Cafôfo assume-se ideologicamente socialista, diz que PS precisa de outra liderança mais entusiasta, e não descarta candidatura à presidência do Governo Regional

Fotos: Rui Marote

Paulo Cafôfo, o presidente da Câmara Municipal do Funchal, não fecha a porta a uma eventual candidatura à presidência do Governo Regional, apesar de “gostar muito do que faz” na gestão do município. Por outro lado, assume que muitos vêem nele, apesar de até agora se ter mantido independente, a cara de um PS-Madeira que se quer renovar. E isto mais do que o actual líder. Estas declarações fazem parte de uma entrevista que o edil nos concedeu, e que o Funchal Notícias irá publicando em diversas partes ao longo do dia de hoje, ajudando a desvendar a identidade, a personalidade e as perspectivas daquele que se perfilha como o maior adversário político que o PSD já enfrentou no arquipélago.

Questionado sobre a recente polémica dentro do PS-Madeira quanto à questão da liderança, com Emanuel Câmara a entrar na liça, Cafôfo, numa entrevista que o transportou do seu gabinete na CMF a várias zonas da cidade, na companhia do FN, declarou: “Eu não sou filiado em nenhum partido, mas identifico-me claramente com o Partido Socialista. Identifico-me com os princípios, identifico-me com os valores, e com o ADN do PS, incluindo o PS-Madeira”. 

 

Questionámos: “Isso é que já é mais discutível. Não falta quem ache que se identifica apenas com o PS de António Costa”. Resposta pronta: “Vamos lá a ver: o PS-Madeira não é a liderança. Nós temos de distinguir aquilo que é o líder do partido do que é o partido. Não é a mesma coisa. E, no que diz respeito ao partido, e eu conheço bem os militantes do PS, eu revejo-me obviamente, e por isso reafirmo este ADN do PS e daqueles que, durante anos e anos, sempre militaram no PS. Vai-me perguntar: mas então, porque não é militante do PS? Pois, não sou. Tal como não foi Carlos Pereira, durante muitos anos, tal como não foi o próprio Emanuel Câmara, durante muitos anos. A minha participação política parece que já tem muito tempo, mas eu há quatro anos é que dei os primeiros passos. Eu, digamos, comparado com outros, sou uma criança ainda a aprender a andar neste percurso da política, e com toda a humildade, porque há factores, nomeadamente, da política partidária, com a realidade dos quais só agora começo a ter contacto. A realidade dos partidos é diferente. Eu já estive em instituições como o Sindicato dos Professores da É curioso que, na rua, as pessoas quando me contactam, é o Partido Socialista. Eu não tenho um cartão de filiado, mas milito, se quisermos, no PS, e há essa percepção por parte das pessoas”, reconhece.

Por outro lado, reforça, quanto às grandes opções estratégicas que, em seu entender, devem seguir os socialistas madeirenses: “O PS, neste momento, tem de tomar opções, que serão assumidas pelos militantes, com as eleições, primeiro, e com o congresso, sabendo-se, e isso também é público, que eu apoio publicamente o Emanuel Câmara para a liderança do PS, apesar de não poder votar nele, porque considero que o Emanuel Câmara tem o perfil para organizar o partido, mobilizá-lo, para os desafios futuros que aí vêm. Porque eu não vejo, com esta liderança, no PS, qualquer entusiasmo por parte dos militantes, das pessoas ou dos simpatizantes. Não vejo esse entusiasmo, e deveríamos estar a vê-lo, seja pelo que se passa com o PS a nível nacional, estamos naquilo que são as ondas positivas e os ares que vêm de Lisboa pela governação do António Costa, seja pelo facto dos resultados autárquicos que o PS teve, e com a perspectiva, obviamente, das eleições regionais. Mas andamos aqui, e não há esse entusiasmo. E vejo que os militantes não vêem a luz nesta actual liderança para as eleições regionais de 2019”.

Pressionado sobre a questão de admitir ou não vir a candidatar-se a presidente do Governo Regional, o actual presidente da CMF refere que já falou muito da questão da candidatura, da não candidatura, do que é e do que não é…

“As pessoas acham que eu tenho uma ambição, e que sou uma pessoa muito ambiciosa; não sou. Eu nunca esperei, na minha vida, estar sentado nesta cadeira, nunca esperei fazer vida política, nunca esperei ser presidente da Câmara… nunca. Agora, há uma coisa: eu quando estou, e quando agarro um projecto, dou tudo o que tenho. Não sei o que vai acontecer em 2019. Há diversas coisas a acontecer na política regional. Repare-se: na política regional e na sociedade”, sublinha.

Contra-atacámos: Será que não está a ser empurrado por diversas forças da sociedade no sentido de preparar uma candidatura ao Governo Regional, mais do no cumprimento de uma ambição pessoal, para aproveitar um momento particularmente favorável, em que a imagem do PSD está nitidamente fragilizada como nunca antes esteve?

“Eu quando digo que quero cumprir o mandato [na CMF] é porque gosto muito disto que faço. E este mandato é um mandato diferente do outro. O outro foi muito difícil, seja pela situação financeira, seja pelo facto de nós não termos experiência, e termos conquistado essa experiência com muito trabalho. Seja pelas condições políticas sem maioria em lado nenhum; nem em Juntas, nem na Câmara, nem na Assembleia Municipal. Mais os episódios que aconteceram, os incêndios, a tragédia do Monte… foram situações de grande dificuldade. Eu gosto mesmo muito daquilo que faço. Gosto desta minha missão, aqui na cidade do Funchal”.

Mas se for chamado a outra missão, não quer dizer que não a encare…, aventámos. Resposta algo críptica: “Não sei qual é o futuro. O William Blake, penso eu, dizia que há coisas conhecidas, e coisas desconhecidas. Entre elas, as portas. Portanto, vamos ver quais são as portas”.*

 

*(Nota: a citação, frequentemente atribuída ao poeta e artista William Blake, é aparentemente da autoria de Ray Manzarek, um dos membros do grupo de rock The Doors, provavelmente influenciado pela obra de Blake e, mais tarde, pela sua citação pelo escritor Aldous Huxley, no livro intitulado “As Portas da Percepção”).