Mulher queima mão e braço quando limpava hotel de luxo com produto corrosivo e ninguém é chamado a contas

queima 2Num dia de limpeza normal de um hotel de luxo, Pestana Miramar, Carla Patrícia Costa recebe um produto de limpeza alegadamente corrosivo. Sem luvas adequadas nem máscara, queima a mão e todo o braço está já ameaçado. Ao serviço da Serlima, foi atendida nas urgências da Clínica da Sé. De baixa, salta de médico em médico, conforme manda a Seguradora Açoreana, e ninguém resolve o problema. Com medo de perder o braço, Carla Costa, mãe de quatro filhos, divorciada, apela à ajuda dos madeirenses para superar uma tragédia que se arrasta desde dezembro passado. 

 

O caso está a ser tratado pelo Seguro e respetivos médicos, mas já ninguém sabe o que fazer, se mandam a doente a Lisboa para ser observada por um especialista ou se aguardam cá. Enquanto isso, a doente, de baixa, desespera com dores e já pensa no pior.

A Carla Patrícia Costa é uma mulher divorciada, que habita um apartamento social da Câmara do Funchal, no Conjunto Habitacional do Palheiro, juntamente com quatro filhos, de idades compreendidas entre os 9 e os 18 anos. A tia Marina, que tem vivido com  muita apreensão, o drama da sobrinha, alertou o FN. São os filhos que lhe dão força anímica para lutar.

O trabalho na Serlima

O Instituto de Emprego da Madeira proporcionou a esta mulher a oportunidade de trabalhar na empresa Serlima, para limpeza de quartos de hotéis. Após seis meses, a Serlima renovou-lhe o contrato por mais um ano para o serviço de empregada de quartos, no conhecido Hotel Pestana Miramar, com a tarefa de também fazer o trabalho de limpeza das cozinhas dos apartamentos deste hotel.

Tudo mudou a partir do dia 7 de Dezembro de 2015. Iniciava uma maratona de limpeza, juntamente com as colegas, porque “o trabalho é sempre muito intenso, mal sobra para comer, e por vezes são cerca de 30 quartos/dia, sobretudo para acudir às saídas e entradas de clientes”. Carla Patrícia recebe um produto desengordurante que dá pelo nome de “Rivonit”. À confiança, de luvas de borracha na mão, inicia a limpeza e começa rapidamente a sentir um formigueiro intenso na mão direita que já a limitou no trabalho. Outras colegas queixaram-se ao mesmo tempo de pingos do produto caídos ora no pé ora na mão, mas nada de preocupante como o seu caso.

queima produtos
O produto corrosivo.

Acontece que Carla Patrícia já não conseguiu trabalhar bem no dia seguinte e foi mandada de urgência, pela Seguradora com quem a Serlima trabalha, Açoreana Seguros, para as urgências do Centro Médico da Sé. Aqui foi atendida por um médico, com experiência de clínica geral, que prescreveu um  antibiótico e pomada. Mas o aspeto do braço piorava dia após dia. Estava de baixa. As dores aumentavam. A Companhia de Seguros Açoreana, segundo nos relata a vítima, muda-lhe o médico de mês a mês. Passou por dermatologistas bem conhecidos desta praça que lhe chegaram a dizer que o assunto não pertencia à sua especialidade e que veriam se poderia ser consultada em Lisboa. Até hoje. Das palavras aos atos, tudo fica na mesma.

“Estou em casa desde Dezembro por querer fazer o meu trabalho para alimentar 4 filhos. Uso os produtos que me dão para o trabalho e nem tempo de respirar se temos. Ando de médico em médico, sem nada conclusivo. Médicos e Seguro, todos eles fazem a mesma lengalenga e nada se resolve. Só vejo o problema piorar dia após dia. O que faço da minha vida?”questiona.

queima novaPor aquilo que Carla Patrícia tem ouvido, quer dos médicos, quer dos serviços de inspeção, terá sido aplicado na limpeza das cozinhas um produto industrial corrosivo, possivelmente sem ter sido respeitada a lei em vigor que obriga ao uso de luvas longas – e não curtas, de supermercado, como as que são hoje usadas – e máscara.  Mais: o produto tem de ser devidamente diluído. Avisos que, segundo a nossa interlocutora,  já terão sido feitos a quem de direito mas, na prática, é a despachar o serviço porque o trabalho é intenso e ficam pelo caminho algumas normas elementares. Até haver um problema sério como é o seu caso, ou por qualquer fragilidade pessoal/reação alérgica ou porque as outras empregadas, também vítimas, se vão calando e resolvendo porque as maleitas são menores e não podem viver sem o seu trabalho.

queima 3“Ando sempre com antibióticos e pomadas. A comichão não pára, ainda para mais neste tempo da calor, faz bolhas e depois sangra. Já estou saturada e psicologicamente derrubada com isto. Algumas colegas de trabalho foram ligeiramente atingidas mas julgo que eu fui a mais afetada e nem sei se fiz uma reacção alérgica forte. Não me dizem nada e eu não sou médica. Até para receber o dinheiro do Seguro que tenho direito para alimentar os meus filhos é preciso andar lá sempre, e eles sempre em contacto com Lisboa”, desabafa.

Carla Patrícia aponta as responsabilidades à empresa que a contratou, que deveria ter outra atenção nos produtos que usa no serviço. No início, ainda telefonavam a perguntar o seu estado de saúde, mas deixaram de a contactar, apesar do problema não ter sido resolvido. Fátima Machado foi sempre o rosto da empresa, como responsável pela limpeza dos Hotéis Pestana. Também nunca mais ouviu falar desta responsável. Como o caso está no Seguro, todos se distanciam dele.

queima 4As críticas são também apontadas à Companhia de Seguros Açoreana, que deveria acelerar este processo no sentido de procurar a solução adequada para o mesmo. “Não é saltar de médico em médico que se resolve os problemas. Se é preciso consultar um especialista no Continente, de que estão à espera? Que se alastre a todo o corpo primeiro?

Medo de perder o braço

Por fim, Carla Patrícia esclarece que este apelo público que faz é uma tentativa de ver a sua situação resolvida. Não quer receber dinheiro que não seja o que legitimamente lhe pertence, nem acusar ninguém. “Sempre vivi para o trabalho e espero continuar poder trabalhar”. Mas assume que tem “medo de perder o braço” porque não há quem avance para uma solução.

O FN tentou, insistentemente, ouvir a posição da empresa Serlima para o número fixo que é publicamente divulgado, mas não passa de um atendedor de chamadas. O contacto móvel que nos foi facultado por Carla Costa também remete para a mensagem gravada. Desconhecemos os esforços que esta empresa terá desenvolvido no sentido de ajudar a sua trabalhadora e, nomeadamente, as medidas de prevenção tomadas aos acidentes de trabalho,seja em unidades hoteleiras de luxo seja em pequenos estabelecimentos. Uma questão para a Inspeção de Trabalho também avaliar.

Também na Companhia de Seguros Açoreana, tivemos como resposta que não tratam de assuntos particulares com a comunicação social.

Apesar da falta de respostas, o FN vai acompanhar este caso nos próximos tempos. A vítima apela mesmo à solidariedade de alguém, seja médico especialista ou não, no sentido de a ajudar a encontrar uma solução para este problema de saúde, nascido num acidente de trabalho e que carece de uma solução eficaz e atempada. É que os dias vão passando e o aspeto do braço não é nada agradável.