“Carta a um Governador”: um documento histórico amanhã em discussão numa conferência/debate no Funchal

Tal como o Funchal Notícias já referiu, realiza-se amanhã, sábado, pelas 16 horas, no Palácio de São Lourenço, no Funchal, a conferência “Antecâmara de Abril: 50 anos da “Carta a um governador” e testemunhos da oposição democrática na Madeira”. Neste debate participarão Amélia Carreira,  António Loja, Rui Nepomuceno e Henrique Sampaio.

A “Carta a um Governador” foi um documento de importância histórica que expressava um conjunto de reivindicações consideradas justas por um grupo de cidadãos, e necessárias para o desenvolvimento da Madeira, em plena “Primavera marcelista”, um período em que se esperava uma flexibilização do regime que fora dirigido por Salazar com mão de ferro durante anos. Cedo as esperanças se dissipariam, mas este ano marcou a altura em que a Madeira apresentou uma candidatura expressiva no âmbito da oposição democrática, e em que vozes praticamente únicas no panorama nacional se expressavam através de órgãos de comunicação social como o “Comércio do Funchal”, onde pontificava o jornalista Vicente Jorge Silva e outros.

Na “Carta” apresentava-se uma reflexão aprofundada e sugeriam-se soluções ao governador Braancamp Sobral, em matéria de agricultura, cuja modernização era defendida, bem como medidas de reforma agrária e extinção da colonia; apelava-se também à criação de escolas agrícolas e introdução de instrução de modernos métodos agrícolas já no âmbito do próprio ensino oficial; apresentavam-se sugestões de revitalização da economia e apoio à indústria e comércio, entre as quais a criação de uma zona franca na Madeira e a atracção de capitais estrangeiros; defendia-se a desburocratização e o apoio a novos projectos turísticos, reconhecendo-se que a Madeira tinha um muito reduzido número de camas e precisava de se modernizar, para acompanhar a evolução do que então se via como uma aposta modelar, a do Algarve e das Canárias; fazia-se a apologia de uma real aposta no turismo, pilar essencial da economia das ilhas, reconhecendo embora algumas dificuldades de ligação do arquipélago ao todo nacional e europeu, pelas limitações que apresentava o aeroporto de então, e defendia-se uma efectiva democratização da educação e cultura, que devia abranger uma população da qual se estimava, na altura, que metade fosse ainda analfabeta; e o direito da mesma à saúde e habitação. No sector da saúde, comentava-se que para uma população que rondava os 280 mil habitantes, havia forte carência de estruturas hospitalares e centros de saúde, bem como de médicos: havia apenas um cardiologista e um psiquiatra para servir toda a população do arquipélago. Quanto à habitação, defendia-se um forte investimento na criação de bairros sociais, sublinhando-se que vinte ou trinta anos antes se fizera muito mais do que nas duas décadas mais recentes.

O documento foi principalmente redigido por António Loja e José Manuel Barroso, o primeiro comerciante, o segundo jornalista. Foi assinado por, entre outras personalidades, a jornalista Helena Marques, o advogado Rui Nepomuceno, o jornalista Vicente Jorge Silva, Ramos Teixeira da Silva, José Rufino da Silva e Gabriel Lino Cabral, sacerdotes católicos, o escultor Anjos Teixeira, o desenhador e cartoonista do jornal satírico “Re-Nhau-Nhau”, Paulo Sá Brás, o escultor Amândio de Sousa, o arquitecto Lima Costa, o músico Artur Andrade ou o nosso colaborador do FN, Henrique Sampaio.