Grandes obras no Paul da Serra para criar barragem para aproveitamento hidroeléctrico

Fotos: Luís Rocha

No Paul da Serra decorre actualmente grande movimentação de camiões, nas imediações do Pico da Urze a pouca distância da bifurcação onde existe a estrada que conduz ao Fanal. Os camiões circulam de cá para lá e de lá para cá e, na zona do estaleiro de obra, que se encontra delimitada, levantam grandes nuvens de poeira. Toda esta movimentação de pessoal, camiões e maquinaria no Paul da Serra tem chamado a atenção das pessoas, que se interrogam sobre as razões de tal burburinho naquela zona serrana, habitualmente calma.

O Funchal Notícias interpelou, a respeito, a Secretaria Regional do Ambiente e Recursos Naturais, mas a resposta governamental acabou por chegar-nos da assessoria de imprensa da Secretaria Regional da Economia, Turismo e Cultura, dado que a obra é da responsabilidade da Empresa de Electricidade da Madeira (EEM).

Informa o Governo Regional que as movimentações observadas inserem-se no âmbito dos trabalhos em curso do Projecto de Ampliação do Aproveitamento Hidroeléctrico da Calheta, “um projecto estratégico para a Madeira em termos de produção de energia renovável ao nível da captação e disponibilização de água, que vem reforçar significativamente a independência energética da Região Autónoma da Madeira (RAM), em sintonia com o Plano de Acção para a Energia Sustentável da Ilha da Madeira e Estratégia de Adaptação às Alterações Climáticas da RAM”.

A SRETC salienta a “importância extrema deste projecto”, que, diz, foi reconhecida pela União Europeia, uma vez que esta se disponibilizou a financiar a iniciativa com 45 milhões de euros, o que corresponde a cerca de 64% do custo total estimado, sendo o restante a componente de comparticipação da Região, através da EEM.

Segundo dá a conhecer o Governo Regional, este projecto integra 6 sub-projectos, designadament infraestruturas de armazenamento de água, com a criação de um barragem do Pico da Urze (com capacidade para 1.021.000 m3); e um reservatório de restituição da Calheta (com capacidade para 70.540 mde água).

O projecto compreende ainda três edifícios, nomeadamente a Central Hidroelétrica da Calheta III (30 MW: 2x 15 MW); a Estação Elevatória da Calheta (17,7 MW: 3z5,9 MW); a Estação Elevatória do Paúl (180 kW 2×90 KW); prevista estão ainda uma Conduta Forçada/Elevatória (BPU –CHC III) (3,4 Km DN 1500 a 1000) e intervenções nas levadas (canais de transporte de água), com a ampliação da levada Velha do Paúl (1,6 km), a ampliação da Levada do Paúl (10,6 Km), e a remodelação da Levada do Lombo do Salão (1,8 Km).

O Governo Regional assegura pretender proceder posteriormente à recuperação biofísica do Paúl da Serra, com a reutilização das terras resultantes das escavações da barragem na recuperação de solos, a revegetação de 28,4 hectares com espécies autóctone, e a remodelação/ampliação da Subestação do Lombo do Doutor (60/30 KV).

“A execução dos trabalhos relacionados com a Barragem de Acumulação do Pico da Urze (incluindo o Reservatório de Restituição da Calheta, e ampliação/remodelação de Levadas associadas ao Projecto), encontra-se a cargo do consórcio externo designado “AFAVIAS/ANDRADE GUTIERREZ em consórcio” cuja proposta apresentada foi adjudicada após concurso internacional, com qualificação prévia de candidatos, tendo o respectivo contrato sido submetido a um processo de fiscalização prévia do Tribunal de Contas, respeitando rigorosamente a tramitação legal aplicável”, salienta a Secretaria Regional da Economia, Turismo e Cultura.

Ainda no âmbito dos procedimentos legais, realça esta entidade, impõe-se igualmente referir  a realização do Procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental (Estudo de Impacte Ambiental ou o seu Resumo Não Técnico e a DIA – Declaração de Impacte Ambiental, que se encontram disponíveis na EEM e na Autoridade de AIA (DROTA)), dando deste modo integral cumprimento, quer à legislação Comunitária quer à Nacional.

