TAP Air Portugal reduz dois motores no Longo Curso


Começou o “phase-out” dos Airbus A340 da TAP Air Portugal. No dia 2 de outubro descolou de Lisboa o “Fernão Mendes Pinto” (CS-TOA) rumo a Teruel, um aeroporto onde há muito mais aterragens que descolagens.

Airbus A340-300 “Fernão Mendes Pinto” (foto: José Luís Freitas)

Números não oficiais apontam para 110 000 horas de voo e 16 000 ciclos desde que foi entregue em Toulouse, no Natal de 1994. Corresponde a doze anos no ar, ou seja, metade da vida útil. No mesmo dia foi entregue uma aeronave irmã, “D. João de Castro” (CS-TOB). Esta será a aeronave que mais tempo voou na TAP Air Portugal. Ainda voa tal como o “Venceslau de Moraes” (CS-TOC), mas o derradeiro voo da frota de A340 deve ocorrer no dia 26 de outubro, um Recife-Lisboa.

Airbus A340-300 “Venceslau de Moraes” em treinos na nova pista do aeroporto da Madeira em 2000 (foto: Rui Marote)

O quarto A340, o “D. Francisco de Almeida” (CS-TOD), já repousa em Teruel, onde rapidamente será reciclado. Foi entregue na véspera do 20º aniversário da Revolução dos Cravos, juntamente com o que exibe na fuselagem o nume de um grande explorador português que andou pelo Japão.

Airbus A340-300 “Fernão Mendes Pinto” em 2004 (foto: José Luís Freitas)

O A340 foi o primeiro avião da Airbus desenhado de raiz para longo curso, lançado em simultâneo com o bimotor A330, que se afirmou como o seu substituto. O A340 é de uma conceção vetusta, ostentando debaixo da asa quatro motores CFM 56, similares aos da família A320 de médio curso. Apareceu numa altura em que chegavam ao fim de vida os trimotores McDonnell Douglas DC-10 e Lockheed L1011, e as primeiras versões do Boeing 747 (100/200), demasiado grande para muitas rotas. O A340 usava a fuselagem do A300/310, alongada, com asa nova e trem de aterragem mais robusto. Inicialmente foram lançadas duas versões, a mais curta -200 (28 produzidos) e a -300 (218 unidades fabricadas em Toulouse) que foi a escolha final da TAP Air Portugal.
Como de costume foi a Lufthansa a primeira a operar o A340, e deteve a maior frota deste modelo, composta por 30 unidades. Foi muito popular nos primeiros anos, por haver ainda necessidade de empregar quadrimotores em rotas de longo curso, e na operação a partir de aeroportos sitos em zonas altas e de elevadas temperaturas, movidas pelo risco de haver falha num motor. Em breve o Boeing 777 e o A330 começaram a reescrever a conceito de aeronaves “wide-body”, transformando o “standard” para a vigente configuração de bimotor.
Na década seguinte a Airbus apostou em dois segmentos: o “Ultra Long Range”, acima das 9,000 milhas náuticas, e o segmento dos 350-400 passageiros, liberto pelo “phase-out” da primeira geração do Boeing 747.
Tanto o A340-500 como o -600 usavam já motores Rolls-Royce Trent da série 500, com quase o dobro da potência dos CFM 56, e permitiram que o A340-600 fosse a aeronave de transporte de passageiros mais comprida de sempre a operar (76 metros, mais 20 que a fuselagem original do A300). A pouca popularidade do A340-500 traduziu-se em 34 meras aquisições, dois deles operados pela HiFly. O A340-600 vendeu-se um pouco melhor, chegando às 97 unidades, que a HiFly também operou e a TAP Air Portugal esteve a ponto de seguir esse caminho. O último dos 375 A340 produzidos foi um -500, entregue em 2012.
O mercado dos A340-200 e -300 passou a ter reposta pelos A330-200 e -300 (e agora -800 e -900) e as versões maiores foram substituídas pelo novel A350, todos bimotores.
O “safety record” do A340 é impressionante. Zero acidentes mortais! Apenas duas aeronaves se perderam em voo operacional, um A340-200 da Air France que saiu da pista em Toronto, em situação semelhante ao acidente de 77 na Madeira, e um A340-600 Iberia que também se alongou em demasia numa aterragem em Quito. Quatro aeronaves foram danificadas irremediavelmente no chão, uma delas em manutenção (A340-200 da Air France), outra em reboque para o terminal (A340-300 da Lufthansa), outra na fábrica (A340-600 em testes finais antes da entrega à Etihad), e outra num ataque terrorista perpetrado em Colombo. As três aeronaves envolvidas em outros tantos acidentes não-mortais foram reparadas e voltaram a voar (A340-300 da Sabena e da Virgin Atlantic, A340-500 Emirates).
Este “phase out” marca o fim da era do quadrimotor na TAP Air Portugal antes povoada pelos Douglas DC-4 e DC-6, Lockheed Super Constellation, Boeing 707 e Boeing 747. Grande parte dos fãs da aviação nascidos nos anos 90 não aprecia o A340, inclusive apelidando-o como o “avião das cinco APUs”, pela pouca potência dos seus quatro pequenos motores, e comuns descolagens sem grandes performances de subida. A aviação não pode viver do saudosismo do passado, porque senão atravessávamos o Atlântico em pirogas. O A340 é dos poucos aviões que envelheceu mais graciosamente na história. Não há conversão para cargueiro, por isso não se irão “arrastar” por décadas como outros modelos, erodindo-se até serem conotados com velharia ou vandalizados por operadores menos escrupulosos.
Aqui na Madeira tivemos esta espetacular aeronave na inauguração do aeroporto em 2000. E houve até voos diretos regulares para Joanesburgo.

Airbus A340-300 CS-TOC na final para a pista 05 na Madeira (foto: Rui Marote)

Infelizmente, para os entusiastas, não foi o escolhido para a linha de Caracas, nem foi chamado como salvador dos passageiros retidos, nem serviu de “expresso de Natal”. Conto com três voos nos A340 da TAP Air Portugal, Lisboa-Newark-Lisboa (ida no CS-TOA com regresso no CS-TOC), e Lisboa-Guarulhos (CS-TOA com pintura atual). Também experimentei os A340-300 (Frankfurt-Lisboa) e A340-600 da Lufthansa (Munique-Shanghai Pudong), o A340-300 da China Eastern (Shanghai Hongqiao-Beijing Capital) e o A340-300 da Kuwait Airways (Roma Fiumicino–Paris Charles de Gaulle, peripécia que dava uma crónica só por si).

Airbus A340-300 da Lufthansa em Lisboa (foto: José Luís Freitas)

Do mesmíssimo A340-600 da Lufthansa em que viajei – na lua de mel – guardo como “souvenir” um porta-chaves feito a partir da chapa da fuselagem, certificado pela própria Lufthansa.

Porta chaves feito a partir de um Airbus A340-600 (foto: José Luís Freitas)

Resta dizer que a TAP Air Portugal anunciou um Evento de Despedida ao A340.