é assim tão simples.
O estacionamento sujeito ao pagamento de taxa nas vias municipais foi adotado por um número considerável de municípios, nomeadamente com o objetivo de contribuir para o ordenamento do trânsito nas áreas urbanas em que se verifica maior congestionamento automóvel. Os estacionamentos públicos no ar livre, quando não explorados diretamente pelas Câmaras, têm vindo a ser concessionados a empresas municipais ou privadas. Já tivemos as duas experiências na Madeira. Em qualquer delas, as regras têm de resultar do contrato de concessão e dos regulamentos municipais. É por isso que as tarifas são fixadas por zona e tempo de estacionamento pelo Município e não dependem da vontade das concessionárias.
Qualquer violação das regras estabelecidas para os estacionamentos públicos é suscetível de ser multada, nomeadamente por ultrapassar o tempo para o qual se fez o prévio pagamento (artigos 70º e 71º do Código da Estrada). Isso significa que estando estacionado o seu carro para além do tempo para o qual pagou, pode levar a que um agente policial possa legitimamente multar essa sua infração. Multa essa sujeita a procedimentos e contundências que são conhecidas.
Só que essas multas nada têm a ver com os tais “avisos de incumprimento” e pode bem acontecer que se cumulem os dois no mesmo período e em relação à mesma viatura. É porque os tais incumprimentos são gerados pelas concessionárias, invocando que a ultrapassagem do tempo para estacionar corresponde a um incumprimento de natureza contratual. As concessionárias invocam que alugam parte do espaço que lhes está concessionada aos condutores e com isso estabelecem um contrato que não sendo respeitado nos seus limites temporais tem justificado esses avisos pedindo que seja pago um montante a mais.
Desconheço se esses avisos fazem parte dos contratos de concessão e não tenho a certeza da sua legalidade.
O que sei é que em 2014, um decreto-lei estabeleceu regras que abriu a possibilidade dos municípios deliberarem no sentido de permitir que as empresas privadas concessionárias de estacionamento, possam exercer a atividade de fiscalização do estacionamento nas zonas devidamente delimitadas e sinalizadas. Com esse diploma possibilitou-se que as atividades de fiscalização policial possam ser exercidas por agentes das concessionárias, desde que cumpridas formalidades essenciais, como sejam uma formação específica, a identificação dos agentes e a sua vinculação à empresa.
Ou seja, o que a lei já hoje permite é que as concessionárias a quem foi atribuído o estacionamento se substituam aos agentes de autoridade, desde que o requeiram e as Câmaras o deliberem. Esse caminho clarifica a situação e torna a relação com o condutor mais transparente o que é objetivo importante numa sociedade democrática.