O Governo salienta que a localização, dimensão, diversidade e complexidade técnica das intervenções, obrigaram este projecto a um longo e exaustivo processo de avaliação socioeconómica e ambiental com vista à sua aprovação por parte da União Europeia e das entidades regionais, em cumprimento das políticas e directivas comunitárias e da legislação nacional em matéria de energia e ambiente. A avaliação de impacte ambiental, prévia e vinculativa, identificou os principais potenciais impactes ambientais, sociais e económicos, quer negativos, quer positivos, caracterizando-os em termos de magnitude, intensidade e reversibilidade, estabelecendo medidas minimizadoras para os impactes negativos e potenciadoras para os impactes positivos, bem como um programa de monitorização permanente que faz parte do Plano de Gestão Ambiental do projecto global.

Este Plano de Gestão e Monitorização Ambiental teve já o seu início antes do arranque das obras por forma a estabelecer uma situação de referência relativa ao estado qualitativo dos descritores ambientais que serão seguidos ao longo das diferentes fases do projecto e que foram exaustivamente identificados no Procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental, explicam-nos as entidades governamentais.

“A fase mais importante em termos de impactes ambientais é, naturalmente, a fase de construção, uma vez que esta encerra um conjunto de intervenções (como as agora constatadas pelo FN) que limitarão o uso e acesso a áreas directamente intervencionadas e outras que, por prevenção e segurança serão temporariamente inacessíveis. A instalação dos estaleiros, parques de máquinas, áreas de armazenamento de materiais ou manutenção de equipamentos, alterações topográficas com a movimentação de maquinaria e veículos e terras ou a criação de depósitos temporários de materiais que serão utilizados em fases posteriores da obra, constitui a fase de maior impacte com eventuais perturbações temporárias no acesso de determinadas áreas que são habitualmente frequentadas por caminheiros e turistas, podendo ainda causar alguma perturbação para avifauna”, reconhece o GR, que promete no entanto que “estas situações serão acompanhadas por medidas estabelecidas na Declaração de Impacte Ambiental, que visam minimizar e restringir geograficamente, tanto quanto possível, esses impactes e, igualmente, prevenir potenciais situações relativas à segurança”.

Na fase de exploração, asseguram-nos, os impactes negativos serão praticamente nulos, sendo os positivos muito significativos, no que diz respeito à produção de energia renovável, à redução da emissão de gases com efeito de estufa, ao aumento da disponibilidade de água e à recuperação de habitats naturais e conservação a biodiversidade.

Na sua longa resposta, a SRETC declara que a selecção das espécies que vão ser utilizadas na recuperação biofísica em causa foi realizada em articulação com o Instituto das Florestas e Conservação da Natureza IP–RAM, que também acompanhará o desenvolvimento deste projecto, e inclui a Urze das Vassouras, a Urze Molar e a Uveira da Serra, entre outras, estando prevista a realização de procedimentos periódicos de acompanhamento e manutenção, adequados a garantir a viabilidade da operação de recuperação da vegetação, dos quais se destacam a rega em função das necessidades, monda manual para remoção de espécies invasoras, instalação de protecções individuais e a sinalização e substituição das plantas que não sobrevivam.

“É esperada na área de intervenção uma taxa de sobrevivência de 80% dos exemplares plantados ao final de um ano, bem como a erradicação total de plantas infestantes. No final do segundo ano, a taxa de sobrevivência deverá ser de 100%, assegurando-se um bom estado de desenvolvimento vegetativo que permitirá uma rápida recuperação natural da área”, conclui o Governo Regional.

O Funchal Notícias conversou com ambientalistas acerca deste assunto, tendo obtido a opinião de que um projecto desta dimensão “terá sempre algum impacto ambiental”, com a criação de uma grande lagoa para aproveitamento de água no Paul e obras realizadas. Teme-se danos à levada do Pico da Urze, mau grado as promessas do Governo, mas por outro lado comenta-se que agora é que as pessoas estão a prestar atenção a esta obra: quando a mesma esteve em discussão pública poucos foram os interessados em informar-se, muito menos em contestar.