“É em casa que se adquirem bons hábitos alimentares”

 

(Foto Facebook)
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A mensagem não é nova, mas vale a pena insistir. A alimentação correta e equilibrada é um fator decisivo na saúde e bem estar, com impactos significativos na aprendizagem e nos resultados escolares.

Numa altura em que milhares de crianças e jovens retomam a rotina dos estudos, a questão volta a estar na ordem do dia. Bruno Sousa, especialista na área da nutrição, é claro quando atribui à família o principal papel na educação dos filhos, também em matéria de hábitos de alimentação saudáveis. A escola, lembra o nutricionista, apenas complementa.

O pequeno almoço antes de começar as aulas, os lanches poucos calóricos e refeições diversificadas em que se dá prioridade aos legumes e frutas são regras de ouro a seguir em casa.

Também a escola deverá encarar a alimentação como uma das áreas prioritárias da sua atuação. Bruno Sousa garante que há bons exemplos por cá e aplaude a recente medida do Governo Regional que leva aos organismos públicos os produtos frescos da Região.

Funchal Notícias – O que carateriza uma ementa escolar equilibrada?

Bruno Sousa – A ementa escolar deve ser adequada do ponto de vista nutricional, respeitando as proporções da Roda dos Alimentos, sendo essencial que seja diversificada, atrativa e saborosa. Para além disso, deve privilegiar os métodos de confeção mais saudáveis, evitando os fritos.

Convém realçar que as crianças já devem chegar à escola com a refeição do pequeno almoço feita em casa. A meio da manhã devem fazer um lanche, mas se a hora do almoço for muito tarde, e principalmente para os adolescentes, pode haver a necessidade de um segundo lanche a meio da manhã.

Este lanche pode ser constituído por lacticínios, por fruta e por pão ou bolachas ou cereais pouco açucarados, tentando sempre diversificar. Os frutos secos também podem fazer parte destes lanches. Depois, o almoço deve ser constituído por sopa, 2º prato e fruta. O prato dever ter na sua constituição vegetais, carne ou peixe ou ovos e ainda batata ou arroz ou massa ou leguminosas ou outros alimentos derivados dos cereais.

Para beber à refeição, assim como fora dela, deve ser água. Na parte da tarde, não pode faltar novamente um ou dois lanches com uma constituição semelhante aos lanches da manhã, devendo sempre alternar os alimentos.

FN – Quais os riscos para as crianças e jovens estudantes, em termos físicos, intelectuais e emocionais, de uma dieta desequilibrada?

BS – Em termos físicos, sabemos que uma alimentação desequilibrada, quer seja por excesso ou por défice, provoca alterações orgânicas, podendo levar ao aparecimento de diversas doenças a médio ou a longo prazo como sejam a obesidade, a diabetes e as doenças cardiovasculares.

Em termos intelectuais, sabe-se que uma alimentação rica em determinados nutrientes favorece um bom desenvolvimento intelectual, e pelo contrário, uma alimentação pobre em nutrientes vai comprometer o desenvolvimento de qualquer criança.

Ao nível emocional, a alimentação também desempenha um papel importante, influenciando a forma de estar. Vejamos o exemplo de uma criança que não tome o pequeno almoço, pode provocar alterações metabólicas ao nível cerebral, resultante de um prolongado jejum, diminuir a capacidade de atenção, concentração e de raciocínio lógico, causando dificuldades em pensar, compreender e aprender, razões muitas vezes suficientes para afetarem os resultados escolares.

Para além disso, pode provocar alguma irritabilidade e até alterações de humor.

FN – Estão as escolas, na Madeira, a garantir o aporte nutricional necessário?

BS – As escolas que conheço, têm cuidado com a alimentação que oferecem às crianças e estão a fornecer uma alimentação adequada à faixa etária e às suas necessidades nutricionais, pelo que os pais podem ficar descansados.

FN – Que mudanças preconizaria no sentido de tornar as refeições nas cantinas escolares mais ricas e mais interessantes? 

BS- Considero que é essencial tornar visualmente os pratos mais atrativos. Contudo, sei que, dado o grande volume de refeições servidas nas cantinas escolares, nem sempre os funcionários têm disponibilidade para o fazer. Por outro lado, é também importante tornar as refeições mais saborosas, mantendo-as saudáveis.

Outro aspeto essencial é que a alimentação nas escolas deve ser encarada como uma prioridade, e não um aspeto secundário. Assim, facilita que se possa oferecer refeições com qualidade superior.

FN – Há iniciativas por parte dos nutricionistas a realizar junto das escolas no próximo ano letivo?

Sei que muitas escolas estão a programar algumas atividades de promoção de uma alimentação saudável e equilibrada que envolvem os nutricionistas. Considero que este tipo de educação alimentar em ambiente escolar é muito importante, mas não deve substituir o papel determinante das famílias neste processo educativo. O papel da escola é apenas complementar. É em casa que se adquirem os bons hábitos alimentares para a vida.

FN – Numa escola da Califórnia, registaram-se progressos nas aprendizagens depois de se utilizarem produtos biológicos na cantina. Há evidências nesse sentido?

BS – Existem alguns trabalhos nesse sentido, mas são necessários mais estudos. Contudo, sempre que seja possível escolher este tipo de alimentos biológicos é sempre uma vantagem, particularmente nas crianças, porque sabemos que o efeito nefasto do consumo de alimentos com elevados níveis de pesticidas é superior nas crianças, uma vez que são menos capazes de metabolizar os produtos tóxicos, e por outro lado, porque é uma fase em que o seu sistema nervoso ainda está em desenvolvimento, com processos complexos e frágeis, que podem originar consequências irreversíveis.

FN – Como encara a decisão do Governo Regional em implementar o consumo de hortofrutícolas regionais nos estabelecimentos oficiais?

BS – Considero uma excelente medida. Temos produtos regionais de tão boa qualidade e por isso devem ser os escolhidos para as refeições das crianças.