Estepilha: o São José roubado estará num dos cacifos dos sem-abrigo??

 

O FN, investido de pretensões detectivescas, mergulhou em profunda reflexão sherlockiana e elaborou uma teoria que vai ao encontro do postulado pelo famoso detective criado por Arthur Conan Doyle, quanto ao desaparecimento recente da imagem de São José da Igreja do Carmo. Recentemente andou a circular um post na Internet, da autoria de um carmelita descalço, que implora ajuda para localizar uma imagem de São José, “roubada (…) da nossa igreja de Nossa Senhora do Carmo no Funchal. Um dos sem abrigo aqui da baixa foi visto com ela e a tentar vendê-la”, avisa-se, pedindo que se alguém tiver conhecimento do seu paradeiro, por favor entre em contacto.

Sherlock Holmes dizia que, uma vez excluídas todas as outras hipóteses a hipótese restante, por mais improvável que seja, tem de ser a verdade. Ora, vejamos: o FN, cansado de ver a zona circundante da Praça do Carmo tornar-se pouco a pouco a “Five Points” madeirense (Five Points era o lugar mais mal afamado da Nova Iorque do Séc. XIX) perante a indiferença das autoridades madeirenses, que cultivam a teoria do Bom Selvagem de Rousseau, elaborou a seguinte teoria:

Zé dos Anzóis, conhecido como o “Facas” pelo seu hábito de andar com objectos pontiagudos [para descascar a fruta] vinha cansado da subida que efectuara até à Segurança Social, para receber os apoios a que tem direito inalienável. Na descida até à “Sopa do Cardoso”, e depois de pedir a dez transeuntes uma moedinha para o autocarro, encheu a pança de massa no refeitório e, pesado, descansou, antes de ir assaltar umas casas velhas ali nas imediações da Rua da Fábrica e da Rua da Conceição, onde ainda ontem dera uma traulitada na cabeça a um passante nocturno, que se recusara a dar-lhe esmola.

De repente, uma ideia aflorou-lhe a mente, excitada pelo “Bloom” que acabara de consumir: e se, ao invés, assaltasse a Igreja? Estamos quase na época natalícia e há sempre quem goste duns santinhos para decorar as suas casas. Entrou, devagarinho, no templo, e quando o padre não estava a ver, meteu o São José debaixo do braço.

Ao sair, foi até o Mercado dos Lavradores e tentou arranjar logo comprador, mas, ao contrário do que imaginava, ninguém lhe dava nada por aquele trambolho. “Devem ser todos signatários daquela petição contra o grande abrigo dos pobres que querem inaugurar na Rua do Bom Jesus”, resmungou. “Desumanos! Não gostam de gente pobre”, indignou-se.

Eis senão quando a memória estimulada pela droga e pelo vinho barato entretanto ingerido após alguns cêntimos despendidos no supermercado vizinho lhe trouxe uma ideia notável: “E se eu usasse as caixas de correio que a Câmara do Funchal tão generosamente nos distribuiu?” Primeiro foi a correr guardar o São José, antes que alguém reparasse, no cacifo que lhe foi atribuído pela autarquia no Campo da Barca, onde costuma guardar as garrafas. Depois, dirigiu-se ao “Careca”, que até sabe escrever bem, pedindo-lhe que redigisse algumas missivas para enviar para antiquários de Lisboa. Aguarda agora ansiosamente respostas, prometendo vender a imagem do santo pela melhor oferta. Afinal, há que aproveitar todos os mecanismos de incentivo ao empreendedorismo que a sociedade coloca à nossa disposição, e nada como voltar ao mercado criando o próprio emprego.