(Di)gestão Cultural

Todo o gestor cultural deve, em primeiro lugar, encarar a cultura como um forte aliado de desenvolvimento social e económico, da região onde está inserido. Daí, ser fundamental apostar no verdadeiro envolvimento ativo dos membros da comunidade, nos diferentes projetos artísticos e culturais. E não se limitar a insistir somente na educação de públicos, através da fruição de eventos culturais, vindos de fora. A educação de públicos para a cultura vai muito mais longe do que uma mera estatística de afluência. Em termos culturais o gestor deve conhecer as potencialidades, desejos e fragilidades locais, para poder efetivar um trabalho eficiente.

A gestão cultural também não pode viver do improviso e da subcarga de funções. Há que não esquecer que para um espaço cultural funcionar com vitalidade, são necessários bons recursos humanos, em primeiro lugar, depois, claro, são precisos os recursos materiais, os serviços e os indispensáveis recursos financeiros. Os recursos financeiros para o desenvolvimento do setor cultural, podem advir do financiamento público regional, nacional e comunitário. O financiamento também deve provir do meio privado; do financiamento coletivo (Crwodfunding) e das receitas da comercialização de produtos ou serviços.

Por isso, o gestor cultural deve procurar ativar diversos canais de comunicação com os artistas, agentes culturais, comunicação social e, obviamente, com o público-alvo. Para que o gestor possa deixar uma profunda marca no espaço cultural que dirige, há que procurar iniciativas e ações eficientes. Acima de tudo, há que ter prazer em ajudar as pessoas a criar, efetivamente, cultura. Sabemos, também que, por vezes, alguns responsáveis pelos espaços culturais, comportam-se como uma espécie de “paus mandados”, que só fazem o que outros – “superiores” – mandam, prejudicando até, ocasionalmente, a própria agenda cultural, há muito programada.

Um espaço cultural deve ser gerido como um exame atento em todo o seu percurso, tal como desejamos ter sempre uma boa digestão com a elaboração dos alimentos no estômago e nos intestinos.

Para António Gomes de Pinho, presidente da Fundação de Serralves (2003- 2009) “… gestão cultural é o termo utilizado para designar um vasto conjunto de práticas relativas à gestão de organizações culturais e atividades culturais para alcançar uma variedade de finalidades, incluindo a produção, distribuição, exibição, educação e outras atividades relacionadas dentro de uma variedade de setores, incluindo organizações sem fins lucrativos ou com fins lucrativos e o público.” (DeVereaux, 2009, p.155).

A nível nacional, a Sociedade Portuguesa de Autores, distingue anualmente os municípios que têm a melhor programação cultural. Seria bom que a Sociedade Portuguesa de Autores estivesse também atenta – provavelmente, até está – à programação cultural dos municípios da Madeira, a ver se algum dos nossos municípios reúne condições adequadas para ser distinguindo, pela sua excelência de programação cultural.

Quem está à frente de um espaço cultural – teatro, centro ou casa cultural, auditório, museu, galeria –, deve pautar por uma atitude ativa para procurar estimular todos os processos de criação e de fruição de bens culturais. Deve igualmente estabelecer boas relações de trabalho com a sua equipa e outros sujeitos envolvidos. Deve acima de tudo, provar que a cultura pode, deve e tem de ser dirigida com muita eficiência.

O gestor cultural deve procurar que o seu espaço disponha de um bom equipamento técnico (audiovisual, som, luz, climatização) e recursos humanos especializados para que os eventos produzidos ou coproduzidos, sejam apresentados ao público com a máxima qualidade e rigor. Na maioria dos espaços culturais da nossa região existem lacunas extremas de má construção e ausência de manutenção dos equipamentos técnicos e estruturas. A manutenção técnica dos espaços culturais, (palcos, luz, som, bastidores, plateias, etc…) é fundamental para o sucesso das atividades.

O gestor cultural deve apostar na sua própria formação e procurar informar-se sobre as reais necessidades e especificidades que envolvem a preparação, montagem e realização de um espetáculo, de dança, teatro, música, performance artística ou de outras iniciativas como conferências, exposições.

Infelizmente, alguns coordenadores ou gestores culturais, parece que querem meter tudo no mesmo saco, só para mostrar quantidade de eventos e de público. Outros, porém, têm os espaços culturais às moscas, e ali ficam anos a fio, a “hibernar a cultura”. Mas, não vamos generalizar, pois também há espaços com boas programações culturais.

Gerir um espaço cultural não é encher o mesmo com atividades constantes, subcarregando o recursos humanos e não dando tempo ao próprio espaço (palco, sala de exposições…) para respirar. A quantidade excessiva de eventos culturais no mesmo espaço é sempre prejudicante. Mas infelizmente vivemos na época das estatísticas, dos números, quanto mais melhor, como se esse indicador fosse prova da viabilidade e qualidade de um projeto.

O gestor tem que conhecer, se não bem, minimamente, o diverso sector cultural, ser persistente, criativo, sensível para trabalhar com pessoas, ter capacidade sistemática de planeamento, acompanhamento e avaliação objetiva.

É preciso uma eficaz operacionalização humana, técnica e financeira para gerir-se uma “casa” dedicada à cultura. O gestor cultural tem que sair da sombra e ter uma alargada rede de contactos, procurar parcerias com diversos agentes públicos, privados e comunitários.

Por estas especificidades e exigências é que “a gestão cultural é uma profissão complexa que estabelece um compromisso com a realidade do seu contexto sociocultural, político e económico e, para tanto, é preciso consciência de que gerenciar e planejar não significa em momento algum, intervir na liberdade de expressão individual ou de grupos artísticos, ao contrário, significa sintonizar ideias, compreender as realidades no entorno e no mundo, dimensionar os recursos financeiros e humanos para tornar mais eficiente e eficaz a ação pretendida. (Maria Helena Cunha).”

O gestor cultural deve ter vocação e acima de tudo, capacidade de liderança eficaz para gerir pessoas e cumprir com a missão, visão e valores do espaço que dirige. O gestor deve, igualmente, criar perspetivas conscientes a curto, médio e longo prazo para o espaço cultural que comanda. Por isso, há que ser sincero com a gestão cultural e não fazer batota ou distorção do número de público que ocorreu aos eventos. Foram tantas as iniciativas culturais que participei com uma afluência razoável e no balanço feito pelos responsáveis do espaço, as mesmas foram classificadas com uma grande afluência, de casa cheias. Sinceramente, temos que ser verdadeiros em todo o processo da gestão cultural.