Estepilha: “Caneco”, uma pedra no sapato de Lopes da Fonseca…

Rui Marote
Estepilha!, no passado dia 9 de Julho, o deputado Lopes da Fonseca teve a infelicidade de chamar para o debate o Primeiro-Ministro António Costa  e o Ministro das Finanças, João Leão, considerando-os duas faces da mesma moeda porque, disse, até as suas famílias vêm de Goa. Uma intervenção marcada pela falta de oportunidade e gosto, ainda por cima numa época em que rolam as cabeças das estátuas representando todos os que tiveram o que quer que seja a ver com o racismo…
Não vamos colocar gasolina na fogueira nem julgar alguém por intervenções infelizes no calor do debate parlamentar. Até porque devemos ter por princípio não julgar para não sermos julgados… Mas o Estepilha tem a memória do disco rígido perfeita, sem ser necessário um refresh ou uma formatação. Em Outubro de 2000, um dos fundadores do CDS Madeira foi um dos três  deputados eleitos para o Parlamento Regional, na presidência de José  Manuel Rodrigues, também eleito. Tratava-se de Cabral Fernandes.
Ora, Cabral Fernandes nasceu em Goa, em virtude do seu pai ter sido colocado naquela colónia portuguesa. Regressou à Madeira, terra dos seus pais, ainda jovem. Quando o autor do “Estepilha” de hoje esteve em Moçambique, conheceu muitos oriundos da Índia e no serviço militar teve bons colegas  da antiga colónia portuguesa.
Na lista eleitoral do partido democrata-cristão seguia em 4º Lopes da Fonseca, que não foi eleito, mas tinha a promessa de rotatividade com Cabral Fernandes no meio do mandato. Porém, essa pretensão não se concretizou. Embora fosse inclusive anunciada a 31 de Dezembro de 2003 na imprensa a substituição, a mesma não avançou, pois o eleito não abdicou do seu mandato e, Estepilha! Fonseca ficou com uma pedra no sapato desde essa hora, que carrega até os dias de hoje.
Os moçambicanos designam de forma depreciativa por “caneco” os católicos com origem na antiga Índia Portuguesa, tomados como mestiços num contexto esmagadoramente negro, porém puros na sua origem identitária indiana. Enquanto minoria étnico-racial não europeia, no tempo colonial o seu estatuto social colocava-os mais próximos dos então brancos de classe baixa. Em relação aos negros moçambicanos no quotidiano, os “canecos” com maior facilidade se posicionavam nos círculos da elite social e administrativa dos brancos de primeira.
Voltando às declarações infelizes de Lopes da Fonseca a 9 de Julho, o “Estepilha” não pode deixar de se interrogar: será que 0 deputado do CDS esqueceu que o seu partido teve esse grande parlamentar, Narana Coissoró, respeitado pela esquerda e pela direita? O Estepilha não está a ver António Costa, “caneco”, insinuar o que quer que seja de vitimização racial, perante as declarações de Lopes da Fonseca, que pouco lhe devem importar. Mas as mesmas, no contexto actual, não só não são nada cristãs, como gosta o CDS, como são tão cuidadosas como um elefante numa loja de porcelanas…